Nossas escrevivências importam 

FONTEPor Anielle Franco, de ECOA
Anielle Franco (Foto: Bléia Campos)

Nesta semana, período em que celebramos o Dia da Mulher Negra Latino Americana e Caribenha, meu intuito é inspirar todas as mulheres negras desse mundo a escreverem, contarem suas histórias, suas derrotas, suas superações, mas principalmente suas vitórias. Muitas mulheres negras na história, como Audre Lorde, já nos diziam que: “nosso silêncio não nos protege”.

Partindo de nossas oralidades e escritas inspiradas por nossas experiências e trajetórias, e também por meio de nossas encruzilhadas ancestrais, quero utilizar este espaço para manifestar a importância de nós, mulheres negras, exercitarmos nossa escrevivência.

Conceição Evaristo conceitua “escrevivência” como a escrita que nasce de nosso cotidiano, de nossas lembranças, da experiência de viver e sentir a vida real enquanto mulheres negras, historicamente jogadas à margem deste projeto de sociedade falho e racialmente dividido. É certo que, o simples fato de compartilharmos nossas perspectivas subjetivas nos ajuda a inspirar outras mulheres. Tornar da nossa escrita um hábito pode levar algum tempo, mas pode ser libertador e de fato inspirador. Passamos por tantos momentos em nossas vidas, que às vezes só as mulheres negras conseguem se reconhecer na dor e nas alegrias das outras.

Vilma Piedade quando nos conta sobre “dororidade”, se inspirando no “pretuguês” de Lélia González, expõe a noção de que a violência racista, patriarcal, social, seja ela física, emocional ou moral parecer ser o elo que une as mulheres negras a luta feminista. E se para Vilma, a dororidade quer falar das sombras, da fala silenciada, dentro e fora de nós, da dor que o racismo causa ao nosso corpo em que às vezes parece que somente nós sabemos reconhecer, podemos afirmar que quando a guardamos dentro de nós, sofremos sozinhas, não nos dando a chance de navegar em um mundo de descobertas e trocas e, principalmente, de conexões afetivas ancestrais.

Seja por dororidade, ou pelo afeto matriarcal, nós mulheres negras somos mais fortes quando costuramos juntas o tecido social que molda nossa vida e trajetória. A escrevivência é nossa ferramenta para contar ao mundo a experiência maravilhosa e desafiadora do que é ser mulher negra nesse mundo. Carregamos nas costas e em nossos ventres as perspectivas de um futuro pautado na vida e não na morte, e a todas vocês que se calaram até agora, eu lhes digo: não guarde aquilo que você acredita por medo de errar ou de acharem que não serão ouvidas. Apenas falem ou escrevam e descubram suas forças!

Nossa memória, nossa vivência e nossa escrita são as mais importantes ferramentas de nossa construção enquanto mulheres negras!

“(…)
Da favela, da humilhação imposta pela cor
Eu me levanto
De um passado enraizado na dor
Eu me levanto
Sou um oceano negro, profundo na fé,
Crescendo e expandindo-se como a maré.

Deixando para trás noites de terror e atrocidade
Eu me levanto
Em direção a um novo dia de intensa claridade
Eu me levanto
Trazendo comigo o dom de meus antepassados,
Eu carrego o sonho e a esperança do homem escravizado.
E assim, eu me levanto
Eu me levanto
Eu me levanto”

– Maya Angelou (1978)

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