Será que conseguimos expurgar o jaguncismo da política brasileira?

(Foto: João Godinho)

A resposta não é fácil, embora tenha sido cassado, recentemente, em 12.9.2016, o mandato do deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que presidiu a Câmara dos Deputados de 1º de fevereiro de 2015 até renunciar ao cargo, em 7 de julho de 2016. Ele é a figura mais escancarada do jaguncismo da política brasileira: lobista e evangélico fundamentalista, aspirava tornar o Brasil uma teocracia neopentecostal.

Por Fátima Oliveira enviado para o Portal Geledés

Desde a eleição do atual Congresso Nacional, o diretor de Documentação do Diap, Antônio Augusto, cantou a pedra: “São sérios os riscos de retrocessos em relação aos direitos civis e à legislação trabalhista”, pois o Congresso eleito em 2014 era o mais conservador desde o fim da ditadura de 1964 – mais do que suficiente para dar o ar de trevas que nada tem a dever à jagunçagem!

Vivenciamos até agora uma explosão de ódio fascista ao povo e a suas conquistas políticas e sociais; aos partidos de esquerda e a suas lideranças; ao país, via pautas neocolonialistas – dilapidação das riquezas nacionais – de interesse da burguesia local e internacional!

Eduardo Cunha “pintou e bordou” no período no qual presidiu a Câmara dos Deputados. Parecia ter poderes ilimitados e posava de presidente da República. Não apenas encaminhou projetos de lei contra os direitos trabalhistas, como defendia o machismo e a misoginia e se posicionava contra qualquer proposta civilizatória de conferir direitos a pessoas discriminadas.

Ele logrou êxitos inclusive no pleito de colocar na Presidência da República o PMDB ao arrepio do voto popular. A esquerda mundial considera que Dilma Rousseff foi vítima de um golpe jurídico, parlamentar, além de midiático, misógino e elitista, já que contra a deposta não conseguiram provar absolutamente nada!

O caso Eduardo Cunha demonstra por que um expressivo número de políticos gasta rios de dinheiro para se eleger aos parlamentos municipais e estaduais e ao Congresso Nacional (deputados federais e senadores), quando o salário nominal de um parlamentar durante uma legislatura é insuficiente para cobrir as despesas de sua eleição. É que, para a maioria deles, sobretudo os de extração conservadora e direitista, o mandato só tem uma serventia: ser um balcão de negócios escusos, numa cultura de bonificações e patrimonialismo, em que sociopatas transitam em todas as esferas!

Especialistas dizem que “as sociopatias – grosso modo: personalidade antissocial – atingem de 1% a 3% da população. Mas nos meios políticos pode chegar a 6%. São pessoas ávidas por poder e buscam-no, de qualquer jeito! Onde há corrupção, que é uma doença social, ela é feita por quem porta transtornos de personalidade de inegável caráter antissocial, ou narcísico, ou ‘borderline’. Sociopatas não são doentes, portam personalidades bandidas que podem chegar ao banditismo” (Oliveira, Fátima. “Sociopatia & poder”, 15.5.2006).

“Pra quem sabe ler, um pingo é letra”: após Eduardo Cunha se aboletar na presidência da Câmara dos Deputados, escrevi que ele seria um Severino Cavalcati (2005) piorado e mais virulento. Se Severino Cavalcanti era um paspalhão desde o olhar, Cunha é puro Hermógenes, um chefe jagunço de “Grande Sertão: Veredas”, de Guimarães Rosa, que nem sequer respeitava as normas/leis da jagunçagem, como disse Riobaldo Tatarana: “O senhor sabe: sertão é onde manda quem é forte, com as astúcias. Deus mesmo, quando vier, que venha armado” (Oliveira, Fátima. “Uma república democrática e laica sob o sistema jagunço”, O TEMPO, 17.2.2015).

Como em 2005, em 2015 foi a política que saiu perdendo e, em 2016, o povo e o país.

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