Milena Ernesto, porta-voz da manifestação em Luanda no próximo dia 8 de outubro
Estas não são as primeiras vítimas. E também não é a primeira vez que se contesta e debate o corte obrigatório de cabelo nas escolas angolanas.
Em 2019, António Pedro Longue, por exemplo, foi retirado da turma no Instituto Médio Industrial de Luanda (IMIL), vulgo Makarenko por ter cabelo crespo.
“Não pode ser um ato obrigatório o corte de cabelo tem que ser por livre e espontânea vontade. Quero cortar o cabelo, corto”, sublinha.
O tema voltou a baila porque uma mãe denunciou a proibição da entrada do seu filho num dos colégios de Luanda pela mesma razão. Também uma estudante do ensino médio foi retirada da turma por não pentear o cabelo.
São muitas as denúncias que Movimento dos Estudantes Angolanos (MEA) recebe, revela Daniel Moço, secretário nacional para a cultura desta organização estudantil.
Legislação não proíbe o cabelo crespo
A legislação angolana não proíbe uso de cabelo crespo ou naturalnas instituições públicas e provadas, lembra Daniel Moço: “Achamos um ato de descriminação pela qual condenados esse tipo de atitude porque não há bases para se proibir um aluno de entrar na escola com cabelo natural, grande seja em que estado estiver.”
O repúdio será levado às ruas de Luanda no próximo dia 8 de outubro, numa iniciativa de ativistas e da comunidade Pan-africanista.
Milena Ernesto, porta-voz na manifestação, explica os motivos e revela que a situação vivida pelo menor: “Deixou-nos chocados a todos em que decidi tirar mais uma marcha porque não é só esse menino se calhar tem mais pessoas que passam por isso e não têm coragem de falar tal como a mãe do Hugo fez.”
Não é a primeira vez que se marcha em Angola contra o corte obrigatório nas escolas. Também não é a primeira vez que se denunciam atos do género. Mas as autoridades angolanas continuam em silêncio.
A DW África tentou ouvir os Ministérios da Educação, da Cultura e do Turismo, mas sem sucesso. Mas em comunicado, o Ministério da Educação condena “a descrição que tem havida nas escolas devido ao cabelo natural dos alunos.”
O fardo das políticas de segregação
Isidro Fortunato, do Movimento Ubuntu, entende que o comportamento destas instituições é um “fardo pesado das políticas coloniais e de segregação que vigoraram nas províncias ultramarinas” de Portugal entre 1482 a 1975, altura em que Angola se tornou independente.
“Tens aqui uma herança de um determinado contexto histórico que foi reaproveitada na sociedade angolana da atualidade porque não houve uma ruptura com o passado histórico.”
E por quanto tempo mais durará este problema de identidade da angolanidade?
“Na verdade isso vai durar muito tempo enquanto não se proceder com o processo da rotura com as leis, os códigos que regiam aquilo que são os Estados coloniais em África. É necessário que tenha vontade do governo em sobrepor-se a estas questões”, considera Fortunato.