Embora a indignação diante da brutal violência contra pessoas negras nunca tenha sido silenciosa, sobretudo graças ao movimento negro, é notório o aumento das demonstrações antirracistas no mundo.
Catalisada principalmente pelo assassinato de George Floyd nos EUA, essas manifestações posicionaram o racismo no centro do debate público. Constituiu-se uma espécie de consenso coletivo tácito —por vezes declarado— de que não é mais possível ignorar a centralidade do racismo na constituição e no funcionamento das sociedades, especialmente no Brasil.
Reconhecer-se como produtor ou reprodutor do racismo, distanciar-se da posição de neutralidade, atentar para os efeitos dos discursos e das ações sobre as desigualdades raciais é romper com um pacto que sustenta o privilégio da branquitude.
E esse não deve ser um movimento performático ou meramente declaratório. Ele se inscreve nas práticas cotidianas, usando o lugar de privilégio para transformar as relações, localizando as práticas racistas e invertendo as lógicas que as aprofundam. Isso se faz votando em pessoas negras, lutando por mais professores negros nas escolas, contratando pessoas negras nas instituições. Se faz conhecendo e reconhecendo o pensamento e trajetórias negras, estabelecendo novas camadas de subjetividade capazes de romper com o que Edson Cardoso, professor e editor do jornal Ìrohìn, chamou de “hierarquização da diversidade”.
Nossa sociedade racista é resultado de um projeto secular. Mais do que reconhecê-lo, é preciso desarmá-lo e construir outro capaz de superar as desigualdades raciais.