Zulu Araújo – Afro-latinos

Foto: Margarida Neide/ A Tarde

Zulu Araújo

De Cáli, Colômbia

Foto: Margarida Neide/ A Tarde

Há uma semana estou na Colômbia, mais precisamente na cidade de Cáli, localizada no Pacífico Sul colombiano, uma região muito parecida com o Nordeste brasileiro, notadamente com a Bahia. Cáli é uma cidade fortemente influenciada pela cultura de origem negra. Com uma população aproximada de três milhões de pessoas, da qual 65% são afros descendentes, Cáli convive com problemas muito semelhantes a Salvador: pobreza, violência e uma intensa atividade cultural. Minha presença por estas bandas deve-se ao convite que recebi da Secretaria de Cultura da cidade e da Fundação Ácua, uma instituição vinculada ao sistema ONU (Fundo Interamericano de Desenvolvimento Agrícola – FIDA) e que realiza um importante trabalho de fortalecimento de instituições afro-colombianas, em especial àquelas que trabalham com as comunidades rurais, a exemplo dos quilombos no Brasil, promovendo o desenvolvimento sustentável, estimulando a cultura e combatendo o racismo.

A razão do convite é o Festival Petrônio Alvarez, no qual divido a condição de jurado com músicos, intelectuais e estudiosos da música afro-colombiana de várias partes do país e da América Latina. O Festival, um dos mais importantes eventos do calendário cultural da região e do país, envolve intensamente a todos durante uma semana. É como se fosse o nosso período carnavalesco, onde a população local e em particular a juventude reúnem-se para celebrar o bem maior da humanidade que é a cultura. Este ano o tema do Festival é a Marimba – instrumento de origem africana, que acaba de ser registrado como Patrimônio Cultural da Humanidade, na última reunião realizada pela Unesco no Quênia. É impressionante a força deste instrumento na cultura latina. Tão forte que tanto a Igreja Católica quanto as Evangélicas vem fazendo um intenso processo de evangelização na região para combater a sua importância, com o discurso de sempre – é um instrumento demoníaco.

A marimba está para a Colômbia como a capoeira está para o Brasil. Ela personifica a presença da cultura afrodescendente de maneira contundente. Representa a um só tempo a resistência, a afirmação cultural e a busca permanente pela igualdade que tanto nos irmana. Nesta viagem a Colômbia consolida-se a minha compreensão de que a cultura afro-latina é mais que uma realidade, pode e deve ser uma importante ferramenta para a consolidação da integração latino-americana e caribenha. Passos importantes foram dados neste sentido nos últimos anos, ressalte-se o esforço feito pelo ministério da Cultura, por meio da Fundação Cultural Palmares, nas gestões dos ministros Gilberto Gil e Juca Ferreira. Esse esforço, que ficou registrado na realização de dois Encontros internacionais, intitulados “Encontros Iberos Americanos para uma Cultura Afrodescendente nas Américas”, deixou frutos importantes que precisam ser devidamente cuidados e consolidados, a exemplo do Observatório Afro Latino e Caribenho.

O Festival Petrônio Alvarez é sem dúvida alguma um desses momentos mágicos onde todas as energias confluem para a celebração maior da cultura que é a música. É gente de todos os lados do país apresentando-se com seus ritmos regionais como o Violão Caucano, a Marimba, a Chirimia e temas livres, onde cabem todas as fusões e experimentos musicais. Além disto, há uma profusão de cheiros, cores e sabores provocados por uma gigantesca feira de gastronomia e artesanato que circunda todo o estádio Pascal Guerreiro, local onde o festival acontece. Por falar nisto, este estádio foi recém-construído para a realização da Copa do Mundo Sub-20, no qual o Brasil foi campeão, demonstrando claramente que equipamentos como estes podem e devem ser aproveitados para a promoção do bem estar social, para além do futebol.

Enfim, inspirado no caldeirão cultural afro-colombiano, convido nossas lideranças culturais, artistas e autoridades afrobrasileiras a consolidarem a ponte cultural afro-latina para que nela possamos passear com a nossa criatividade a serviço da igualdade.

Axé!

Toca a zabumba que a terra é nossa!

 

 

Fonte: Terra 

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