O que eles não nos contaram?

FONTEPor Andressa Clivia Santos Soares, enviado para o Portal Geledés
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Eu não sei como brigar, eu só sei como continuar viva.

A Cor Púrpura (1982)

 

Às vezes eu me pergunto o que poderia ter mudado se eu tivesse o conhecimento que tenho hoje, se o feminismo negro ou o debate étnico-racial tivesse chegado mais cedo em minha vida. Será que eu teria considerado algumas coisas que me ocorreram como violência?  Será que eu teria ficado calada nas vezes em que eu deveria ter gritado? Pensando comigo mesma acho que a resposta seria sim, porém “eles” não me contaram, ninguém me disse que a violência direcionada a mim eram por conta da minha cor, esta não retinta, mas que ainda recebe olhares externos, exóticos ou de não aprovação. Se “eles” tivessem me contado eu teria berrado, dilacerando a máscara do silêncio como disse Grada, mas não teria feito isso esperando que “eles” se importassem, pois sei que não se importariam e não se importam, mas para amenizar minha dor.

Quando não reconhecemos a nossa negritude, quando não reivindicamos o nosso ser político continuamos sem saber. Não conseguimos nomear o que nos machuca, não conseguimos gritar “racista” para aqueles/as que são. É por isso que “eles” não contam, porque temos que continuar sem saber brigar, apenas vivendo, sobrevindo a estrutura racista que nos nega o mínimo para viver, até porque eles sabem que somos como Sojourner Truth se recusando a ir embora e resistindo ao fogo, e é por isso que “eles” nunca nos contaram.


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