Imagine realizar um amplo debate internacional sobre os direitos das mulheres e criar normas e leis para os Estados sem a participação do público feminino. “O que o movimento feminista diria sobre isso? Por muito tempo, os adultos, mesmo que com as melhores intenções, têm discutido o direito das crianças e adolescentes sem ouvi-los”, afirma Luis Ernesto Pedernera Reyna, presidente do Comitê dos Direitos da Criança da Organização das Nações Unidas (ONU). Desde 2014, a organização vem trabalhando intensamente para mudar essa realidade. Mais de 709 crianças de 29 países foram ouvidas, juntamente a especialistas e organizações da sociedade civil, para a construção do Comentário geral n. 25, lançado na semana passada, que define como a Convenção sobre os Direitos da Criança e do Adolescente se aplica ao ambiente digital. E que vai promover mudanças na forma como Estados e empresas gerenciam negócios na área de tecnologia.
O documento explica que o setor empresarial, incluindo organizações sem fins lucrativos, afeta direta e indiretamente os direitos das crianças na prestação de serviços e produtos relacionados com o meio virtual. Por isso, cabe às empresas respeitar os direitos das crianças e prevenir e remediar abusos no mundo digital. “A legislação deve incluir fortes salvaguardas, transparência, fiscalização independente e acesso a medidas de reparação. Estados partes devem exigir a integração da privacidade por design em produtos e serviços digitais que afetam crianças”, orienta o documento. Na prática, isso significa que os sites precisam, desde o princípio, considerar o direito à privacidade das crianças.
“A internet é uma grande mídia de socialização. Os Estados têm que pensar em ter conteúdo educativo adequado e que promovam desenvolvimento da criança. Não adianta Facebook, Google e YouTube terem termos de uso acima de 13 anos. As crianças estão presentes nas plataformas. Por isso, o direito da criança por design. Isso significa que já no desenvolvimento esses serviços têm que se pensar nas crianças que serão usuárias diretas ou indiretas”, explica Pedro Hartung, coordenador jurídico da ONG Instituto Alana.