Um passo à frente, dois atrás

Ter um negro à frente da pasta da igualdade racial faz diferença 'para abordar as representatividades históricas'

FONTEFolha de São Paulo, por Ana Cristina Rosa
A jornalista Ana Cristina Rosa é Jornalista especializada em comunicação pública e vice-presidente de gestão e parcerias da Associação Brasileira de Comunicação Pública (ABCPública) - Foto: Keiny Andrade/Folhapress

Será que alguém que não sabe o que é ser preterido pela aparência, que jamais perdeu uma oportunidade de trabalho em razão da cor da pele, que nunca foi olhado ou tratado com suspeição pela ascendência étnica é a pessoa mais indicada para comandar uma secretaria criada para promover a igualdade racial?

Esse é o tipo de dúvida que deveria passar pela cabeça de quem se preocupa em enfrentar o racismo no país. Mas não é bem assim. E a Prefeitura de Palmas (TO) deu um excelente exemplo disso com a criação da Secretaria Municipal de Políticas Sociais e Igualdade Racial. O que poderia ser motivo de aplausos, virou alvo de críticas fundamentadas quando a prefeita, uma mulher branca, nomeou outra mulher branca para o comando da pasta.

Desconsiderar a representatividade negra numa nação de maioria autodeclarada afrodescendente (56%, pelo IBGE), onde o racismo está institucionalizado e, na prática, se constitui na maior barreira à promoção da cidadania, do desenvolvimento e da justiça social não é a maneira mais apropriada para fazer frente a uma questão tão complexa.

Os indicadores de violência ajudam a compor uma noção do cenário. Em 2023, Palmas, que já foi considerada a capital mais tranquila do Brasil, viu a onda de violência e criminalidade aumentar em mais de 200%. Homens pretos e pardos foram a maioria (69%) das vítimas.

Na avaliação da polícia, 90% dos homicídios têm relação com tráfico de drogas. Já entidades ligadas à área dos direitos humanos apontam que metade dos mortos não possuía passagem policial e correlacionam o fato com a questão étnica.

Ter um negro à frente da pasta da igualdade racial faz diferença “para abordar as representatividades históricas estruturais enfrentadas pela comunidade negra”, como destacou em nota a Ajunta Preta, Coletivo Feminista de Mulheres Negras do Tocantins. E não basta ser negro, é preciso ter letramento racial para compreender a dinâmica do racismo.

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