Testados por brancos, cosméticos podem acabar manchando a pele negra

FONTEDa Revista Afro
Imagem: Getty Images

Você sabia que boa parte dos cosméticos disponíveis atualmente no mercado são testados por pessoas de pele branca? Uma pesquisa da Istatum, consultoria de beleza internacional, mostrou que mais de 50% de hidratantes e cremes para a pele feminina não são testados em peles negras e chegam às prateleiras das farmácias sem qualquer restrição para o consumo.

O assunto pode parecer banal, mas um produto que não compete com a sua pele pode trazer diversos problemas, como alergias e manchas.  Juliana Mendonça, de 23 anos, é adepta dos cremes naturais desde que contraiu manchas e descamação na pele após usar um hidratante noturno. Em outra ocasião, um filtro solar deixou a pele de seu rosto com dois tons diferentes. Desde então, ela evita aplicar produtos na pele, com medo de que causem novas marcas, e usa os tratamentos naturais que aprendeu.

Em sua opinião, faltam produtos específicos para os negros. “O mercado já tem produtos para a pele negra, mas, se pensarmos que somos maioria na população brasileira, chegamos à conclusão de que não tem quase nada”, diz.

Ela também reclama dos produtos para cabelos étnicos, sempre relacionados a alisamento e diminuição de volume. “Há pessoas que fazem questão de usar os cabelos como são. O ‘black’ também é bonito. Como eu trato esse cabelo? Como faço para dar brilho, deixá-lomais maleável? Um produto para isso é difícil encontrar.”

No Brasil, mais de 50% da população se declara negra ou parda, de acordo com o Censo de 2010. Mesmo assim, ainda há poucas linhas de cosméticos voltadas especialmente para esse tom de pele. Os produtos, como os procedimentos dermatológicos, são geralmente testados para os padrões da pele branca, mais abundante no Hemisfério Norte, onde é desenvolvida boa parte da tecnologia.

Até os especialistas têm dúvidas sobre os procedimentos autorizados para tratar a cútis escura sem riscos. “É muito mais fácil trabalhar com uma pele clara. O desafio é trazer para a realidade brasileira aparelhos que possam ser usados em pacientes reais. Temos uma população muito mais morena, e médicos de diversas regiões do país muitas vezes não sabem como tratar essa pele”, afirmou a dermatologista Eliandre Palermo, da Sociedade Brasileira de Cirurgia Dermatológica, em entrevista para a Folha de São Paulo.

Ainda assim, é possível utilizar alguns produtos e se submeter a tratamentos disponíveis no mercado com segurança, desde que o paciente conheça como sua pele reage.

Mais cor

Nem todos os tratamentos podem ser aplicados em peles claras e escuras da mesma forma. A principal diferença está na produção de melanina, muito maior nos negros. Esse fator protege a pele contra os raios ultravioleta, mas também pode causar hiperpigmentação. Em qualquer manipulação mais agressiva, a tendência da pele é produzir mais pigmento, como se precisasse de mais proteção.

A jornalista Claudia Cunha, de 32 anos, já ficou com manchas após se submeter a uma limpeza de pele, ainda que ela tivesse alertado a esteticista de que é muito mais suscetível a marcas. Ela reclamou, e a profissional ofereceu um tratamento clareador. Desconfiada, não aceitou. “O negro normalmente mancha muito. Na minha pele, qualquer cravinho que eu aperto causa uma marca. E não é fácil encontrar pessoas que entendam”, conta.

Tratamentos muito invasivos, como peelings profundos e cremes antissinais com ácidos, podem provocar uma reação na pele e levar a manchas. Clareadores são outro tipo de produto que eleva os riscos quando aplicado sem orientação.

Limpezas de pele agressivas também aumentam as chances de ocorrerem marcas permanentes. “A pele do negro não pode ser agredida. O processo inflamatório nesse tipo de pele é sinônimo de hiperpigmentação”, resume a dermatologista Andréia Mateus Moreira, do Departamento de Cosmiatria da Sociedade Brasileira de Dermatologia, em entrevista à Folha de São Paulo.

Se forem necessárias descamações mais profundas, o médico pode preparar a pele com produtos que melhorem a cicatrização e reduzam o poder de pigmentação. Mas os riscos continuam mais altos do que os encontrados na pele branca.

Áreas de maior atrito, como virilha e axilas, têm mais pigmentação. Gordura localizada, roupas que causem fricção e desodorantes alcoólicos elevam a incidência do problema.

A depilação com cera também estimula a pigmentação da pele -ao se aderir à região e ser arrancada, a cera causa uma agressão e posterior escurecimento. Por isso, dermatologistas têm recomendado depilação a laser para esses pacientes -a lâmina e o creme depilatório podem irritar a pele.

Até pouco tempo atrás, os métodos a laser não eram seguros para a cútis escura -a luz vê o pigmento como um alvo e não era possível diferenciar o pelo da pele. No entanto, foram desenvolvidos aparelhos e padrões diferenciados, que hoje trazem menos riscos. Simone, por exemplo, submeteu-se à técnica recentemente e conta que obteve bons resultados.

Um novo tratamento contra manchas para uso doméstico é o ácido tioglicólico, que deve ser receitado pelo médico e pode ser aplicado diretamente nas lesões, seguido constantemente de filtro solar.

A microdermoabrasão (esfoliação superficial), realizada na clínica, também tem apresentado bons resultados, de acordo com os especialistas.

Tratamentos

Em alguns casos, as chances de problemas são maiores do que os benefícios e, por isso, o paciente deve passar por uma boa avaliação antes de se submeter à técnica.

Não indicados
– Peelings profundos
– Tratamentos com laser ablativo (remove a superfície da pele)
– “Resurfacing” (peeling a laser)
– Cremes com ácidos (alfahidroxiácidos, por exemplo)
– Cremes com muita vitamina C

Exigem atenção
– Cirurgia plástica
– Colocação de piercing
– Retirada de pintas e verrugas
– Depilação com cera

Liberados
– Preenchedores, como ácido hialurônico
– Toxina botulínica
– Microdermoabrasão (tipo de esfoliação)
– Peelings superficiais
– Depilação a laser (com equipamento e padrão adequados)

Com Folha de São Paulo

 

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