Para o grito não ser mais excluído

Por Luka Franca para as Blogueiras Negras

Essa semana é emblemática. Após 3 sessões plenárias para tentar aprovar uma homenagem à Rota (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar) a bancada da bala da Câmara de Vereadores de São Paulo finalmente atingiu sua meta. A Rota, o batalhão com o mais alto grau de letalidade da PM paulista, irá receber a Salva de Prata da Câmara de Vereadores de São Paulo pelos serviços prestados à capital paulista, ou melhor, os boinas negras ganharão medalha por executar preto pobre nas periferias do nosso estado.

A aprovação da homenagem à Rota chega na semana do 7 de setembro, na semana em que haverá o “Grito dos Excluídos” cujo o tema é: juventude que ousa lutar constrói o poder popular. No cartaz vemos jovens negros, numa alusão ao combate ao genocídio da juventude negra e a violência policial que existe no nosso país.

Os mais recentes índices de violência demonstram o perfil racial dos assassinatos no país. O número de mortes de jovens negros, entre 15 e 24 anos, é 139% maior do que de brancos. Segundo o Mapa da Violência 2012, entre 2001 e 2010 o número de vítimas brancas, de 15 a 24 anos, caiu 27,5% (de 18.852 para 13.668), enquanto que de vítimas negras aumentou 23,4% (de 26.952 para 33.264). (ROCHA, Raiza. Ato denuncia o extermínio da população negra em São Paulo)

Não há como não ligar o processo de extermínio que vemos hoje no país com que acontecia na época da Ditadura Civil Militar. Se no passado as irmãs, mulheres, sobrinhas e filhas iam aos aparelhos da repressão procurar os entes sumidos, hoje a peregrinação se faz pelas DPs e IMLs. O terror de se ter um ente desaparecido não terminou, na verdade persiste por todos estes 20 anos de redemocratização, e aí perguntamos: redemocratização para quem se os nossos ainda morrem? Se ainda sofremos com o fato de não ter um corpo para enterrar e passar pelo processo do luto, da despedida?

A Câmara devia dar uma salva de prata às mães que perderam seus filhos nos embates com a PM. Principalmente da Rota. Até porque a Rota é um efetivo da PM que tem mais ou menos 14% das mortes em confrontos com pessoas da sociedade. E 60% delas nunca tiveram passagem na polícia. Aqui no Brasil tem algumas coisas que são legitimadas. Algumas instituições podem fazer justiça com as próprias mãos. Então, se for bandido, tá no direito de matar. É gravíssimo isso. (“Câmara devia dar salva de prata às mães que perderam os filhos nos embates com a PM”. NETO, José Francisco)

A violência policial e a política de gentrificação atinge a nós, mulheres negras, brutalmente. Mas o som das nossas vozes denunciando o sumiço dos nossos filhos, maridos e amigos parece não ecoar no meio da fantasia criada de segurança que não pode ser destruída pela dura realidade de que hoje no Brasil somos reféns de uma segurança pública militarizada, que quando está apenas nas periferias acha que é algo eficaz. Sabe como é: bandido bom é bandido morto. Porém quando a truculência policial invade locais que não estavam acostumados com a brutalidade militar a indignação aumenta. Os gritos de denúncia são ouvidos, as entidades da sociedade civil se mobilizam.

O emprego da força e a letalidade policial em São Paulo são assustadores. No estado de São Paulo, de janeiro a maio, 1 de cada 5 homicídios foi cometido pela PM. Nos Estados Unidos esse índice é de 1 para cada 35 homicídios. De 2006 a 2010, 2.262 pessoas foram mortas pela PM paulista. No mesmo período, em todo o território estadunidense, a polícia matou 1.963 pessoas. São Paulo tem 41 milhões de habitantes, o que lhe confere uma taxa de 5,5 mortes para cada 100 mil habitantes. EUA tem 313 milhões de habitantes e a taxa cai para 0,63. (A segurança pública tucana)

O grito, a fala que antes era calada em meio ao monte de dúvidas, começa a ser ouvido. São os autos de resistência que aos poucos caem, revelando os assassinatos cometidos pela PM. É o medo aos poucos se dissipando, e as pessoas criando coragem para falar e dizer que paz sem voz, não é paz é medo e de medo nós e nossos entes amados já estamos fartos.

Após essa semana, após vermos aqueles que deveriam prezar pela nossa vida, por um pacto social que preserve a nossa vida e não nos deixe mais marginalizados e não nos mate se aponta a necessidade de dar um basta, de se organizar, de pedir de forma contundente a desmilitarização de todas as polícias, da política, da vida em todas as suas nuances.

LUKA FRANCA: Paraense radicada em São Paulo, jornalista, mãe, feminista, socialista e do PSOL, ou, 1- a versão feminista de Rob Fleming e/ou do Menino Maluquinho; 2- roquenrou-meio-nonsense; 3- menina-mulher-mãe da pele preta; 4- olhos de comer fotografia; 5- passional e chorona

 

 

Fonte: Blogueiras Feministas 

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