Na última quarta-feira (24/04), a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos D. Paulo Evaristo Arns – Comissão Arns, em parceria com o Movimento Nacional População de Rua, o Movimento Nacional de Luta em Defesa da População em Situação de Rua e o Movimento Estadual da População em Situação de Rua em São Paulo, apresentou à ONU (Organização das Nações Unidas) um relatório para denunciar as violações aos direitos das mulheres em situação de rua no Brasil.
O documento foi entregue ao Comitê CEDAW – Convention on the Elimination of All Forms of Discrimination Against Women (em tradução literal, Convenção pela Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres), que monitora o cumprimento das obrigações adquiridas pelos países que ratificaram a Convenção CEDAW para combater a discriminação de gênero. Embora o Brasil tenha aderido ao tratado em 2002, o relatório aponta a violação de diversos artigos da CEDAW nas cidades brasileiras, com o aumento do número de mulheres em situação de rua, vulneráveis à discriminação e à violência, após a pandemia de Covid-19.
Segundo a socióloga Maria Victoria Benevides, presidente da Comissão Arns, a apresentação do relatório abre um importante canal de diálogo para discutir o fenômeno a partir de outras perspectivas. “A causa dos movimentos de população de rua no Brasil chega à ONU em um momento crucial, especialmente no caso das mulheres, que são as mais prejudicadas e violentadas nessa hostil realidade de não ter uma casa”, afirma.
Para ela, a falta de dados coordenados e específicos, de fontes oficiais, dificulta o diagnóstico da real extensão desse problema, que, partindo da violação ao direito à moradia, “coloca em xeque todos os direitos da pessoa humana, como acesso à saúde, à justiça e à dignidade”. No caso das mulheres, o relatório oferece um vislumbre da realidade feminina nas ruas: apesar de representarem entre 13% e 15% do total da população de rua no Brasil, elas são as vítimas de 40% dos casos graves de violência perpetrados contra esse contingente – que, como alerta o documento, corre o risco de apresentar um grau “nada desprezível” de subnotificação.
Nesse sentido, a fim de retomar as obrigações estabelecidas na CEDAW e restabelecer a dignidade e o exercício pleno da cidadania para essas pessoas, as entidades enumeram uma série de recomendações no relatório, começando com um censo nacional efetivo da população em situação de rua, com dados desagregados em gênero e raça e metodologia testada e aplicada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Outras ações recomendadas incluem instrumentos, campanhas, políticas públicas e planos voltados para a restauração da saúde integral e do acesso à justiça, além da reparação de direitos violados em vista da negligência histórica do Estado. As propostas envolvem um trabalho conjunto com o Ministério da Saúde, o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, o Ministério da Mulher e a Comissão Nacional de Justiça.
Sobre a Comissão Arns
Criada em fevereiro de 2019, a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos Dom Paulo Evaristo Arns – Comissão Arns busca dar visibilidade e acolhimento institucional a graves violações da integridade física, da liberdade e da dignidade humana, especialmente as cometidas por agentes do Estado contra pessoas e populações discriminadas – como negros, indígenas, quilombolas, pessoas LGBTQIA+, mulheres, jovens, comunidades urbanas ou rurais em situação de extrema pobreza. A Comissão Arns trabalha em rede com outras organizações sociais para detectar casos, dar suporte a suas denúncias públicas, encaminhar questões aos órgãos do Judiciário e organismos internacionais, promover ações específicas junto a lideranças políticas e mobilizar a sociedade. Seu trabalho é apartidário e congrega figuras públicas de formações distintas, mas complementares, todas elas comprometidas com a defesa da dignidade da pessoa humana.
Em seu nome, a Comissão destaca a figura do Cardeal Dom Paulo Evaristo Arns (1921-2016), Arcebispo Emérito de São Paulo. Em 1972, Dom Paulo criou a Comissão Justiça e Paz de São Paulo, porta aberta no acolhimento das vítimas da repressão política e policial no país. Ao homenageá-lo, a Comissão reconhece esse exemplo de resistência, resiliência e, sobretudo, de esperança para os brasileiros em tempos difíceis.