São 16 dias de Ativismo? Nenhuma mulher negra e nem o recorte racial

FONTEPor Mônica Aguiar, enviado ao Portal Geledés
Foto: Stock/Adobe

Não poderia deixar de falar das minhas caminhadas nas estradas da internet, neste 16 dias de ativismo pelo combate à violência contra as mulheres em 2021.

Em cada parada uma ressalva. O que Eu observei que existe em comum além da agenda pelo fim da violência contra as mulheres?

– Atividades com ampla maioria de mulheres brancas para mulheres brancas. Uma ou outra com que adoram denominar, “recorte racial”.

Em uma destas paradas entro na casa da BBC, e vejo que o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, apresentou uma “versão brasileira” da campanha de combate à violência contra as mulheres. Fez questão de enfatizar que o objetivo da sua campanha é “conscientizar a sociedade de que a violência contra a mulher é um problema de todos. As denúncias de violência contra a mulher podem ser feitas por qualquer pessoa, até mesmo de forma anônima, por meio do serviço Ligue 180”. Basta ligar.

Fácil assim? É fácil? As dificuldades são de responsabilidades das vítimas que são mulheres?

Continuando meu caminho, parando em vários endereços, chamou minha atenção a Casa das Nações Unidas. Nesta casa escutei informações das ações desenvolvidas pela ONU MULHERES. Soube do lançamento da Campanha “Pinte o mundo de laranja: fim da violência contra as mulheres, agora!”. Uma campanha internacional contra a violência de gênero para marcar o Dia Internacional para a Eliminação da Violência contra as Mulheres.

Falaram que durante a pandemia, os números de violência doméstica dispararam no mundo. Que um novo relatório da ONU Mulheres mostra que 2 em cada 3 mulheres relataram sofrer ou conhecer alguém que sofre algum tipo de violência e que apenas 10% denunciaram as agressões. Relataram várias iniciativas.

Continuei meu caminho e parei na Casa Congresso Nacional. Nesta acontecia uma Seção Solene para comemorar o Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra a Mulher. Falaram das boas práticas no enfrentamento à violências contra as mulheres.

Pera ai. Até que enfim encontrei uma Casa com agenda que identifica as mulheres negras e traduz nas falas a realidade da sociedade brasileira? É isto mesmo?

É sim minha genteeee!

Estas mulheres senadoras, deputadas e representantes de várias instituições na seção solene estão afirmando que as leis para combater a violência contra a mulher têm avançado, mas ainda não chegam às mulheres negras e periféricas.

Confirmam que foi aprovado recentemente pelo Senado a proposta que destina pelo menos 5% dos recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública para o combate à violência contra a mulher e citam as Leis aprovadas neste ano pelos parlamentares e as consideram um avanço.

Entre as Leis, elas citam a que tipifica o crime de perseguição, prática também conhecida como stalking (Lei 14.132/21); a que determina que a prevenção da violência contra a mulher seja incluída nos currículos da educação básica (Lei 14.164/21); a que insere no Código Penal o crime de violência psicológica contra a mulher e cria o Programa Sinal Vermelho contra a Violência Doméstica (Lei 14.188/21); e a que visa combater a violência política contra a mulher (Lei 14.192/91). Afirmaram a importância da instrumentalização dos Órgãos e parceiros. Consideraram essencial a implantação de órgão e redes de defesa e proteção da mulher nas Câmara de Vereadores, além do fortalecimento das delegacias especializadas, entre outros órgãos.

A advogada Josefina Serra dos Santos, diretora da Comissão de Igualdade Racial da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do DF, presente nesta Seção afirma que: “As mulheres periféricas e negras não têm acesso aos direitos garantidos em lei e sofrem violência inclusive de outras mulheres nas casas, nos hospitais, nas escolas, em delegacias e no Poder Judiciário.

“A maioria das vezes, elas não têm nem acesso às tecnologias, porque antes da tecnologia, elas têm que comprar um prato de comida pro seu filho. E quando elas vão procurar os aparelhos do Estado, elas são humilhadas”, lamentou.

A vice-presidente do Instituto Maria da Penha, Regina Barbosa afirma que as violações das mulheres no Brasil, conforme ela, são naturalizadas e incluem importunação sexual, estupro de vulnerável, violação dos direitos no ambiente de trabalho, objetificação dos corpos femininos, racismo estrutural, violência nas redes sociais, violência obstétrica e assassinatos de mulheres parlamentares.

Mas é isto mesmo minha genteeeee. Nem todas as mulheres tem aceso iguais as políticas e programas de gestões públicas no Brasil.

Neste período de pandemia com as altas taxas de desemprego, subemprego, onde a fome e a pobreza só crescem, as mulheres negras que já eram afetadas pelas desigualdades, são a ampla maioria das que estão dentro do foço de todas as desigualdades e muito expostas as variantes formas de violências..

E não é vitimização não! É a realidade de nossa sociedade que é extremamente desumana com as mulheres negras.

As agendas globais devem considerar o racismo existente, entender que é fundamental nas pautas igualitárias o reconhecimento que o acesso aos direitos e mecanismos que afirmam ser de oportunidades não chegam nas mulheres negras com a mesma proporção e trato.

Em todas as Casas que entrei, neste caminho percorrido, somente vi fotos de mulheres brancas pendurado nas paredes.

Vc acha isto certo?

  • Porque não tem fotos de mulheres negras?
  • Porque a exclusão permanente da agenda e imagem das mulheres negras na pauta de combate a violência contra as mulheres?

É preciso aceitar que a invisibilidade contribui com as diversas formas violações sustentadas em sua maioria pelo Estado que deveria dar proteção igualitária.

Em 2016, foi lançado para toda a sociedade brasileira o Dossiê “A situação dos direitos humanos das mulheres negras no Brasil: violências e violações”, produzido pela Geledés e a Criola, duas organizações nacional de mulheres negras e com reconhecimento internacional.

Este dossiê já constava as diferentes formas de violações de direitos humanos de mulheres negras brasileiras.

Foi inclusive apresentado na 157ª sessão da Comissão da OEA – Organização dos Estados Americanos.

O Dossie afirma que “apesar de o Brasil ter se empenhado nas últimas décadas em ações de diminuição das desigualdades sociais e de enfrentamento da violência contra a mulher, elas não impediram o aumento de 54.2% dos assassinatos de mulheres negras , o aumento do encarceramento feminino e a continuidade das violações de direitos das mulheres negras. Que a violência é um fenômeno complexo e, nas sociedades afetadas pelo racismo patriarcal heteronormativo, atinge de maneira desproporcional às populações de pele escura, com forte marca do sexismo e das fobias LGBT”.

O QUE É 16 E 21 DIAS DE ATIVISMO

16 Dias de Ativismo contra a Violência de Gênero é uma campanha internacional de combate à violência contra mulheres e meninas. Começa no dia 25 de novembro, Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra as Mulheres, e vai até 10 de dezembro, Dia Internacional dos Direitos Humanos.

No Brasil, a mobilização deveria abranger o período de 20 de novembro Dia Nacional da Consciência Negra a 10 de dezembro.

** ESTE ARTIGO É DE AUTORIA DE COLABORADORES OU ARTICULISTAS DO PORTAL GELEDÉS E NÃO REPRESENTA IDEIAS OU OPINIÕES DO VEÍCULO. PORTAL GELEDÉS OFERECE ESPAÇO PARA VOZES DIVERSAS DA ESFERA PÚBLICA, GARANTINDO ASSIM A PLURALIDADE DO DEBATE NA SOCIEDADE.

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