PM acusada de injúria racial vira ré: ‘Mucama’, ‘quem foi que aboliu essa lei no Brasil?’, teria dito para atendente em academia

A denúncia apresentada pelo Ministério Público do Rio de Janeiro trata sobre uma ocorrência em 2023, em uma lanchonete no interior de uma academia na Zona Oeste do Rio. A policial foi identificada como Odila Inês Rissi Mação, que é lotada no gabinete da presidência da Alerj.

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro aceitou a denúncia do Ministério Público do Rio (MPRJ) contra a policial militar Odila Inês Rissi Mação. Ela virou ré no processo que responde por acusação de injúria racial contra uma funcionária de uma lanchonete no Recreio dos Bandeirantes, na Zona Oeste.

Segundo a denúncia, a policial teria ofendido a atendente Michelle Ataide da Silva, de 35 anos, após chegar ao local para tomar um café.

“Mucama, traz o meu cafezinho. Eu não sei quem foi o filho da p* que aboliu essa lei no Brasil”, teria dito a policial, segundo o MP.

A expressão “mucama” refere-se às mulheres negras escravizadas que eram obrigadas a fazer os serviços caseiros, além de acompanhar as mulheres brancas em passeios ou amamentar seus filhos. Já a lei a que a policial se refere é a Lei Áurea, que aboliu a escravidão no Brasil.

O caso ocorreu na manhã de 8 de dezembro de 2023, na lanchonete de uma academia na Avenida Salvador Allende, no Recreio dos Bandeirantes, na Zona Oeste do Rio.

De acordo com o promotor responsável pela denúncia, a policial teve o objetivo de ofender a dignidade de Michelle. A denúncia relata que a policial fez as ofensas em voz alta.

Segundo o depoimento de Michelle, Odila chegou ao estabelecimento acompanhada de uma amiga e que essa amiga que teria feito os pedidos no balcão. Ainda de acordo com o depoimento de Michelle, Odila a ofendeu à distância, sentada em sua cadeira e usando um tom debochado e preconceituoso.

O MP destacou em sua denúncia que o insulto racista foi utilizado como instrumento de humilhação, evocando a escravidão e a ideia de inferiorização das mulheres negras. A promotoria entende que a autora da ofensa manifestou opinião desfavorável à lei que extinguiu a escravidão, reforçando a intenção de diminuir a população negra.

Presente e pedido de desculpas

Michele contou aos investigadores que após o ocorrido chegou a passar mal com a situação e chorou muito. Logo depois de ouvir as ofensas, Michelle passou pela mesa onde a policial estava e teria dito: “racismo é crime”.

g1 tentou contato com a defesa de Odila, mas até a última atualização desta reportagem não teve retorno. Contudo, em seu depoimento na delegacia, na época da ocorrência, a policial disse que o ocorrido foi apenas um “mal-entendido”.

Segundo Odila, ela e a amiga conversavam de forma descontraída antes de decidirem fazer os pedidos. Nesse momento, a policial teria falado “brincando” com a amiga, “que mesmo não sendo sua escrava ela poderia trazer seu café”.

Odila disse que não falou de forma pejorativa ou com o objetivo de ofender alguém e que nem mesmo notou a presença de Michelle no local.

Ainda segundo seu depoimento, Odila teria feito um pedido de desculpas pela situação, deixando uma carta e um presente para Michelle na recepção da academia.

No fim de seu depoimento, Odila disse ainda que “em tempo algum teve qualquer tipo de preconceito com quem quer que seja, ora de origem cor, religiosa, de cunho racial, ou outro qualquer”.

Ainda de acordo com o depoimento, Odila afirmou que por ser oficial da Polícia Militar, “convive com colegas de serviço de raças e origens diversas”.

O processo agora segue seu curso natural, com a citação da ré, diligências do MP, produção de provas, oitiva de testemunhas e julgamento.

O MP espera que Odila seja condenada por injúria racial, com pena de prisão e pagamento de uma multa por danos e reparação pelas ofensas. O promotor responsável afastou a possibilidade de acordo em sua denúncia, segundo ele, por considerar o crime ‘incompatível com a aplicação do instrumento, dada a natureza da infração penal e os valores sociais violados’.

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