Há quem diga que brasileiro não desiste nunca. E, para enfrentar as mazelas do dia a dia, a gente “vai na fé”, expressão que dá nome à nova novela das sete da Globo, que conquistou o público logo nos primeiros capítulos. Um dos motivos é Sol, papel de Sheron Menezzes que, certamente, tem uma história parecida com a de muitas mulheres do país. Casada, mãe de duas filhas, cristã, se esforçando para sustentar a casa… E, aos 40, ela vê bater à sua porta um antigo desejo, o de cantar e dançar. Um ano mais nova que a personagem e com 25 de carreira, Sheron também estava à espera da realização de um sonho: o de viver sua primeira protagonista. A oportunidade, enfim, chegou, e tem rendido elogios à atriz, gaúcha de Porto Alegre.
— Sol é a minha cereja do bolo. Um bolo que, há alguns anos, venho cozinhando, moldando, fazendo a cobertura, deixando bem bonito. Ela veio para me mostrar que ele estava pronto. Penso muito nisso. Sempre tive papéis muito bons. Mas o título de protagonista demorou para chegar. Eu só estava aqui esperando o momento certo. Mas chegou! — celebra ela.
A atriz vê pontos positivos na conquista para além de um desejo pessoal. “Vai na fé”, trama de Rosane Svartman, é a segunda novela das sete consecutiva na Globo a ter uma protagonista negra. Ao comentar o fato, Sheron é enfática:
— Eu ouvi um amém (risos)? O mundo mudou, as pessoas estão mudando junto com ele. E precisam. Quem não muda está ultrapassado. Isso já era pra ter sido feito, mas estão correndo atrás agora e acho muito importante. Eu não cresci me identificando (com protagonistas de novela). É muito importante, sim, que pretos estejam em papéis de extremo destaque, para que todas as meninas e meninos pretos que estão crescendo se vejam ali. É para a construção da autoestima de nossas crianças.
Assim como a mocinha e 90% da população do nosso país, segundo o último censo do IBGE, Sheron é uma mulher de fé. Sol frequenta a igreja evangélica e faz parte do coral da congregação. Já a atriz conta que já experimentou de tudo um pouco.
— Eu não poderia estar mais feliz por ter a chance de fazer essa personagem extremamente carismática e solar. Encaixou. Eu precisava da Sol, e a Sol precisava de mim. Talvez seja o tempo de Deus mesmo. A fé é o que move a minha vida. O Brasil é um país em que se você não tiver fé, você não consegue nem levantar da cama. Mas eu acredito nas pessoas, nas coisas boas da vida — afirma a atriz, que completa: — Cresci em escola católica, então a Bíblia sempre fez parte da minha vida. Já frequentei missa, já fui a culto, a centro (espírita), passei por algumas religiões e gosto de tudo. Realmente, eu me identifico com o que faz bem. Se alguém falar para mim: “Tome um banho para se sentir melhor”, eu tomo. “Acende uma vela e reza”, eu acendo e rezo. Eu faço tudo o que for. E também estou amando a música gospel na novela. Eu me reencontrei, me reconectei com os louvores. Acho lindo. Eu presto atenção nas letras, em tudo o que é dito, me pega num lugar… Sempre fico muito emocionada. Canto e quase choro.
Sol e Sheron têm idades parecidas, mas vidas bem diferentes. Enquanto a atriz é realizada com o trabalho há anos, a personagem vai começar a ter esse gostinho só aos 40. Para a artista, um dos deleites ao interpretar a mocinha é justamente falar com as mulheres que podem estar passando pelo mesmo momento.
— Eu e Sol nos encontramos em alguns lugares, como nesse otimismo de levantar, tocar a vida, o dia, sempre tentando ver o copo meio cheio. Ela faz tudo pelos filhos e volta para casa exausta. Coloca tudo o que está sentindo guardadinho para que a casa fique em harmonia. Eu me identifico com isso e acredito que muitas pessoas também vão se identificar. É muito legal falar dessas mães, dessas mulheres que colocam seus sonhos numa caixa para colocar uma família de pé — destaca a atriz, que completa: — Nunca é tarde pra gente ir atrás dos nossos sonhos. É muito importante que as mulheres possam parar e pensar que é hora de cuidar delas e de tudo aquilo que deixaram pra trás.
A atriz vai completar a idade de Sol em novembro deste ano, mas diz que ainda não se vê atingida pelo etarismo que afeta muitas mulheres. Ela também conta que não faz procedimentos estéticos, embora não seja contra. Para se cuidar, recorre aos exercícios físicos. Mas, com a correria da novela, arrumar tempo para malhar está difícil…
— Eu sempre falei que gosto muito de malhar, estar com o corpo em movimento. É uma coisa que me faz bem, nunca foi muito por estética, não. Mas, neste momento da minha vida, é uma coisa que não estou conseguindo fazer. Embora eu corra o dia inteiro de um estúdio para o outro… Esse que está sendo meu exercício (risos). Mas quando dá, fujo pra academia, é claro. Eu me cuido para estar bem, principalmente mentalmente. Sempre procuro dar uma meditada — pontua.
Na trama, Sol faz o maior sucesso depois de aparecer cantando e dançando ao lado de Lui Lorenzo (José Loreto). E quem a vê toda desenvolta no papel nem imagina que Sheron é tímida. Apesar de já ter participado, por exemplo, do quadro “Dança dos famosos”, do “Domingão”, ela diz que exibir o lado dançarina ainda é um desafio.
— Por trás de tudo isso, há uma timidez. As pessoas não acham que sou tímida, mas eu sou. Tenho vergonha de cantar, dançar, ainda mais solta como Sol dança. No “Dança dos famosos”, eu ensaiava a coreografia, o que dá uma segurança. Não necessariamente eu sabia dançar o ritmo — explica ela, que há muito tempo não dançava: — Fiz zouk por muitos anos e amo dança de salão. Já dançar separado é um problema. Você não vai achar por aí um TikTok meu (risos).
O lado cantora da atriz pouca gente conhecia. Ela, que chegou a viver uma artista de axé na série “Maldivas”, da Netflix, estava mais acostumada a soltar a voz apenas em casa. Mas trabalhar esse talento era algo que Sheron já almejava.
— Se eu pudesse nascer de novo com um dom, seria o de cantar. Eu adoraria não ter vergonha e soltar a voz lindamente igual àquelas negras de igreja americana, sabe? — revela a atriz, que contou com a ajuda de uma preparadora vocal, uma professora de dança e uma fonoaudióloga para o papel em “Vai na fé”: — Sol canta louvor, no show, vendendo quentinha… É minha voz mesmo, não é algo feito em estúdio. Quando vou gravar, sempre fico muito nervosa. Mas quando começo… É igual quando alguém vai ao caraoquê e diz que não vai cantar nada. Aí depois fica: “Só mais uma, vamos mais aquela?” (risos). Eu morro de vergonha, mas amo.
Dançar e cantar sem pudor só mesmo com o filho, Benjamin, de 5 anos, fruto do casamento com o lutador Saulo Bernard. Primeira artista da família, Sheron elogia a mãe, Veralinda Menezes, pela criação em que sempre teve a autoestima exaltada. Coisa que ela pretende passar ao pequeno Benji:
— Minha mãe sempre cuidou para que eu tivesse uma autoestima muito bem cuidada. Ela sempre fez questão de mostrar o quão bonita eu era por dentro e por fora. Eu faço isso com meu filho. Toda hora eu o elogio. Eu estou sempre o incentivando e quero que ele descubra como ele gosta de ser. Porque aí não tem pra ninguém! Ninguém segura uma pessoa que tem consciência de quem ela é.
Juntos há 11 anos, Sheron e Saulo se casaram oficialmente no ano passado. Para conseguir se dedicar à sua primeira protagonista, a atriz destaca a parceria com o marido e o enche de elogios:
— Fui fazer (a novela das sete) consciente do quanto de tempo isso me tomaria. Eu acho que o mais importante é dizer que só posso ser a Sol dessa maneira porque eu tenho uma base muito forte dentro de casa. Eu tenho um marido incrível. Ele está lá segurando a barra, cuidando, fazendo o papel de pai, enquanto eu estou aqui dedicando meu tempo para a personagem. Quando chego em casa, eles estão lá me esperando para colocar em dia o que eles fizeram. E aí a gente curte nosso momento juntos. Eu só consigo fazer meu trabalho com tranquilidade porque tenho ele (Saulo) ao meu lado.