O empreendedorismo periférico busca soluções para se fortalecer em meio a crise

FONTEPor Daniel Cerqueira, da Tide Setubal
Divulgação

Os empreendimentos periféricos, em expansão segundo o último relatório da Global Entrepreneurship Monitor (GEM), foram fortemente impactados pela pandemia de Covid-19. Em 2020, mais de 14 milhões de brasileiros tornaram-se empreendedores, sendo 53,9% destes surgidos por necessidade.

Para atuar sobre esse esse panorama, o Modela, projeto desenvolvido em parceria entre a Emperifa e o Casulo e com apoios de Fundação Tide Setubal, Instituto C&A e Fundação Arymax, foi criado para acelerar pequenos e microempreendedores do universo da moda na zona leste de São Paulo. A iniciativa oferece também assessoria individual e acompanhamento para monitorar o desenvolvimento dos negócios potencializados.

Conversamos com três empreendedores que estão participando da aceleração do Modela – Kioo Moda Infantil, Candaces Moda Afro e Piratapuya para, além de saber como eles surgiram e quais são os seus objetivos, compreender o que mudou com a participação no projeto e o que tem sido feito para alcançar tais metas.

Relembrando o passado

Kioo moda define-se como uma marca de roupas infantis com o compromisso de produzir moda com representatividade e que contribua para a elevação da autoestima dos pequenos, preservando a cultura negra e sua ancestralidade.

“A população negra encontra dificuldade na representatividade desde recém-nascido. O negócio começou com nosso filho, quando não encontrávamos roupas para ele que nos satisfizessem. Não é uma dificuldade só no caso com nossos filhos: nós mesmos, como crianças pretas, vivemos a vida inteira nunca tendo roupas que nos contemplassem”, relata Glauber Marques, um dos fundadores da marca.

As atividades da Kioo Moda Infantil começaram em 2018 e, de acordo com Glauber, ele e a esposa decidiram dar o passo seguinte em 2019, ao participarem da Feira Preta. “A gente não era do mercado da moda e não imaginava os desafios gigantes que teríamos pela frente – era só a vontade de fazer. Mas, em  dezembro de 2019, fizemos o lançamento como pensado e foi um sucesso. Creio que, principalmente, porque temos o diferencial de pensar a roupa para a criança e não, como muitas vezes acontece, de se fazer minirroupa de adulto”. No começo de 2020 a marca já estruturava seu e-commerce e a coleção completa.

Sua história é parecida com a Candaces Moda Afro, segundo afirma Sandra Neves, uma de suas fundadoras. Criada em 2013 pelas mulheres da família, a marca veio, segundo as fundadoras, para preencher os anseios de mulheres, homens e crianças em se sentirem representados com elementos que dialogam com a sua ancestralidade, considerando a pluralidade e peculiaridade de corpos e estilos do nosso país.

“O nosso início se deu de forma muito inusitada. Fomos participar de um evento em Jundiaí com alguns materiais que minha mãe produzia. Todas estávamos vestidas com roupas com estampas étnicas e percebemos que as pessoas se interessavam muito mais pelo que vestíamos do que pelo que estávamos vendendo. No mesmo ano já estávamos com a marca lançada na Feira Preta.”

De acordo com sua fundadora, a representatividade está além do comercial, sendo importante saber que se compra de outra pessoa com a mesma origem e que batalha por seu espaço. “Crescemos na sociedade na qual ouvíamos que preto não combina com vermelho ou amarelo. Quando você vê uma mulher de mais de 50 anos se emocionar porque vestiu uma roupa e se sentiu bem, é aí que bate o sentimento de representatividade.”

Um outro caso emblemático que também participou da conversa foi a da Piratapuya, marca criada no início da pandemia e que surgiu, segundo o fundador, Sioduhi, do questionamento sobre o apagamento histórico dos povos indígenas, da desvalorização da beleza originária e da escassez do protagonismo indígena na sociedade em diferentes áreas.

“Trata-se de histórias que você jamais encontrará em livros, como a de um jovem indígena nascida em uma aldeia e que fez toda a transmissão para os centros urbanos. Houve um baque cultural para eu me adequar à visão ocidental. Por isso, quero contar nossa própria história por meio de roupas e utilizar a moda como forma de descolonização da indústria que, por muito tempo, nos viu apenas como seres parados no tempo.”

Projeto Modela: um presente com vistas ao futuro

De acordo com Bia Ferreira, sócia da Casulo e gestora de cronograma e comunicação do Modela, negócios com menor capacidade de adaptação e gestão mais fragilizada são os que mais sofrem em tempos de incertezas, como o da crise econômica decorrente da pandemia.

“Isso acontece por falta de acesso histórico ao conhecimento, ferramentas de gestão e práticas de inovação. Portanto, acreditamos que levar conhecimento sobre esses aspectos, de maneira simples e acessível, torna esses empreendedores seus negócios mais adaptáveis e resilientes.”

Os negócios retratados nessa conversa reconhecem os impactos que o projeto tem tido para o presente e o futuro das marcas. Sioduhi vê o Modela como uma oportunidade para pensar em novas estratégias para impulsionar a marca e recuperar-se do declínio que ocorreu no início do ano.

“Começamos com o e-commerce e o Modela veio para a gente reacender o trabalho. Com as formações pudemos repensar, desde a filosofia da marca, o marketing e a parte financeira para, enfim, a buscar estratégias para impulsionar as nossas marcas. Queremos ter a Piratapuya mais reconhecida, utilizando estratégias de comunicação e marketing. Queremos também, no futuro próximo, aumentar a equipe com uma ou duas novas pessoas remuneradas.”

Para Sandra Neves, da Candaces, o Modela reacendeu as esperanças do negócio.

“Demoramos um tempo para entender o que estava acontecendo. Quando soubemos do Modela, nos inscrevemos porque precisávamos mais do que o recurso financeiro, mas ter um norte, e ele veio para resgatar o sentimento do trabalho da marca. Agora, estamos cheias de ideias para o futuro e queremos encontrar parcerias nessa parte da produção, que nos ajude na produção e na comunicação para impulsionarmos os negócios.”

Esse sentimento é também compartilhado por Glauber Marques, da Kioo Moda, ao considerar que o Modela chegou em um momento essencial.

“Somos microempreendedores e nos esquecemos dos processos de organização e de planejamento. Com a crise que veio da pandemia, estávamos no momento de precisar retomar a marcar, e o projeto nos fez olhar para o que estava fora do lugar e reorganizar o negócio. Como todos os demais aqui, voltamos a sonhar. Esperamos fazer, muito em breve, fazer a Kioo Moda progredir e ampliar do online para inaugurar um espaço físico.”

Por fim, os participantes do Modela que participaram da imersão – os 12 empreendimentos acelerados e os demais que estiveram na primeira fase do projeto – estarão presentes em uma das atividades do #MuitoMaisOn, série de workshops sobre moda e empreendedorismo do Instituto C&A, que contará com consultores do instituto e do Modela.

Acesse o site do Modela para saber mais informações sobre o projeto.

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