Nós por nós, na luta e no luto

“JULGUEM A MIM”, postou no Facebook um grande ativista das favelas do Rio de Janeiro após uma chacina em Acari que matou 5 jovens, nesta segunda-feira (4), resultado da operação conjunta de extermínio de jovens da favela realizada pelas polícias federal e a CORE.

Por Raull Santiago Do Anistia

“JULGUEM A MIM”, escreveu com dor aquele que durante tantos anos luta contra o que torna a se repetir não apenas em Acari, mas em Manguinhos, no Complexo do Alemão e nas favelas, não vê o fim da matança de seu povo.

Esta é a última postagem que vi ainda há pouco na rede social enquanto me preparava para escrever esse texto aqui no bairro Georgetown, em Washington, nos Estados Unidos.

Vários dias se passaram desde aquele 25 de fevereiro no Brasil, uma quinta feira, quando no lançamento do relatório anual da Anistia Internacional (O estado dos Diretos Humanos no mundo), Renata Neder – que é assessora de Direitos Humanos da instituição, me chamou de canto para um papo e me convidou para participar de uma missão pelos EUA, um speaker tour intitulado de Jovem Negro Vivo Pelo Mundo. No dia 31 de março, data com simbolismos diversos, tendo como os mais marcantes o dia da chacina da Baixada Fluminense – RJ, quando 29 pessoas foram assassinadas por policiais militares em 2005 e também por ser a véspera do golpe militar de 1964. Com o Brasil passando por um momento político muito conturbado, embarcamos para os Estados Unidos, resignificando esse dia como o início de uma viagem de LUTA e RESISTÊNCIA pela vida de jovens das favelas e valorização dos Direitos Humanos.

Além da Renata, uma fera na luta por direitos humanos, estão nesse bonde o Bruno Duarte – assistente de novas mídias da Anistia, um cara incrível, Débora Silva – fundadora do movimento Mães de Maio, uma leoa de São Paulo, pura inspiração que tem me feito aprender muito sobre a vida, e eu, Raull Santiago, morador do Complexo do Alemão e integrante do Coletivo Papo Reto de mídia independente e Direitos Humanos.

Chegamos em Miami no dia primeiro de Abril, onde ficamos até o dia 3, quando viemos para Washington, de onde escrevo o texto.

Nossa missão aqui é participar de debates públicos e reuniões com autoridades e movimentos para denunciar os altos índices de homicídios de jovens negros pela polícia no Brasil. Ainda passaremos por mais outras 3 cidades, fechando um total de 5.

Em Miami participamos do encontro anual da seção da Anistia Internacional nos EUA, três dias de evento, com debates e atividades, envolvendo cerca de mil pessoas, em sua maioria membros e ativistas. Logo no primeiro dia acompanhamos um super debate sobre “Direitos humanos e justiça racial” onde já começamos a fazer rede com outros irmãos e irmãs ativistas de diferentes partes do mundo. A data também foi de grande reflexão, pois se completava um ano que Elizabeth Alves, moradora do Complexo do Alemão, havia morrido atingida por “bala perdida”, dentro de casa.

No segundo dia, Débora e eu participamos de uma mesa com o tema “Direitos humanos e violência armada nas Américas” onde somamos fala com mais dois companheiros, o Carlos Lusverti, da Anistia Internacional Venezuela e do advogado Khiree Smith, dos Estados Unidos, com mediação de Francisco Ciampolini, coordenador voluntário de campanhas sobre o Brasil na seção da Anistia nos EUA.

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Esta também foi uma data pesada, pois neste dia se completou um ano em que o menino Eduardo de Jesus, 10 anos, foi assassinado por um Policial Militar no Complexo do Alemão.

Ainda no segundo dia, acompanhamos uma mesa incrível sobre “Hip Hop e Ativismo” que teve como debatedores o rapper Sylvan Lacue, a professora e ativista Msia Clarck e o jornalista angolano Rafael Marques.

Foi uma experiência única estar em Miami nesse grande e importante evento da Anistia Internacional.

Agora estamos em meio as articulações em Washington. O desafio é enorme, mas a Renata e o Bruno têm sido incríveis comigo e com a Débora, já que por não sabermos falar o idioma local, eles estão conosco o tempo todo dando suportes diversos. Seguimos juntos, cuidando uns dos outros e concentrando esforços em chamar atenção para essa situação absurda no Brasil.

E não devemos julgar você, Deley, a culpa não é sua. Os culpados usam fardas e trabalham para o Estado, este que para nós não tem nada de “democrático de direitos”.

Nós por Nós.

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