Pele Negra, Máscaras Brancas

FONTEPor Edergenio Negreiros Vieira, enviado para o Portal Geledés
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Enquanto a pandemia do coronavírus segue vitimando centenas de pessoas, todos os dias ao redor do mundo; o avanço da doença, que causa infecção respiratória grave expõe as contradições sociais no centro e na periferia do capital. O vírus que chegou ao Brasil vindo de avião, por meio das pessoas que vivem uma situação privilegiada no país, afetou primeiro as classes sociais com alto poder econômico. Agora no entanto a SARS-CoV-2, sigla em inglês que significa Severe acute respiratory syndrome coronavirus, alastra-se entre entre os pretos e pobres.

Uma festa de casamento em Itacaré, no sul da Bahia, pode ter sido o foco dos primeiros casos de coronavírus no país. O cenário paradísiaco de Itacaré, com altar montado num pier e tendo como horizonte o lindo oceano Atlântico, expunha o luxo e a riqueza dos mais abastados; que infectados com o vírus espalhava-o para os demais convidados majoritariamente brancos, e para os empregados majoritariamente pretos, do buffet.
Guilherme Benchimol, presidente da corretora XP investimentos, desnudou o caráter de classe do coronavírus no Brasil: “O pico da doença já passou quando a gente analisa a classe média, classe média alta. O desafio é que o Brasil é um país com muita comunidade, muita favela, o que acaba dificultando o processo todo.”

Entre desculpas e o velho argumento de que a fala fora mal interpretada, a opinião proferida pelo senhor Benchimol durante uma transmissão ao vivo do jornal O Estado de S. Paulo revela o caráter eugenista das elites brasileiras. Guilherme divide a pandemia entre o problema do pobre e o problema do rico. E como os ricos têm acesso aos planos privados de atendimento a saúde, além de condições econômicas para viver uma quarentena gourmet, com acesso a comida que chega pelo “delivery”, e entretenimento via plataforma de streaming o Brasil vai bem, obrigado.

SQN! O vírus agora está entres nós pretos e pobres. E ele tem sido fatal. Aliado a falta de condições socio-econômicas, a doença avança e mata aqueles que não têm acesso ao teste para o diagnóstico rápido da infecção, recebem no máximo “um fique em casa”, ou um “usa máscaras”, pele negra, máscaras brancas.
Para cada morte em Moema, bairro de classe média alta em São Paulo, quatro pessoas morrem na Brasilândia, bairro da periferia. “Brasilândia que não é a Disneylândia” tem 50% da sua população compostas por pessoas negras, a media de São Paulo é de 37%. Quem morre na Brasilândia são os pretos e pobres. E o pior muitos sequer fazem parte das estatísticas. Fato causado pela sub-notificação que é alimentada por um sistema público de saúde já saturado e sucateado pela falta de investimentos por parte do Estado. É a necropolítica do Estado brasileiro que já vitimava pela violência, pela desnutrição, pelo não acesso a saúde, a alimentação, agora vitima pela pandemia expondo a verdadeira face que as máscaras não podem esconder. Pele negra, máscaras brancas.

 

Edergenio Negreiros Vieira é professor, mestrando em Educação, Linguagem e Tecnologias, PPG-IELT da Universidade Estadual de Goiás.


** Este artigo é de autoria de colaboradores ou articulistas do PORTAL GELEDÉS e não representa ideias ou opiniões do veículo. Portal Geledés oferece espaço para vozes diversas da esfera pública, garantindo assim a pluralidade do debate na sociedade.

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