Por ano são assassinados mil jovens negros no Espírito Santo. Manifestantes fizeram o enterro simbólico da segurança pública capixaba
As 175 cruzes fincadas na tarde desta sexta-feira (19) nos jardins localizados na frente do Palácio Anchieta, sede do governo do Estado, foram além de modificar o belo cenário palaciano. A III Marcha Contra o Extermínio de Jovens Negros levou ao Centro aproximadamente 500 pessoas. As cruzes foram usadas simbolicamente para lembrar o assassinato de 8 mil jovens nos últimos oito anos no Espírito Santo. O movimento realizado pelo Fórum Estadual da Juventude Negra do Espírito Santo (Fejunes) teve como principal objetivo mobilizar à população para o problema provocado principalmente pela desigualdade social associada a discriminação racial.
A caminha foi marcada pela presença de diversos estudantes e membros de entidades que seguiram com faixas, cruzes e um caixão lacrado, que segundo o coordenador da Fejunes, Luiz Inácio da Silva Rocha, representava a morte da segurança pública, uma forma escolhida pelos organizadores do movimento para simbolizar às críticas em relação à violência no Espírito Santo. A manifestação causou transtorno para os motoristas que precisaram passar pelo Centro da capital.
“Com este enterro queremos acreditar que o próximo governo será de diálogo e um governo que vai entender as demandas deste povo sofrido, que é o povo negro, principalmente com a juventude negra. O que tivemos nestes oito anos de mandato Paulo Hartung foi repreensão e autoritarismo com os movimentos sociais. Com o movimento negro não foi diferente”.
De acordo com os estudos realizados pela Fejunes oito mil jovens negros morreram nos últimos oito anos. Rocha afirmou que o alto número de homicídios de jovens entre 12 e 21 anos é algo assustador. “É um número muito grande. É um número que nos deixa estarrecidos. Isto significa oito mil vidas desperdiçadas. Oito mil famílias atingidas por esta violência e oito mil jovens que poderiam estar construindo a nossa sociedade, as riquezas do nosso país e que infelizmente estão mortos, estão embaixo da terra”.
O professor Maximiliano Pereira Gama explica que o o assunto racial é abordado constantemente nas salas de aula. “De acordo com a legislação, hoje, é obrigatório os conhecimentos afrodescendente e por isso realizamos, na escola, trabalhos em todas as disciplinas voltados para a cultura afrodescendente”.
A estudante, Natália Souza Machado, de 14 anos, afirma que por diversas vezes já foi algo de preconceito dentro da escola. “Até este ano ainda sofria preconceito no meu colégio. Agora diminuiu um pouco, mas alguns ainda me chamam de pretinha ou carvão. Isto me machuca. Ninguém gosta de ser chamado deste jeito, claro. Mas muitas pessoas acabam entrando em depressão por conta disso”.
Neste sábado (20) é celebrado o Dia da Consciência Negra para a reflexão de todos os brasileiros por conta da história de luta e sofrimento vivida pelos negros. A data foi o dia em que o corpo de Zumbi dos Palmares foi exibido em praça pública em 1695 para semear medo aos escravos e impedir novas revoltas. Mas o efeito foi o oposto e despertou em muitos a consciência de que era preciso lutar contra a escravidão. Em 1888, a Princesa Isabel assinou a Lei Áurea que aboliu a escravatura no Brasil.
Estado enfatiza redução das desigualdades
O governo o Estado, por meio de nota, disse estranhar a manifestação por considerar que os últimos oito anos foram fundamentais para o resgate da cidadania de milhares de pessoas no Espírito Santo. De acordo com o estado, “a desigualdade foi reduzida em 5,5%, enquanto a média nacional foi de 4,9%”.
A nota diz ainda que o Espírito Santo é o quarto Estado com maior PIB per capita do país. “Houve uma redução de 48,9 % na taxa de pobreza, e de extrema pobreza de 60,9%. A capacidade de investimentos do governo do Estado subiu de menos de 1% para 16%, a maior do Brasil”.
O governo salienta que “a taxa de escolaridade entre os jovens chegou a 99%, e mais de 4 mil alunos foram beneficiados pelo Nossa Bolsa.
O Estado ressalta que a redução da mortalidade infantil caiu 14% e que houve redução de 23,5% no número de analfabetos de 2003 a 2010.
Até o final de 2010, promete o Estado, haverá cobertura na saúde estadual de 70%, presente em 76 municípios, e incremento de mais de 20% no número de leitos no SUS de 2003 a 2010 (1050 novos leitos)”.
III Marcha contra o extermínio da Juventude é realizada em Vitória
Manifestantes percorrem as ruas do Centro de Vitória
O Sindicato dos Bancários participou, na tarde desta sexta-feira, 19, da Marcha Contra o Extermínio da Juventude Negra, organizada pelo Fórum Estadual da Juventude Negra do Espírito Santo (Fejunes), no centro de Vitória. A manifestação contou com a presença de representantes dos movimentos estudantil, sindical, de juventude, das religiões de matrizes africanas e com os alunos secundaristas de cerca de 18 escolas da Grande Vitória.
O movimento reivindicou a implementação de leis que promovem a igualdade racial e políticas específicas para a juventude negra. “Essas leis já existem, mas não saem do papel”, declara Karina Moura, coordenadora do Fejunes. Ela conta que a Marcha é um momento chave para o movimento. “É na Marcha que colocamos a juventude nas ruas, pra ganharmos visibilidade e dizermos que basta de preconceito”.
A concentração aconteceu na Casa Porto. Os manifestantes percorreram toda a Aven ida Jerônimo Monteiro com faixas, cartazes, cruzes e bandeiras, em direção ao Museu Capixaba do Negro, onde o evento foi finalizado. Karina avalia a manifestação como positiva. “Nós alcançamos nosso objetivo. Colocamos cerca de 18 escolas na rua, além dos projetos e movimentos sociais. Isso dá visibilidade para luta”.
Durante a Marcha, os participantes colocaram um caixão e fincaram várias cruzes de madeira no jardim do Palácio Anchieta, simbolizando o enterro do atual governo estadual e protestando contra o assassinato de mais de 1000 jovens negros nos últimos dois anos. “Queremos questionar a ausência de políticas públicas voltadas para os negros no Estado”, declara Luís Inácio Silva Rocha (Lula), também coordenador do Fejunes.
Fabrício Coelho, diretor do Sindicato, complementa: “esse é um governo que já vai tarde, afinal, ele oprime e reprime o povo negro, não liga para as más condições dos presídios capixabas e é aliado e financiado pelos empresários que massacram as comunidades quilombolas no norte do Estado.”
Fonte: Lista Racial