Questões relacionadas a gênero tem estado no centro das atenções da sociedade nos últimos anos: por um lado, com o crescimento e visibilidade de ativismos feministas e LGBTQIA+, em particular de pessoas trans; por outro lado, com a disseminação do pânico moral e da censura por grupos ultraconservadores. Como esse contexto tem afetado a educação e como as políticas educacionais podem contribuir para a promoção da igualdade de gênero, raça e sexualidade?
Buscando contribuir com esse debate, A Ação Educativa, Geledés – Instituto da Mulher Negra, Fundação Carlos Chagas, Faculdade de Educação da USP (FEUSP) e Professores contra o Escola Sem Partido desenvolveram coletivamente uma pesquisa sobre gênero nas políticas educacionais. Os resultados preliminares serão apresentados em seminário público no Centro MariAntonia da Universidade de São Paulo, no dia 11 de novembro. O estudo conta com apoio do Fundo Malala.
A pesquisa inclui um balanço de produções teóricas acadêmicas e da sociedade civil, um mapeamento de iniciativas legislativas e uma análise de dados quantitativos sobre as desigualdades que atingem o campo da educação. A partir disso, a pesquisa irá construir recomendações para a promoção da igualdade de gênero e raça nas políticas educacionais e no debate com a sociedade civil.
O seminário tem por objetivo apresentar resultados preliminares desses levantamentos, ampliando as análises a partir do debate com educadoras/es, pesquisadoras/es, estudantes e demais interessados. Além disso, o encontro busca promover reflexões sobre os desafios e possibilidades para políticas educacionais comprometidas com a promoção da igualdade de gênero, raça e sexualidade.
Desafios e a descontinuidade de políticas para a igualdade de gênero
As entidades observaram que o Brasil nunca teve um programa integral de promoção da igualdade de gênero e sexualidade nas políticas educacionais, apesar de todos os avanços conquistados pela luta dos movimento negro, feminista e LGBTQIA+.
Historicamente, a agenda enfrenta uma grande oposição de setores religiosos e conservadores, e adesão tímida de atores políticos do campo progressista. Segundo a coordenadora do projeto Gênero e Educação, da Ação Educativa, Bárbara Lopes, um dos efeitos mais nefastos da perseguição às agendas de gênero é a disseminação da autocensura entre profissionais da educação. “A estridência dos grupos ultraconservadores cria uma percepção de que a população é muito refratária a pautas de gênero. Mas há pesquisas anteriores, realizadas pela Ação Educativa e Cenpec, que mostraram um grande apoio ao papel da escola na promoção da igualdade”, afirmou.
Analisando o fenômeno da censura, Renata Aquino, do coletivo Professores Contra o Escola Sem Partido, reflete que é preciso fortalecer a resistência frente às novas dinâmicas da extrema-direita e do campo conservador. “O tipo de censura que nós, enquanto sociedade civil, começamos a enfrentar em 2014 e 2015, na tramitação do Plano Nacional de Educação, com o ápice dos projetos Escola Sem Partido , mudou de forma. Além de terem surgido outras estratégias no campo legislativo, a censura se capilarizou no chão da escola e, inclusive, em vezes no ensino superior. Então, a resistência precisa continuar”, diz a pesquisadora.
Além disso, os dados buscam reunir evidências para o encerramento de projetos e programas governamentais antigênero, para o combate dos seus impactos no enfrentamento do racismo e para a elaboração e implementação de normativas voltadas para a promoção da igualdade de gênero nas políticas educacionais. Para Suelaine Carneiro, coordenadora do programa de educação do Geledés – Instituto da Mulher Negra, a construção de um diagnóstico, visando a equidade de gênero e raça como forma de enfrentamento das desigualdades educacionais, é um passo fundamental para se pensar a qualidade na educação.
A pesquisadora reflete sobre o descompromisso com a implementação do ensino da história e cultura afro-brasileira, somado à descontinuidade de processos focados na educação em gênero e à desvalorização docente. Além disso, Suelaine
aponta a necessidade da reconstrução da concepção de cidadania e igualdade no espaço escolar e do combate às situações de vigilância e ataques à educação. “Nós estamos vivendo um momento em que temos que reconstruir a concepção de educação como um dever do Estado, frente aos seis anos de desmonte que ainda impacta todo o sistema educacional brasileiro. É preciso olhar para os impactos da pandemia e para os desafios presentes no cotidiano escolar. A partir do momento em que as desigualdades educacionais são construídas a partir da diminuição do Estado e sua desobrigação, o diagnóstico se faz importante pois expõe exatamente a violação do direito à educação e o quanto gênero e raça são fundamentais para construir uma educação emancipatória” afirma Carneiro.
Seminário recebe inscrições até o dia 10 de novembro
O seminário acontecerá em parceria com o Centro MariAntonia da USP no dia 11 de novembro, das 9h às 18h e apresentará os resultados preliminares da pesquisa. O evento contará com mesas e painéis de discussão sobre o fenômeno ultraconservador na educação com diferentes especialistas. Pesquisadores, educadores, estudantes, movimentos sociais e organizações da sociedade civil podem se inscrever via formulário (acesse aqui) para participar até um dia antes do evento (10/10).
Confira a programação
9h – Boas vindas e apresentação
9h30 – Mesa 1: Ultraconservadorismo: velhas e novas arenas de luta A partir de diferentes perspectivas, o diálogo busca ampliar a leitura de contexto de ataques ao gênero, situando o fenômeno ultraconservador em sua ofensiva nas políticas educacionais.
● Raça e gênero: compreendendo o fenômeno ultraconservador na educação – Suelaine Carneiro (Geledés – Instituto da Mulher Negra) ● Ataques legislativos – Professores Contra o Escola Sem Partido ● Produção acadêmica e da sociedade civil – Fundação Carlos Chagas
12h30 -Almoço
Participantes do evento podem sair para almoçar e retornar.
14h30 – Mesa 2: Desafios de gênero na educação
● Desigualdade entre as mulheres: Gênero, raça e interseccionalidade – Bárbara Araújo (CAp-UERJ)
● Identidade de gênero – Dayanna Louise (ANTRA)
● Masculinidades – Alexandre Bortolini (ABETH)
● Segregação nas carreiras – Liliane Bordignon (Fundação Carlos Chagas)
16h – Intervalo
16h30 – Mesa 3: Anúncios e possibilidades
● Indique Gênero e Plano Nacional de Educação – Denise Carreira (FEUSP) ● Escola, cultura e território – Jéssika Tenório (Ação Educativa)
● Coletivos juvenis e comunicação comunitária – Quinn (Poeta e Slammer) ● Educação sexual na quebrada – Elânia Francisco (Espaço Puberê)
Serviço
Seminário da Pesquisa “Gênero e Políticas Educacionais”
Dia: 11/11 (segunda-feira)
Horário: das 9h às 18h
Local: Centro MariAntonia da USP (Rua Maria Antônia, 294. Vila Buarque – São Paulo/SP)