Yorùbá: língua, memória e parte da consciência do povo negro

Diferente de línguas mortas como o latim, o grego arcaico e o aramaico, há uma língua de tradição falada, surgida há milênios e que atravessou o Oceano Atlântico nos porões nos navios negreiros vindos da costa ocidental africana para sobreviver até hoje na Bahia: o yorùbá.

Fonte: Rede Bahia

Dividido em centenas de dialetos e falado por 30 milhões de pessoas espalhadas por Benin, Nigéria, Togo, Serra Leoa e Cuba, termos como abadá, acarajé, afoxé, agogô, axé, caruru, ilê, kabula, oiá, vatapá, xinxin e zumbi mostram que palavras do dicionário yorùbá também fazem parte do dia-a-dia dos baianos. “O yorùbá é tão falado aqui na Bahia que as pessoas usam palavras no diálogo e não sabem que têm origem no yorùbá”, explica a coordenadora pedagógica da Escola Municipal Eugênia Anna dos Santos, Alexsandra Oliveira.

Antes mesmo da implementação da lei 10.639/03, que estabelece a obrigatoriedade do ensino de história da África e da cultura afro-brasileira, a Escola, nascida informalmente na década de 70 como uma creche, já era referência no ensino das tradições e dos mitos africanos. Apesar de não existir uma disciplina específica para o ensino do yorùbá, a diretora Ana Lice Mendes esclarece que as crianças aprendem palavras de saudação e formas de tratamento da língua.

Chegada
Três grandes grupos foram trazidos para o Brasil no século XVI: Yorubá, culturas africanas islamizadas e tribos Bantu. Desde aquela época, a África era uma imensa babel de línguas e o Yorùbá era mais um idioma da família lingüística nigero-congolesa. Mas a língua ganhou destaque no estado baiano por ser a língua adotada pela Nação Ketu. “A maioria dos negros que chegaram à Bahia veio da Nação Ketu e o yorùbá é mais falado nas regiões originárias dessa nação”, ressalta a vice-diretora da escola, Ivanildes Nascimento.

 

O ensino


“Nós não ensinamos o yorùbá. Nós utilizamos palavras como paz, amor, com licença, bom dia, boa tarde, até logo… É uma forma de resgate da cultura africana, mas não existe uma disciplina especifica para o ensino do yorùbá na escola, até porque não é nosso objetivo. A escola é conveniada à Prefeitura Municipal e as matérias atendem a um currículo sistêmico. Implantar o yorùbá dentro desse sistema seria complicado, pois é uma língua muito difícil que pode gerar interpretações dúbias. Então, passar isso para as crianças seria um tanto complicado”, afirma a diretora da Eugênia Anna dos Santos.

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Crianças da escola aprendem palavras de saudação e formas de tratamento

 

A escola fica na rua Direita de São Gonçalo e funciona dentro do terreiro Ilê Axé Opô Afonjá, comandado pela ialorixá Mãe Stella de Oxossi. Em 1992, a escola foi incorporada ao sistema ensino de Salvador atendendo, atualmente, crianças 6 a 14 anos da 1ª a 4ª série. No entanto, mesmo que o projeto pedagógico contemple processos referenciais da cultura afro-brasileira, há crianças de outras religiões que seguem o conteúdo regular do Ensino Fundamental. A coordenadora pedagógica, Alexsandra Oliveira, afirma que a escola não trabalha com religião e sim com o resgate cultural.

 

Neste contexto, a referência estabelecida pela Escola Eugênia Anna dos Santos com o Yorùbá ajuda a fortalecer o elo Bahia-África.  “É importante falar que a proposta da pedagogia da escola é o resgate da cultura afro-brasileira. O yorùbá é uma das diversas línguas faladas no continente africano, então, se nós trabalhamos com o resgate, porque não fazer referência a essa língua que é tão utilizada por este povo? São palavras mágicas que de certa forma ajudam a não deixar a língua perder. Se trabalhamos como a cultura afro-brasileira porque não trabalhar com os elementos dessa cultura como um todo?”, conclui a coordenadora.

 

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