O que pensa a liderança negra à frente do ato pró-Rafael Braga

Integrantes da organização 30 Dias por Rafael Braga falam sobre o futuro do catador de lixo que terá seu habeas corpus julgado nesta terça (1º).

Por DÉBORA LOPES, do VICE

Nesta terça (1º), acontece o julgamento do pedido de habeas corpus de Rafael Braga, o único detido durante as Jornadas de Junho que responde, agora, a uma condenação de 11 anos e três meses de prisão por tráfico. Na última segunda (31), lideranças negras organizaram um ato em São Paulo e no Rio de Janeiro pedindo que Braga responda em liberdade e seja absolvido. Em Brasília (DF), um novo protesto acontece no dia do julgamento.

A história de Rafael não é simples. Em 2013, foi detido por portar produtos de limpeza. À época, a polícia e a Justiça entenderam que aquilo era, na verdade, material explosivo. O catador de lixo, que estava em situação de rua, afirmou sequer participar das manifestações. Depois da detenção, acabou respondendo em liberdade e conseguiu um emprego no escritório de advocacia que fazia sua defesa. Em janeiro de 2016, Braga saiu de casa para comprar pão pela manhã e acabou sendo levado para a delegacia sob a acusação de porte de drogas. Em seu depoimento, afirmou que aqueles 0,6 g de maconha e 9,3 g de cocaína não lhe pertenciam e que foram “plantados” pelos policiais. Assim como um rojão.

Foto: Felipe Larozza/ VICE

Sua história inspirou uma mobilização popular que, além de pressionar as autoridades em protestos de rua, manteve a hashtag #LibertemRafaelBraga em primeiro lugar nos trending topics do Twitter no Brasil durante a segunda-feira.

A VICE foi até o Theatro Municipal, em São Paulo, conversar com a liderança negra da organização 30 Dias por Rafael Braga. A princípio, a manifestação iria até o Tribunal de Justiça de São Paulo, mas acabou caminhando sentido Cracolândia, onde a Prefeitura realizava uma ação de limpeza. Indignados com os jatos d’água, alguns moradores em situação de rua começaram a queimar barracas e materiais e acabaram cercados pela PM.

Saque abaixo o que os organizadores do ato pensam não só sobre o futuro de Rafael, mas também sobre o sistema penitenciário brasileiro, que afirmam ser seletivo e racista.

Foto: Felipe Larozza/ VICE

Jefferson Luis da Silva, da organização 30 Dias por Rafael Braga

“O que está acontecendo aqui hoje demonstra a crise que o sistema político do Brasil está passando, principalmente se pensarmos no sistema carcerário. O Rafael Braga é um jovem negro, periférico, morador de rua e que foi o único preso nas manifestações de 2013, sendo que a prova que tiveram dele foi, supostamente, de que com um Pinho Sol e água sanitária ele conseguiria planejar algum armamento. Coisa que é inimaginável. E o caso dele não é isolado na sociedade brasileira. Há muitos Rafaéis dentro da cadeia, gente que nem sabemos o nome. Então, o caso dele se tornou um emblema político pra nossa luta, porém, se o Rafael for solto nessa terça-feira, nossa luta continua.”

Foto: Felipe Larozza/ VICE

Gabrielle Nascimento, da organização 30 Dias por Rafael Braga e do Coletiva Negra Sou, da PUC-SP

“Se o Rafael continuar preso, vamos continuar lutando por sua liberdade. Se ele for solto e absolvido, vamos continuar lutando pelo fim do sistema carcerário, que encarcera pretos e pobres, criminalizando a pobreza, nossa cor e nossa etnia – algo que não conseguimos mudar –, com a desculpa da guerra às drogas.”

Foto: Felipe Larozza/ VICE

Douglas Belchior, da Frente Alternativa Preta e da Uneafro

“Não há como prever. A Justiça manteve o Rafael preso por quatro anos sem nenhum motivo lógico, consistente. Mantê-lo preso é uma questão de reafirmação dessa lógica de funcionamento do Estado, da Justiça brasileira, que é seletiva, que é racista; de um sistema carcerário que amontoa negros e que assassina negros aos montes. Então, não haverá nenhuma novidade se o habeas corpus dele não for concedido. Mas é um papel do movimento exigir que isso aconteça. É radicalmente injusta essa prisão, e a permanência dela é mais injusta ainda. Então, esperamos e lutamos para que esse habeas corpus seja concedido.”

Foto: Felipe Larozza/ VICE

Igor Gomes, do Observatório da Juventude – Zona Norte e da 30 Dias por Rafael Braga

“É difícil pensar no que vai acontecer com o Rafael. A meta é a liberdade, não só o habeas corpus agora, mas que ele seja absolvido e continue em liberdade. Não só livre, mas que, de certa forma, ele não corra o risco de ser preso de novo, de ser morto. Acho que, hoje, o movimento está reivindicando o fim das cadeias. Não só liberdade para Rafael Braga, mas o fim das prisões. Temos isso como norte: que a prisão, assim como a polícia e todo o aparato do Estado é, historicamente, um mecanismo de morte e de encarceramento. Acho que é trazer isso pro movimento negro cada vez mais como um norte, o fim das prisões.”

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