O Brasil se movimenta a partir das mulheres negras

Com acesso a direitos e oportunidades, são a expressão da potencialidade

FONTEFolha de São Paulo, por Anielle Franco, Luciana Santos, Margareth Menezes e Marina Silva*
Óleo sobre tela do pintor e gravurista Félix Edouard Vallotton (1865 -1925); imagem é comumente associada a Tereza de Benguela, líder quilombola brasileira no século 18

Pela primeira vez celebramos o julho das pretas num Brasil com quatro ministras de Estado negras —e não vamos simular normalidade. É histórico, uma ventania de força e esperança redemocratizada com o governo Lula, uma oportunidade concreta de ressignificar a agenda de direitos, especialmente das pessoas negras, que representam 57% da população brasileira. Não é prêmio, é conquista.

Celebrar, reconhecer e valorizar a existência das mulheres negras no mês de julho, em comemoração do Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, nesta terça-feira (25), é um movimento tripartite: de fortalecimento da potência feminina negra que sustenta historicamente este país; de denúncia das desigualdades de gênero e raça; e de promoção de políticas públicas para enfrentar essa realidade de exclusão.

A partir do governo federal, importantes insumos da mudança estão postos: institucionalização de recursos e infraestrutura, conhecimento específico acumulado e poder de ação. Uma trajetória não linear que envolve memória, reparação, reconhecimento e incidência para o futuro.

Olhar para frente é construir coletivamente, cada uma em seu espaço de luta e sempre inseridas nos debates e na construção das soluções no campo da política econômica e social, de metas e indicadores de redução de desigualdades, numa agenda intrinsecamente associada ao enfrentamento do racismo e à promoção da igualdade racial. É sobre a dignidade do viver. Melhorar as condições de vida da população e promover a igualdade são empreendimentos de grande porte, com função estratégica para a prosperidade econômica do país.

As mulheres negras têm a transversalidade como método de diálogo, ação conjunta e entregas concretas. A forma como as políticas públicas são construídas é tão relevante quanto a política em si, e temos essa perspectiva como fundamento. As pastas sob nosso comando atuam em sinergia temática —nós trabalhamos em permanente conexão umas com as outras, entre as 10 ministras nesta gestão, e em consonância com todas as 37 pastas.

A habilidade de enxergar a importância da parte e do todo não é exclusividade de mulheres ou de pessoas negras. No entanto, as mulheres negras são as que mais encontram barreiras para explorar suas potencialidades e serem reconhecidas por seus talentos e competências. Essa é uma das perversidades do racismo que o julho das pretas também denuncia, lembrando que ciência e tecnologia, inovação, cultura, meio ambiente, economia, saúde, educação, arquitetura urbana, negócios, esportes, comunicação, transporte e criatividade também nos dizem respeito. “Trazemos conosco a marca da libertação de todas”, afirma Lélia Gonzalez.

As mulheres negras brasileiras, latinas e caribenhas são formuladoras, executoras e beneficiárias de políticas públicas, são múltiplas, com demandas complexas, e fazem a economia do país girar. São ministras, cientistas, astronautas, faxineiras, gestoras, professoras, caixas, estudantes, economistas, artistas, médicas, eletricistas, políticas, inventoras. Com acesso a direitos e oportunidades, são a expressão da potencialidade.

Queremos muitos avanços neste julho das mulheres negras. Participação de todas as pessoas nas políticas públicas, da elaboração à execução, ampliando e potencializando a democracia que reconquistamos com nossa luta. Queremos atenção e disponibilidade para nossas pautas em todas as instâncias do poder público: Executivo, Legislativo e Judiciário. Queremos igualdade de gênero e raça em todos os empreendimentos, empresas, organizações, instituições. Queremos atenção e reconhecimento do país que, nos últimos 500 anos, parimos, amamentamos, ensinamos, cuidamos e trabalhamos para sustentar. Queremos, hoje e no futuro, a Justiça que tantas vezes nos foi e ainda nos é negada.


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Anielle Franco
Ministra da Igualdade Racial

Luciana Santos
Ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação

Margareth Menezes
https://www.geledes.org.br/tag/margareth-menezes/Ministra da Cultura

Marina Silva
Ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima

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