Rússia condena Brittney Griner, jogadora de basquete dos EUA, a nove anos de prisão

Atleta foi presa em aeroporto com óleo de haxixe; Biden diz que sentença é inaceitável

FONTEFolha de São Paulo, por Thiago Amâncio
Brittney Griner, jogadora de basquete americana, ao chegar a audiência por posse ilegal de cânabis nesta quinta - Evgenia Novozhenina/Pool/Reuters

Um tribunal na Rússia condenou nesta quinta-feira (4) a jogadora de basquete dos EUA Brittney Griner a nove anos de prisão. Em meio à tensão diplomática crescente entre Moscou e Washington devido à Guerra da Ucrânia, o caso tem mobilizado o governo de Joe Biden, comovido a comunidade esportiva e, mais uma vez, dividido a sociedade americana.

Em nota, o presidente dos EUA chamou a condenação de inaceitável e afirmou que “vai continuar a trabalhar incansavelmente” para repatriar a americana.

Griner foi detida em 17 de fevereiro, no Aeroporto Internacional Sheremetievo, próximo a Moscou, acusada de carregar cartuchos de óleo de haxixe —substância derivada da cânabis que é ilegal na Rússia—, para serem usados em um cigarro eletrônico.

Se a situação já parecia ruim, o caso ganhou outra dimensão uma semana depois, quando Vladimir Putin decidiu invadir a Ucrânia. Nas semanas que se seguiram, Biden chamou o russo de criminoso de guerra, Moscou afirmou que os EUA promovem banditismo e as relações entre os dois países chegaram à beira do colapso. Notícias ruins para quem esperava uma intervenção diplomática para deixar a cadeia.

Griner estava na Rússia para jogar na liga de basquete feminino do país no período de intertemporada do esporte nos EUA —algo que jogadoras costumam fazer para complementar a renda, dados os salários mais baixos em comparação à modalidade masculina. Ela atuava pelo UMMC de Iekaterimburgo, na região dos montes Urais, mais perto do Cazaquistão do que do leste da Europa.

Nos EUA, Griner é contratada do Phoenix Mercury. Aos 31 anos e 2,06 metros de altura, ela é considerada uma das estrelas do basquete no país desde a liga universitária, quando defendeu a Universidade de Baylor. A bicampeã olímpica (Rio-2016 e Tóquio-2020), nos protestos contra a morte de George Floyd em 2020, se juntou ao grupo de atletas que se manifestaram contra o fato de o hino americano tocar antes dos jogos. “Sinceramente eu acho que não devíamos tocar o hino nacional durante nossa temporada. Acho que deveríamos nos opor a isso”, disse, na ocasião.

Logo após ser presa, Griner assumiu diante de um tribunal russo a culpa por levar o óleo de haxixe para o país, mas sempre sustentou que não o fez por querer. Na última semana, afirmou que não sabia como a substância foi parar em sua bagagem. “Se eu tivesse que dar um palpite, diria que foi porque fiz as malas correndo”, afirmou. Ela tem prescrição médica para usar maconha de forma medicinal nos EUA, para tratar de dores crônicas. A defesa argumentou, no processo, que isso é comum entre atletas de elite.

Após a prisão, a atleta recebeu o apoio público de seu time nos EUA, da WNBA (liga feminina de basquete) e de uma série de colegas, que cobraram esforços do governo para tirá-la da prisão. Nesta quinta, as jogadoras do Phoenix Mercury e do Connecticut Sun ficaram em silêncio por 42 segundos antes de uma partida. Essa é a numeração do uniforme de Griner na liga.

A mulher da jogadora, Cherelle Griner, chegou a dizer em meados de junho que não tinha confiança na gestão Biden para resolver a situação, mas mudou de posição após receber uma ligação do próprio presidente e de sua vice, Kamala Harris. Na ligação, o mandatário prometeu que trabalhava para “garantir a libertação [da jogadora] o mais rápido possível”.

Biden mobilizou o Departamento de Estado e fez uma oferta ao Kremlin: a troca de Griner e do ex-soldado Paul Whelan, preso desde 2018 sob acusação de espionagem, por Viktor Bout, traficante de armas preso nos EUA que ficou mais famoso por inspirar o filme “O Senhor das Armas”, de 2008, com Nicolas Cage.

O acordo ainda não foi selado. Segundo a rede de TV americana CNN, que citou fontes no governo americano, a Rússia quer incluir no pacote de troca um ex-coronel condenado por assassinato na Alemanha, Vadim Krasikov. Nesta quinta, Washington voltou a instar Moscou a aceitar a oferta. “É uma proposta séria. Eles deveriam ter concordado semanas atrás, quando a fizemos pela primeira vez”, disse o porta-voz de segurança nacional John Kirby.​

Como muito do que envolve diplomacia nos EUA, o caso também provocou debate interno, que esquentou após a oferta de libertação do traficante de armas. O ex-presidente republicano Donald Trump, acusado por opositores de fazer o jogo político de Putin nos EUA, condenou os esforços —com direito ao habitual exagero— para libertar a jogadora, a quem chamou de mimada.

“Ela entrou carregada de drogas em um território hostil, onde eles são muito vigilantes quanto a drogas, não gostam de drogas”, afirmou, em entrevista a um podcast. “Ela foi pega e agora devemos tirá-la do país? E ela ganha, você sabe, muito dinheiro, eu acho. Devemos trazê-la trocando-a por um assassino frio e um dos maiores traficantes de armas do mundo, [que] matou muitos americanos? E ela vai receber uma passagem grátis, e nós vamos buscá-la.”

Na audiência final do processo nesta quinta, Brittney pediu que o tribunal não a visse como um peão no tabuleiro do jogo político. “Sei que todo mundo continua falando sobre ‘peão político’ e sobre política, mas espero que isso esteja longe deste tribunal”, disse. Faltou combinar com os russos.

Em nota após a condenação, a agente da jogadora, Lindsay Colas, afirmou que a sentença “prova o que soubemos ao longo do processo, que Brittney está sendo usada como peão político” e agradeceu os esforços do governo americano por sua libertação.Além da pena de prisão, a jogadora também terá que pagar uma multa de 1 milhão de rublos (R$ 85 mil).

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