Este artigo parte de reflexões sobre a fabricação de uma história única, que elege e valoriza determinada cosmovisão em detrimento das outras que compõem a formação histórico-cultural de um povo ou nação, legitimando e transmitindo apenas uma herança cultural. No Brasil, esse discurso tem apresentado o povo negro como escravo, submisso, inferior… Na escola, uma das importantes vias de transmissão de tal narrativa são as histórias nos livros de literatura, que sugerem padrões do que é verdadeiro, bom e bonito, a partir da supremacia branca e heteronormativa. Este artigo analisa e problematiza, de modo interdisciplinar, dois textos da literatura infantil contemporânea que provocam a desnaturalização das narrativas e das relações colonizadoras e dualistas: entre o bem e o mal, o certo e o errado, o belo e o grotesco, o incluído e o excluído. Eles mobilizam discursos de africanidades e negritudes para o empoderamento da criança negra. Conforme observado em pesquisa de campo em escola municipal de educação infantil da cidade de São Paulo, sua leitura por educadoras para crianças pequenas possibilita releituras e reescritas de corpos negros, a partir da interseccionalidade de gênero e de etnicidade, permitindo às (aos) leitoras uma ampliação de visões de si e de mundo.