Racismo, feminismo, linguagem, diálogo

Uma confusão enorme e nada ingênua nem desinteressada têm permeado os debates sobre racismos e as reações que esta opressão têm provocado. Confusão que têm confundido (sim, é preciso repetir a palavra!) conceitos, fatos, significados, sentidos, cronologias, sujeitos/as, grupos, causalidades, consequências, historicidades. Confusão que, de fato, não têm nos ajudado.

Por Cacá Ayra Safi, do Casa da Mãe Joanna

Ao contrário, trata-se de uma confusão que têm nos impedido repetidamente de encontrar qualquer compreensão e entendimento mútuo e compartilhado, porque desconsidera, desde seu princípio, historicidades/ cronologias/ contextos/ sentidos/ significados/ conceitos fundamentais para que possamos caminhar a partir de uma base comum que, realmente, considere-visibilize-escute-reconheça-e-inclua todas as pessoas que fazem parte deste debate e, em especial, as que sofrem, na pele, e há séculos, violências e opressões que ainda negamos em reconhecer e que nós desconhecemos.

Diálogo é prática que pressupõe a escuta e a consideração equânime de todos os lados e pessoas envolvidas, e, alguma troca, mesmo que mínima. Enquanto a branquitude (neste caso, o lado privilegiado e opressor desse processo histórico e sistêmico) insistir em falar sozinha, sem ter o mínimo de humildade e real disponibilidade para ouvir – de verdade! – as pessoas negras, não é diálogo.

Enquanto a branquitude insistir em não ouvir as pessoas negras sem apelar doentia e imediatamente para seu velho padrão comportamental de refutar/silenciar/defender-se atacando/negar o quê e quem a questiona – e ainda, sorrateiramente, fazendo parecer que toda esta reação ultra-defensiva se trata na verdade apenas de uma “resposta” discursiva – sejamos honestos/as em admitir que não: não temos dialogado coisa nenhuma (apesar de querermos nos enganar acreditando nessa fantasia sobre nós mesmas/os).

Muito menos ainda temos permitido alguma troca, por menor que seja, entre brancos e negros – ao contrário, temos (nós, branquitude) permanecido rígidos/as, inflexíveis e bastante agressivos/as (nós, sim! sempre e muito, aliás, embora a gente não goste de admitir isso) protegendo e defendendo as ideias e as identidades (e os privilégios e os territórios) que nos definem e que nos constituem enquanto grupo opressor (e dos quais nos beneficiamos, quer queiramos ou não isso, quer saibamos ou não disso). Não temos dialogado, não. Temos sim é insistido em um monólogo perverso e manipulador. É isso o que temos feito.

Discernimento é preciso. Ter cuidado com as palavras que usamos e os sentidos que damos também. Dialogar honesta e verdadeiramente, com humildade e real disponibilidade, também.

Quem somos nós afinal para cobrar o quê de quem?

E a pergunta que não quer calar: o que é, realmente, linchamento? Quando, como e onde esta prática surgiu, o que ela empreende e significa, e, quem ela de fato têm mortalmente vitimado desde seu surgimento, com esse nome, linchamento?

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