O Partido dos Panteras Negras no século 21

FONTEPor Raquel Barreto, da Folha de S. Paulo
Tommie Smith (centro) e John Carlos (dir.) nos Jogos Olímpicos da Cidade do México, 1968 (Foto: AFP)

Eletrizada e arrebatada, foi como me senti ao assistir o trailer do filme “Judas and the Black Messiah”, do diretor Shaka King (ainda sem previsão de lançamento no Brasil). O filme ficcionaliza um acontecimento verídico: o assassinato de Fred Hampton, uma liderança importante do Partido dos Panteras Negras.

O nome do filme faz referência à conhecida história bíblica de traição, possivelmente a maior de todas. Mas também há uma questão da época: o temor do surgimento do Messias Negro. A liderança que seria capaz de unificar politicamente a comunidade negra e estabelecer uma convergência entre os movimentos sociais.

O assassinato de Fred Hampton foi planejado pelo Cointelpro, um programa de contrainteligência criado em 1956 pelo FBI para eliminar a dissidência política no país. Em 1969, o seu principal alvo eram os Panteras Negras, considerados a ameaça número um à segurança nacional.

O Cointelpro partia da lógica de que tudo valia, inclusive o uso de métodos ilegais, para combater os inimigos internos. Um desses métodos foi a utilização de agentes infiltrados para desestabilizar os movimentos sociais. O assassinato de Hampton contou com a participação de um infiltrado, que passava informes à policia de Chicago. É o que revela a documentação do próprio FBI.

Mas o que há de tão especial na história dos Panteras Negras para que depois de tanto tempo continuem despertando interesse? Ressalta-se sempre a imagem impactante do grupo, o que acaba ofuscando aspectos importantes de sua história. Por isso talvez não seja tão conhecido o fato de eles terem como princípios políticos a luta por liberdade, poder popular, justiça e pelo fim da exploração econômica.

Um de seus grandes feitos foi elaborar uma política de intervenção e transformação do cotidiano de sua comunidade, sendo o exemplo mais conhecido o programa do café da manhã para as crianças. Mas existiram outros, como o programa pioneiro de promoção da saúde da população negra e a criação de escolas, além de outras ações sociais destinadas a atender demandas urgentes.

Por outro lado, como em todas as agrupações humanas, eles também tiveram de enfrentar contradições internas e problemas como o personalismo e práticas de autoritarismo.

Em tempo de Black Lives Matter, o legado do Partido dos Panteras Negras continua sendo um fundamento importante para ativismos negros em escala global, principalmente por sua forma contundente de confronto ao racismo e à supremacia branca.

É um legado vivo que continua alimentando sonhos de um mundo com justiça social e democracia.

Raquel Barreto
Doutoranda em história na Universidade Federal Fluminense, dedica-se a pesquisas sobre Angela Davis, Lélia Gonzalez e o Partido dos Panteras Negras

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