Posicionamento Público contra a “reorganização escolar” proposta pelo governo de SP

Roberto Parizotti/Secom CUT

Contra a atual forma de “reorganização escolar” proposta pelo governo do estado de São Paulo:

pelo direito humano à participação social e ao acesso e à transparência da informação pública

Na Ação Educativa

As organizações abaixo assinadas manifestam sua indignação e repúdio à forma autoritária pela qual o processo de reorganização escolar da rede estadual de ensino tem sido encaminhado pelo governo estadual, caracterizado pela falta de informações consistentes, públicas e transparentes que deram base a tal decisão e pela insistência em desconsiderar as demandas de milhares de famílias. Com apoio de diversos setores da sociedade, a mobilização dos estudantes paulistas em defesa da escola pública e em resistência à política de reorganização escolar cresceu em todo o estado de São Paulo, demonstrando a profunda inadequação da proposta.

Da maneira como tem sido encaminhada, a reorganização escolar ocasionará o remanejamento compulsório de mais de trezentos mil alunos, impactando o cotidiano de inúmeras famílias, a atividade profissional de milhares de professores e demais profissionais da educação, sem contar as mudanças desencadeadas nas escolas que permanecerão na rede estadual, como o aumento do número de estudantes por turmas e o acirramento dos problemas relativos ao atendimento da educação de jovens e adultos e de estudantes com deficiência e transtornos globais do aprendizado, só para listar alguns exemplos. Apesar de prever o fechamento de noventa e três escolas, não há nenhuma garantia de uso dos prédios públicos para outras atividades educacionais e nem a previsão de recursos financeiros e humanos para o desenvolvimento das ações propostas.

Destaca-se a falta de informações públicas e transparentes a respeito dessa política, tanto para subsidiar o debate público, como para respaldar as decisões tomadas. A proposta não foi apreciada nem mesmo pelas próprias instâncias estaduais de mobilização e normatização da educação, tais como o Conselho Estadual de Educação e o Fórum Estadual de Educação. No que se refere à elaboração do Plano Estadual de Educação, destaca-se ainda a tentativa unilateral do governo do Estado de São Paulo de se desresponsabilizar do ensino fundamental, considerando as intenções de ampliar a municipalização prenunciada no acréscimo da meta 21 ao Plano Estadual de Educação em debate na Assembleia Legislativa.

A falta de diálogo ficou evidente pela reação da comunidade escolar e, em especial, dos estudantes, que ocuparam quase duzentas unidades escolares. A intransigência por parte de determinados gestores educacionais e escolares se manifestou em diversas unidades, com a coação de estudantes e a divulgação de informações equivocadas, confundindo as comunidades escolares. Tal situação é um explícito desrespeito aos princípios de gestão democrática e do direito à participação dos jovens e familiares na definição dos processos educacionais, políticos e sociais, tais como previstos na Constituição Federal (artigos 205 e 206), no Estatuto da Criança e do Adolescente (artigos 53 e 58), na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (artigos 2º, 3º, 14 e 15) e no Estatuto da Juventude (Artigo 3º) e reiterados pelo Tribunal de Justiça, na decisão, em sede liminar, da legítima manifestação dos estudantes e da necessidade de debate da política pública proposta.

Além das violações no direito ao acesso à informação e à participação social, destacam-se algumas preocupações com relação ao conteúdo da reorganização escolar proposta pelo governo estadual. A referida proposta desconsidera o impacto da política no médio e no longo prazo para as escolas que permanecerão na rede, ignorando inclusive os dispositivos sobre acesso, permanência e qualidade previstos no Plano Nacional de Educação (Lei 13.005/14) e na Emenda Constitucional 59 de 2009, tais como a obrigatoriedade do ensino para todos os jovens de até 17 anos a partir de 2016, a superação do analfabetismo e a elevação da taxa líquida no ensino médio e da escolaridade da população entre 18 e 29 anos.

Inconsistências metodológicas também foram identificadas no documento base apresentado como subsídio para a proposta de reorganização escolar, tal como explicitado em estudo realizado por professores do Bacharelado e do Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas da UFABC[1]. Nesse estudo, conclui-se que o documento tem graves inconsistências quanto à fundamentação científica e à escolha das variáveis e, portanto, não apresenta elementos para fundamentar, nem sequer sugerir, as conclusões anunciadas pela Secretaria Estadual de Educação quanto aos impactos da política de reorganização.

Os inúmeros posicionamentos públicos apresentados por universidades paulistas de excelência (Congregação das Faculdades de Educação da UNICAMP e da USP, Conselho de Graduação da Unifesp), entidades sindicais, movimentos sociais, fóruns, redes e organizações da sociedade civil, bem como as manifestações e ocupações de escolas estaduais, demonstram a grande insatisfação e as significativas preocupações em relação à reorganização proposta pelo governo estadual.

Assim sendo, as instituições e entidades signatárias conclamam a Secretaria Estadual de Educação a atender aos reclamos de estudantes, da sociedade civil organizada e da comunidade científica, deixando de implementar, nesse momento, o projeto de reorganização da rede estadual de ensino. Reivindicamos que a decisão sobre uma eventual reorganização da rede estadual esteja de fato embasada em efetivos processos participativos, com amplo debate social,  por meio da realização de audiências públicas regionalizadas; em planos de médio e longo prazos para a educação paulista; e em estudos melhor fundamentados que justifiquem determinadas decisões; bem como no dimensionamento do impacto em termos de recursos financeiros, humanos e pedagógicos das unidades que permanecerão e daquelas que eventualmente venham a ser encerradas.

Declaramos também nosso apoio aos estudantes e familiares e a todos aqueles que, ao lado dos professores e demais profissionais da educação, têm defendido e lutado cotidianamente por uma escola pública de qualidade que garanta o direito à educação de todas as crianças, adolescentes, adultos e idosos no estado de São Paulo. Nesse sentido, também solicitamos respeito e cuidado com a situação dos estudantes concluintes do ensino médio, para que não haja retaliações àqueles e àquelas que se mobilizaram contra a reorganização escolar e que sejam providenciados os documentos necessários de forma a não prejudicar a continuidade de sua trajetória escolar.

Com muita preocupação, manifestamos ainda que a sociedade não admitirá qualquer tipo de violência ou abuso das autoridades governamentais contra os estudantes que legitimamente vêm se organizando por meio das ocupações de unidades escolares e em manifestações de rua. Preventivamente, medidas judiciais de proteção desses estudantes devem ser tomadas para que não haja risco de que se fira a integridade das/dos adolescentes e jovens e o seu direito à livre manifestação.

30 de novembro de 2015.

Assinam:

Ação Educativa – Assessoria, Pesquisa e Informação

AMARRIBO Brasil

Associação Cidade Escola Aprendiz

Associação de Cooperação, Promoção e Incentivo à Cidadania – Associação Cooperapic

Centro de Estudos Educação e Sociedade – CEDES

Centro de Estudos e Pesquisas em Educação e Ação Comunitária – Cenpec

Comitê São Paulo da Campanha Nacional pelo Direito à Educação

Conselho de Representantes dos Conselhos de Escola – CRECE

CORSA – Cidadania, Orgulho, Respeito, Solidariedade e Amor

Diretoria da Associação dos Docentes da USP

ECOS – Comunicação em Sexualidade

Escola de Governo

Fórum Municipal de Educação Infantil de São Paulo

Fórum de Educação de Jovens e Adultos do Estado de São Paulo

Fórum Paulista de Educação Infantil

Geledés – Instituto da Mulher Negra

Grupo THESE – Projetos Integrados de Pesquisas em Trabalho, História, Educação e Saúde (UFF-UERJ-EPSJV-Fiocruz)

GT Educação da Rede Nossa São Paulo

Instituto Avisa Lá – formação continuada de educadores

Instituto Brasileiro de Estudos e Apoio Comunitário – IBEAC

Instituto Paulo Freire

Mais Diferenças

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST

SINTEPS – Sindicato dos Trabalhadores do Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza

União Municipal dos Estudantes Secundaristas de São Paulo – UMES

[1] PO, M.V.; YAMADA, E.M.K; XIMENES, S.B; LOTTA, G.; ALMEIDA, W.M. Análise da política pública de Reorganização Escolar proposta pelo governo do Estado de São Paulo. São Bernardo do Campo, SP: novembro de 2015.

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