Penta

(Foto: Marcus Steinmayer)

Gosto de futebol e bem jogado. Acreditava como muitos que de todas as seleções na disputa desse Mundial, a Argentina era aquele que apresentava um dos melhores futebol e “pintava” como uma das grandes favoritas ao título. E, com o agravamento da situação econômica e política daquele país considerava, que caberia a seleção Argentina, oferecer um lenitivo a seu sofrido povo. Conhecemos a garra portenha e diante da crise enfrentada pelo país somente a “pátria de chuteira” poderia resgatar o combalido orgulho do povo argentino.

Por Sueli Carneiro

Surpreendentemente nada disso ocorreu e a seleção da Argentina deixou precocemente a disputa do Mundial. Me pareceu um mau presságio. Quando nem o futebol consegue, como é de sua tradição, cumprir a sua função ilusionista, em especial para os países sul-americanos, de aliviar, ainda que por momentos fugazes, as dores sociais, estamos com sérios problemas. Porque parece que a gravidade da crise é de tal magnitude que nos é tirado até o direito de nos iludir.

A “pátria de chuteira” sempre foi melhor do que a “pátria de gravata”. Por isso amamos Maradona – apesar de toda a histórica rivalidade de nossos futebol, e de sua petulância tipicamente argentina de considerar-se melhor que Pelé. Amamos os Ronaldinhos e Rivaldos porque eles expressam o melhor de nós, a nossa capacidade de resistência e superação às dificuldades e limitações que, em geral, estão presentes em nossas histórias e de nossos grandes craques. Eles não devem nada a ninguém. Só puderam contar com seu próprio talento, coragem e criatividade para escaparem do risco de serem hoje, para usar uma expressão de Arnaldo Jabor, empregados na “multinacional do pó”, “homens-bomba”, dentre eles, muitos talentos perdidos nas favelas, periferias e subúrbios do país que representam, como diz Jabor, “o início tardio de nossa consciência social”. Aqueles pelos quais nada fizemos e que agora nada mais nos pedem. Simplesmente tomam, em espécie, e em vidas.

Sofremos as dores de nossos craques, as suas má-fase porque sentimos que estamos também em perigo quando eles estão frágeis. É como se houvesse “baixado a resistência” de todos nós. Como se aquele vírus de nossa impotência social voltasse novamente a se manifestar. Cada vez que esse meninos pobres, negros, sem perspectiva na vida emergem para o estrelato do futebol renovam a esperança de todos os que vivem nas mesmas condições. Fazem cada um sonhar que é possível. Quando cada um deles fracassa nos leva de volta aos nossos becos sem saída.

A trajetória da seleção brasileira nessa Copa combina com as intermitências que vivemos. Com a disparada do risco-Brasil e o sobe- e- desce do dólar passei a temer que estava reservado a nossa seleção destino semelhante a da Argentina e nos fosse roubada a alegria e a ilusão do penta, para nos obrigar a compreender ou “realizar”, como preferem os psicanalistas, a gravidade da situação do país. Prefiro encarar isso com o penta.

Os cartolas não o merecem, os políticos menos ainda, mas o povo brasileiro e sul-americano precisam e merecem continuar acreditando que há lugar para a criatividade, para o talento individual, para a esperança e que apesar da insensibilidade e tirania do mercado, da inoperância e subserviência de nossos políticos, e do descalabro da situação social a escola sul-americana de futebol, através dos craques brasileiros, continua dizendo ao mundo que a habilidade, criatividade e competência que mostramos no futebol é a mesma presente em nossos povos que, infelizmente, como disse uma vez um festejado dirigente latino-americano, “nunca tiveram governantes a sua altura.”
Em tempo. Seja qual for o resultado do jogo de domingo, faltou um R.
Romário!

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