Após o assassinato de George Floyd, nos EUA, a administração federal daquele país apresentou um projeto de lei com o nome de Floyd para controle da polícia, em especial com vistas a rever a imunidade qualificada de agentes de segurança e estabelecer o papel de supervisão do Departamento de Justiça dos EUA sobre as forças policiais, bem como rever as regras sobre o dolo de policiais em casos de abusos. O PL passou na Câmara e aguarda análise no Senado.
Mesmo com chacinas em série e alta da violência policial, o governo federal no Brasil endossou o PL da Lei Orgânica da Polícia Militar, aprovado na Câmara em dezembro e que tem o apoio do Executivo como aceno às corporações policiais. Espera-se mais do governo que derrotou o partido do fuzil. Sem rever pontos fundamentais da lei, corre-se o risco de trocar afago por um tiro no pé. É legítimo que PMs pressionem por nova lei; é temerário que o governo sucumba sem desmilitarizá-las. Aquém, as modificações até o momento na lei são insuficientes.
Há o problema do que a proposta de lei diz. O regramento erra ao exigir que oficiais tenham bacharelado em direito, perdendo a oportunidade de fortalecer sua formação em segurança e trocando-a por um bacharelismo ultrapassado e ineficiente. A lei discrimina mulheres ao estabelecer, concretamente, um teto de 20% das vagas para as policiais, em vez de assegurar acesso universal a todas as carreiras policiais. A lei possibilita poder de fiscalização ambiental a quem não tem competência para tanto.
Há, igualmente, o problema do que a lei não diz. A nova lei orgânica da PM já nasce velha: não revê a estrutura militarizada das polícias no país; não toca nem de relance no tema dos controles externo, interno e social das PMs e regras de uso da força; deixa intactos a discricionariedade policial e o racismo institucional e perde a oportunidade de debater proteção a PMs, inclusive saúde mental. É na negociação do PL que veremos se vidas negras —83% dos mortos pela polícia— importam.