Comissão de Direitos Humanos da Câmara vai ouvir nove ‘ex-homossexuais’

Autor da proposta, Marcos Feliciano (PSC-SP) diz que eles são alvo de discriminação e considerados fingidores

POR EVANDRO ÉBOLI / EDUARDO VANINI, do O Globo 

 

BRASÍLIA — Dominada por um grupo de parlamentares considerado mais conservador, a Comissão de Direitos Humanos aprovou na última quarta-feira — por 10 a 6 — audiência pública que irá ouvir nove pessoas que, segundo eles, eram homossexuais e que mudaram a orientação sexual com o tempo.

Ainda não há data para ocorrer. A proposta é de autoria do Pastor Marco Feliciano (PSC-SP), que, na justificativa de seu pedido argumenta que os chamados ex-gays são alvos de discriminação e apontados, por seus antigos “pares homossexuais”, os companheiros, como fingidores. Segundo o deputado, também as pessoas que sempre foram heterossexuais consideram que os “ex-gays” estão mentindo.

— Assim, os homossexuais e os heterossexuais consideram os ex-LGBTTs mentirosos, dissimulados e até mesmo doentes mentais — justifica Feliciano.

Dos nove convidados, cinco são homens e quatro mulheres. No grupo, há três pastores, um cantor evangélico, uma missionária, uma psicóloga e um estudante de psicologia. Para o deputado, os programas de TV tratam os ex-homossexuais como pessoas caricatas e que enganam a sociedade, sobretudo os cônjuges.

— Esses cônjuges são mostrados como quem estaria embarcando numa aventura, ao se casarem com pessoas que praticariam fraude sentimental, dizendo haver mudado a orientação sexual quando, na verdade, apenas enganam e tripudiam sobre a confiança de terceiros — diz Feliciano.

Parlamentares do PT, do PSB e do PSDB, cientes da derrota na votação, apelaram para que a proposta não fosse votada. O presidente da comissão, Paulo Pimenta (PT-RS), afirmou que um debate desse vai expor as pessoas e será um “atrativo para a mídia”.

ENTIDADES CRITICAM AUDIÊNCIA

O presidente da Articulação Brasileira de Gays, Léo Mendes, criticou a audiência. Para ele, dizer que essas pessoas são ex-homossexuais é uma inverdade.

— Eles, inclusive, nunca foram homossexuais. São bissexuais que, neste momento, podem estar vivendo sua heterossexualidade — reflete. — Além disso, não cultivamos qualquer preconceito contra essas pessoas, pois defendemos o respeito a todas as orientações. O que não admitimos é tratar a homossexualidade como doença e querer curá-la, como tem sido a intenção do deputado por trás dessa ação.

Já o secretário da International Lesbian, Gay, Bisexual, Trans and Intersex Association para América Latina e Caribe, Beto de Jesus, acredita que a proposta de Feliciano faz parte de uma estratégia que ele tem adotado para atrair atenção através da mídia.

— Ele tem criado factoides que reverberam pelas redes sociais e entram para os tópicos mais discutidos. E isso acaba fazendo propaganda dele — avalia. — A discussão proposta é muito rasa. É um descabimento. Tanto para a Organização Mundial de Saúde, quanto para Conselho Federal de Psicologia, a homossexualidade não pode ser tratada como doença e, portanto, não há o que ser curado.

 

+ sobre o tema

Quando Sueli Carneiro saiu

Surpreendente e dolorosa a saída da filósofa e ativista Sueli...

O que é o protesto com braços cruzados da americana Raven Saunders

A americana Raven Saunders protagonizou a primeira manifestação no...

para lembrar

Yelena Isinbayeva retira declarações anti-homossexual

Foi tudo “um mal entendido” devido ao fraco inglês....

Maioria Oprimida – Por: Louise Walmsley

Querida sociedade, O mundo me lembra todos os dias que...

“Sorria, Princesa”: palavras que nenhuma mulher que ouvir – Por: Soraya Chemaly.

Pedir às mulheres que sorriam pode parecer bobagem —...

Morre Maryse Condé, grande voz negra da literatura francófona, aos 90 anos

Grande voz da literatura francófona, a escritora de Guadalupe Maryse...
spot_imgspot_img

Vozes da resistência negra celebram a vida de Leci Brandão

Leci Brandão é uma artista e parlamentar cuja trajetória é marcada pela luta contra o racismo, um combate que atravessa sua música, sua vida...

Pena para feminicídio vai aumentar para até 40 anos

O Congresso aprovou um projeto de lei que aumenta para 40 anos a pena máxima para o crime de feminicídio, que estará definido em um...

Saúde lança programa para reduzir mortalidade materna de mulheres pretas em 50% até 2027

O Ministério da Saúde lançou nesta quinta-feira (12) uma nova versão do projeto Rede Cegonha, criado em 2011 e descontinuado em 2022, voltado para o cuidado...
-+=