Educação domiciliar e seus impactos para a convivência democrática

Programa Educação Geledés

FONTEGeledés Instituto da Mulher Negra, por Jaqueline Lima Santos e Suelaine Carneiro
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A educação domiciliar, também conhecida internacionalmente como homeschooling, tem sido objeto de debate em diversos contextos nacionais e internacionais, mobilizando famílias, a sociedade e os poderes legislativo, judiciário e executivo. Para compreender os argumentos que sustentam essa modalidade educacional, é fundamental examinar seu processo sócio-histórico e identificar as razões que a embasam e se conectam com sua defesa no tempo presente. Por essa razão, propomos analisar os argumentos fundantes da educação domiciliar e relacioná-los ao debate no cenário brasileiro.

Desde a década de 1960, grupos da direita e da esquerda estadunidenses apresentavam motivações para defender a educação domiciliar. Estas motivações baseavam-se em regras de controle comunitário locais e direitos de autodeterminação em contraposição à ideia de identidade nacional. Dessa forma, abandonaram a perspectiva de construir um país melhor em detrimento do desejo de alicerçar instituições alternativas que garantissem uma contracultura, um universo paralelo focado em aspectos locais e na vida privada. Tanto a esquerda quanto a direita estavam reagindo à expansão educacional pública como uma experiência universal e, ao defenderem a educação domiciliar, posicionavam-se “contra a cultura de massa do Estado liberal moderno” (GAITHER, 2008, p. 227).

No campo da esquerda estadunidense, devido à repressão às manifestações políticas estudantis das décadas de 1960, passou-se a acreditar que a mudança aconteceria a partir da criação de uma sociedade alternativa. Isso levou esse segmento a uma atuação cada vez mais comunitária e em pequena escala. Nesse sentido, na década de 1970, formaram-se milhares de comunidades rurais (hippies) de gestão coletiva, adeptas a um modelo de vida mais naturalista: consumo de alimentos orgânicos e integrais, negação de produtos processados e embalados, cuidados com o meio ambiente, partos normais e domiciliares, e crianças criadas de forma livre e natural (GAITHER, 2008). Com foco na autonomia pessoal e contra as regulamentações externas, viam as escolas tradicionais como forma de impor às suas crianças uma assimilação ao sistema, e por isso optaram pela educação comunitária e domiciliar.

Por outro lado, o protestantismo estadunidense conservador e de direita reagiu à cultura liberal dominante e criou suas próprias instituições, como livrarias cristãs, estações de rádio, canais de televisão, festivais, parques e, também, ao questionar as instituições públicas de ensino, fundaram suas escolas com a finalidade de eduar crianças e adolescentes “normais” vocacionados em sua fé e devoção. A narrativa desse segmento é pró-família cristã e, neste sentido, adotam o homeschooling como uma forma de reforçar seus valores morais e perspectivas conservadoras. As mulheres deste segmento tinham uma narrativa doméstica e antifeminista, embora assumissem liderança nessas estratégias de formação conservadora de suas comunidades: “Organizaram salas de leitura, campanhas de recenseamento eleitoral e clubes de mulheres. Muitas tornaram-se oradoras públicas e algumas concorreram a cargos públicos.” (GAITHER, 2008, p. 230). Ainda na década de 1950, estas mulheres invadiam secretarias de escolas para exigir a retirada de livros que consideravam simpáticos ao comunismo e, a partir da década de 1960, os grupos conservadores que elas lideravam passam a questionar o modo como a história social daria mais ênfase às experiências dos estadunidenses comuns do que à história de fundadores e presidentes do país; as abordagens sobre gênero, sexo, raça e diversidade religiosa; a secularização; a explicação sobre a vida e seus ciclos; e o enfoque em metodologias científicas aplicadas à educação.

Ainda na década de 1960, os grupos conservadores fundamentalistas estadunidenses conseguiram emplacar suas agendas em níveis locais. No entanto, entre 1962 e 1963, a Suprema Corte do país proibiu a predominância de práticas cristãs – a leitura da Bíblia e as orações – como integrantes da rotina escolar. Essa linha de decisão passou a se repetir no sistema judiciário, o que levou ao aumento do ataque às instituições públicas mantidas pelo Estado. Gaither cita como exemplo o fato de o então deputado do Alabama, George Andrews, discursar em rede nacional que “a Suprema Corte havia “colocado os negros nas escolas – agora eles colocaram Deus fora das escolas’” (GAITHER, 2008, p. 231). Como alternativa às derrotas no sistema judiciário, conservadores desistem, por ora, das tentativas de transformar a educação pública, começam a retirar seus filhos do sistema público de educação e criam escolas privadas confessionais. Conforme Gaither, a motivação era tanto religiosa quanto racial.

Às vezes, a mistura de motivos religiosos e raciais era óbvia, como no movimento em massa de brancos para escolas de segregação “privadas” em áreas como o condado de Prince Edward, na Virgínia, e a região do Delta do Mississippi, muitas vezes financiadas pelo governo através de programas de vouchers ou outros meios clandestinos. Nas palavras de um funcionário do Conselho de Cidadãos do Mississippi, essas escolas preservariam uma “ilha de segregação”, tal como os mosteiros “salvaram os clássicos gregos e romanos” durante a “Idade das Trevas”. Em 1968, quarenta e duas escolas de segregação recebiam vales de mensalidade do estado do Mississippi. Em 1973, após a aplicação judicial mais rigorosa da dessegregação, havia 125 dessas escolas, muitas delas com milhares de matrículas (GAITHER, 2008, p. 231).

As escolas oficializadas e credenciadas pela Association of Christian Schools International (ACSI)1 passaram de 308 em 1973 para 3.957 em 2005, o que demonstra um crescimento exponencial em três décadas. No entanto, o autor aponta que várias outras escolas cristãs que surgiram a partir da década de 1970 não foram formalizadas nem contabilizadas. As ideias de Kenneth Gangel, que afirmou que “os filhos de Deus merecem algo melhor do que a educação pública pagã. Quando entregamos os nossos filhos e filhas ao sistema secular, convidamos os valores, padrões e erros de uma cultura ímpia a penetrar em seus espíritos” (GAITHER, 2008, p. 232), tiveram influência significativa na decisão das famílias de retirar seus filhos das instituições educacionais estatais.

A criação de escolas privadas, como reação à democratização e não secularização das escolas públicas, não respondeu a todos os anseios de famílias conservadoras. Entre os problemas de adesão à proposta, Gaither (2008) aponta que o pagamento de mensalidades inviabilizou a participação de pessoas com renda insuficiente. Além disso, a diversidade de visões sobre a teologia entrou em conflito com a tendência escolhida pelas escolas, que muitas vezes não tinham estrutura para atender pessoas com deficiência, por exemplo. Houve também divergência de entendimento sobre quem é responsável por educar: a escola ou a família (ensino doméstico).

Em poucos anos, as famílias cristãs estadunidenses se dividiram entre escolas particulares e o ensino domiciliar. Nesse contexto, as mulheres, que já lideravam protestos, faziam mobilizações eleitorais e conduziam estudos bíblicos em suas comunidades, assumiram essa tarefa de ensinar suas crianças com facilidade. Entretanto, essa prática trouxe insegurança para os campos do aprendizado, socialização e segurança das crianças. Em resposta, algumas leis estaduais foram criadas para tornar ilegal o ensino domiciliar, gerando conflitos entre Estado e famílias.

Neste sentido, Gaither (2008) expõe que a educação domiciliar aconteceu porque: 1) grupos tanto de esquerda como de direita buscavam afirmar sua visão e estilo de vida isolando-se em pequenas comunidades; 2) a suburbanização fortaleceu a segregação entre grupos sociais, especialmente por raça, classe e orientação cultural, criando um movimento libertário e antigoverno entre aqueles que não viam seus anseios particulares espelhados na política de Estado; 3) a romantização da infância como promessa e dádiva essencial e inviolável e a proteção desse segmento das maldades do mundo2; e 4) o crescimento e a democratização das escolas públicas, que progressivamente transformam a cultura escolar em algo mais secular, com abordagens focadas na ciência e na diversidade, que passam a ser vistas como ameaça aos valores cristãos, tornando os contatos mais burocráticos e impessoais na relação com as famílias e com as variações culturais dos territórios. Grupos conservadores estadunidenses passam a associar as transformações da sociedade e das famílias estadunidenses às mudanças ocorridas no sistema educacional, como a compreensão dos temas do aborto, divórcio, casamento homossexual etc. Ademais, o autor aponta que os esforços de mulheres ativistas cristãs e as instituições por elas criadas foram preponderantes para que a educação domiciliar se concretizasse.

Tal Levy (2009) realizou um estudo estatístico demonstrando que a integração racial na educação pública é um elemento preponderante para o avanço do homeschooling. Ou seja, conforme grupos historicamente discriminados acessam a educação pública, há um crescimento do ensino doméstico como reação à experiência multicultural e à diversidade ideológica nos EUA. Nesse país, há uma correlação entre a integração racial e a pressão para a aprovação de leis que legalizam o homeschooling, o que, consequentemente, possibilita o aumento do número de estudantes que são escolarizados em seus próprios lares. Outro elemento definidor destacado pelo autor é a religião, já que sua pesquisa revela que, quanto maior o número de fundamentalistas cristãos em determinados territórios, maior é a chance da aprovação de leis que regulamentam a educação domiciliar e do crescimento percentual de adesão das famílias a esta categoria. Organizações religiosas atuam politicamente para a aprovação da categoria pelo Estado.

As informações apresentadas até aqui revelam que, até a década de 1980, havia dois perfis de estudantes formados em casa: aqueles provenientes de famílias da direita religiosa e de famílias da esquerda libertária. Ambos demonstraram sua insatisfação com a educação pública em termos ideológicos e culturais. No entanto, há outro grupo que passou a ver a educação domiciliar como uma alternativa ao sistema educacional, como demonstra Ama Mazama Garvey Lundy (2012) ao analisar famílias afro-estadunidenses que aderem ao modelo para fugir do universalismo que invisibiliza a humanidade negra e reforça o racismo. A orientação curricular eurocêntrica, a negação da história e cultura negras, o tratamento desigual dado às crianças negras pelos professores e a penalização desproporcional de estudantes negros são os principais motivadores que levam essas famílias a optar por um “protecionismo racial” na criação de seus filhos.

As famílias que optam pelo protecionismo racial não acreditam na possibilidade de as escolas públicas e privadas se eximirem do racismo estrutural existente no país e têm como intenção garantir a segurança e evitar a submissão às experiências de racismo recorrentes nas escolas públicas. O currículo e o tratamento dado por profissionais da educação são os principais motivadores da escolha dessas famílias pela educação domiciliar: o primeiro por distorcer a história, cultura e contribuições africanas, afro-americanas e afro-estadunidenses; o segundo, pela estereotipação, tratamento desigual e criminalização de estudantes negros.

Embora tenhamos abordado a experiência estadunidense até aqui, esses elementos se repetem na realidade brasileira. Na educação, profissionais técnicos e professores são perseguidos e ameaçados devido às políticas e temáticas relativas às diversidades. Nos municípios e estados, diversos projetos locais são apresentados visando regulamentar a educação domiciliar e, no judiciário, casos pessoais e coletivos são analisados e julgados. O ensino confessional no país existe e tem força desde as missões jesuíticas, o que impacta práticas de proselitismo religioso nas escolas públicas até os dias atuais, e a mudança de sentido representa uma ameaça para conservadores fundamentalistas.

Conforme as instituições garantidoras de direitos vão se democratizando e se tornando menos pessoais e mais burocráticas, a negação da escola pública e do Estado se repete no Brasil. Ou seja, à medida que o direito à educação é ampliado e as temáticas de diversidade que compõem o território nacional ganham espaço nas instituições públicas educacionais, grupos conservadores passam a questionar as políticas públicas. Dessa forma, projetos visando a censura do trabalho de profissionais da educação passam a ser judicializados e, diante de derrotas, como as decisões contrárias a projetos como Escola Sem Partido e a proibição de ideologia de gênero, grupos conservadores buscam alternativas para retirar suas crianças e adolescentes de espaços plurais e de convivência democrática.

A trajetória do homeschooling no Brasil tem sido objeto de análise por diversos estudiosos. Barbosa (2016) destaca como a paulatina democratização da educação influencia a demanda de algumas famílias pelo direito de educar seus filhos em casa. Defensores do ensino domiciliar apontam “falhas no sistema escolar e apresentam críticas ao sistema educacional público como um modelo de produção de massa, que serve aos interesses do governo, atuando as escolas como simples meios para assegurar um controle social por parte do Estado” (BARBOSA, 2016, p. 160).

Cury (2019), Barbosa (2016) e Moreira, Moura e Teixeira (2022) demonstram que a narrativa em defesa da educação domiciliar no Brasil enfoca a qualidade da educação pública, a violência e, sobretudo, o direito das famílias de educarem suas crianças de acordo com suas perspectivas éticas, morais e religiosas. Esse debate tem levado à judicialização da questão, buscando respaldo jurídico para a escolarização domiciliar.

Moreira, Moura e Teixeira (2022) argumentam que a educação domiciliar limita o ensino de controvérsias, ou seja, a discussão de temas que possibilitem o diálogo entre diferentes perspectivas na sociedade. Eles definem que “temas controversos são aqueles em que há discordância entre diferentes grupos, razoabilidade dos argumentos apresentados pelas partes em desacordo, questões emocionais envolvidas e relação com o interesse público”  (p. 4). Os autores defendem que o ensino de controvérsias é essencial para fortalecer a democracia, pois o contraste entre diferentes pontos de vista sobre um tema possibilita a troca, o aprendizado e a reflexão profunda, impactando todos os envolvidos no processo educacional.

O ensino dessas questões estimula que os estudantes reflitam sobre debates atuais da sociedade, aprendam sobre diferentes pontos de vista e exercitem a deliberação, que é parte fundamental da democracia. Nesse sentido, eles aprendem na e para a democracia. Se a escola e os professores se recusam a discutir esses temas – ou se são impedidos de fazê-lo –, sinaliza-se para os alunos que essas questões são irrelevantes ou são tabus. Discutir essas questões não só é mais educativo do que anular ou ignorar as diferenças, mas também aumenta a qualidade da tomada de decisão, assegurando que múltiplas visões em disputa sejam explicitadas e analisadas séria e criticamente (Hess, 2009, apud Moreira; Moura; Teixeira, 2022, P. 4).

Na perspectiva de Moreira, Moura e Teixeira (2022), a escola é o espaço ideal para o ensino de controvérsias, porque, como define Hess (2009), “os currículos escolares possuem uma variedade de formas e tópicos que possibilitam conexões com controvérsias”, “em função de sua formação e experiência, os professores já possuem ou podem desenvolver conhecimentos e saberes que lhes permitam apresentar argumentos e mediar discussões entre e com os estudantes”, e “a escola é um dos poucos espaços em que os estudantes possuem oportunidade de encontrar pessoas que pensam de forma distinta deles e de suas famílias para discutir um determinado assunto em específico e, ainda, com a mediação de um adulto (o professor)” (Moreira; Moura; Teixeira, 2022, p. 4).

Os autores apresentam seis objetivos do que Hess e McAvoy (2015) denominam de sala política:

O primeiro é a igualdade política: os estudantes devem reconhecer uns aos outros como iguais, do ponto de vista político. Isto é, devem deliberar a partir do entendimento de que os membros de uma sociedade têm direito à vida, à liberdade e à felicidade. O segundo é a tolerância política, entendida como o reconhecimento de que o poder coercitivo do Estado não deve ser utilizado para promover leis injustas ou perseguir indivíduos e grupos cujas visões não estejam de acordo com os demais. O desenvolvimento da autonomia é o terceiro objetivo, que representa, simultaneamente, a ideia democrática de que os adultos devem poder direcionar suas próprias vidas e o objetivo educacional de ajudar crianças e jovens a desenvolver habilidades, disposições e conhecimentos para decidirem de maneira bem fundamentada como desejam viver. Já o quarto objetivo, justiça (fairness), consiste em estimular os estudantes a pensarem no bem comum, avaliando o seu interesse próprio em contraste com o de outrem, considerando seriamente quem está sendo mais prejudicado em cada cenário possível. O quinto é o engajamento, no sentido de incentivar os alunos a participarem ativamente de atividades políticas e da vida democrática. Finalmente, o letramento político trata de instigar os estudantes não apenas a conhecerem questões controversas e evidências relacionadas, mas também a serem capazes de reconhecer ideologias políticas distintas sobre o que é mais justo e democrático. (Moreira; Moura; Teixeira, 2022, P. 5).

A sala política, como espaço de fortalecimento da convivência democrática, possibilita o contato e a comunicação entre múltiplos grupos sociais. Diante da universalização do acesso à educação e da diversificação das escolas públicas, defensores do homeschooling no Brasil buscam retirar seus filhos de lugares que implicam o compartilhamento de experiências plurais. Ao analisar a literatura sobre a temática no contexto brasileiro, Moreira, Moura e Teixeira (2022) demonstram que a educação domiciliar tem duas bases que orientam a sua defesa: “o neoconservadorismo e o neoliberalismo”; a primeira busca manter o status quo de grupos privilegiados e o direito natural dos familiares sobre a educação de suas crianças, enquanto que a segunda reduz o papel do Estado à defesa dos direitos privados das famílias e dos indivíduos.

O primeiro deles, em uma dinâmica complexa, atua em prol da manutenção do status quo e pela modificação e controle da ordem moral segundo seus interesses. Cecchetti e Tedesco (2020) indicam que é o fundamentalismo religioso cristão que norteia a noção de moralidade, funcionando como uma espinha dorsal para o novo conservadorismo. Assim, a defesa da família tradicional, patriarcal, heteronormativa e temente a Deus se traduz na rejeição às discussões sobre gênero, à expansão de direitos a pessoas LGBTQIA+, na defesa do patriotismo e de uma agenda punitivista. O neoconservadorismo brasileiro possui fortes ligações com o movimento norte-americano, tendo como uma de suas forças propulsoras, em ambos os países, a direita cristã. Além disso, o neoconservadorismo advoga uma concepção jusnaturalista do direito, para a qual existem direitos que são naturais e imutáveis, em negação ao direito positivo, que compreende que as leis são fruto do direito e refletem a vida de uma sociedade em um tempo. Assim, defende que o direito dos pais sobre seus filhos é um direito natural, portanto a-histórico, imutável e incontestável (Fassò, 1993).

Já o neoliberalismo é definido por Brown (2019) como um conjunto de ações políticas que visam à privatização, diminuindo, por sua vez, o papel do Estado Social. Os pais do neoliberalismo advogavam a ideia da inexistência do social, havendo, além do Estado, apenas os indivíduos e suas famílias. Assim, a função do Estado seria a de defender a esfera individual e familiar. Logo, o seu papel na educação também deveria ser o de proteger a vontade da família por meio do direito. Para isso, fundamenta-se no conceito de liberdade, em especial a individual. Nessa perspectiva privatista, o bem comum e a noção de coletivo são inviabilizados em razão da exaltação da perspectiva individual. Além das privatizações habitualmente discutidas – as dos serviços públicos –, o neoliberalismo privatiza aquilo que é abstrato, mas que interfere concretamente, por ser fundamental para o sustento da convivência – a noção de agrupamento (Moreira; Moura; Teixeira, 2022, P. 7-8).

A questão da  educação domiciliar no Brasil é permeada por fundamentos neoliberais e neoconservadores, que buscam reafirmar os valores tradicionais da família cristã. A ideia de que os filhos são propriedades de seus progenitores se contrapõe ao que determina a Constituição de 1988, a qual estabelece a doutrina de proteção integral, afirmando que “é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão” (Moreira, Moura, & Teixeira, 2022).

Apesar de contrariar as perspectivas da Carta Magna, propostas de institucionalização do homeschooling têm avançado no país desde a última década. Cury (2019) faz um resgate histórico para demonstrar que desde o Brasil Império a legislação nacional regulamentava a educação domiciliar. Nesse período, os filhos das elites eram educados por familiares ou por profissionais contratados dentro de casa, ou ainda enviados para internatos privados. As reformas de 1854 (Couto Ferraz) e 1879 (Leôncio de Carvalho) já permitiam o ensino doméstico, e o Decreto 981 de 1890 isentava de inspeção as experiências educacionais realizadas “no seio das famílias” (Cury, 2019, p. 3). A legitimidade dessa modalidade de ensino também foi reconhecida no Plano Nacional de Educação (1936-1937), na Constituição de 1937 e na Constituição de 1946.

Somente na Constituição de 1988 é que, apesar de a proibição da educação domiciliar não estar explícita, afirma-se que o Estado e os familiares têm o papel de garantir a frequência à escola. O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/1990) aponta a obrigatoriedade de matricular as crianças e adolescentes em escolas, e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/1996) reafirma esse direito. Apesar das mudanças na legislação, diversos casos foram levados ao judiciário brasileiro, que, desde 2001, coleciona decisões contrárias e favoráveis ao homeschooling. Em 2018, o Supremo Tribunal Federal (STF) julgou inconstitucional a educação domiciliar por 9 votos a 2, argumentando que não há regulamentação para essa modalidade de ensino e que ela é incompatível com a Constituição, que estabelece a participação da família, do Estado e da sociedade na educação de crianças e adolescentes.

(1) CF: “Art. 226 – Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.[…]”.

(2) CF: “Art. 227 – É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.”.

(3) CF: “Art. 229 – Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade.

(4) CF: “Art. 205 – A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.”.

(5) CF: “Art. 206 – Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios de” igualdade de condições, pluralismos de ideias, liberdade para aprender….

(6) CF: “Art. 208 – Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:” dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria…

(9) CF: “Art. 210 – Art. 210. Serão fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a assegurar formação básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais e regionais.”.

(10) CF: “Art. […] 208, §3º Compete ao Poder Público recensear os educandos no ensino fundamental, fazer-lhes a chamada e zelar, junto aos pais ou responsáveis, pela frequência à escola.”3

Ao considerar a Constituição de 1988, a educação básica pública é um direito de todas as pessoas e acontece nos âmbitos da família, da sociedade e das instituições do Estado, ou seja, a escola, garantindo conteúdos mínimos de aprendizagem. Deve ser valorizada a multiplicidade de ideias e a liberdade para aprender. Neste sentido, há um paradoxo entre o que normatiza o direito à educação no país e os interesses das famílias que defendem a educação domiciliar.

Na contramão da decisão do STF, parlamentares e governantes continuam apresentando propostas de regulamentação da educação domiciliar. Em 2019, menos de um ano após a decisão do STF, o então presidente Jair Bolsonaro enviou um projeto de lei ao Congresso visando regulamentar esta modalidade (PL 2401/2019). Em 2021, seu governo lançou uma cartilha com diretrizes para a sua implementação, intitulada “Educação domiciliar: Um direito humano tanto dos pais quanto dos filhos”, que aponta diretrizes para o homeschooling4. Ao analisar, encontramos uma publicação superficial de vinte páginas que não faz nenhum tipo de aprofundamento sobre a temática, mas apresenta, em poucas palavras, o que é a educação domiciliar, o percentual de países que aderem a esta modalidade, experiências internacionais, estatísticas de famílias e crianças que estudam conforme este modelo no país, práticas de educação domiciliar e os propósitos e objetivos da regulamentação, além de citar todos os projetos de lei arquivados e em tramitação no Poder Legislativo Federal. O documento tem em sua página de fechamento a seguinte frase: “O Brasil não pode mais esperar”.

No âmbito do legislativo federal, em 2022, a Câmara Federal aprovou o PL 3179/2012 que permite a educação domiciliar de estudantes regularmente matriculados em escolas, mas que cumprem suas atividades escolares em suas residências, acompanhados à distância pela instituição de ensino. O texto aprovado transforma a escola, em que o estudante está matriculado, em um espaço meramente burocrático, com o papel apenas de repassar informações cadastrais ao órgão competente em que a unidade é cadastrada, aplicar avaliação anual e realizar encontros semestrais com estudantes e seus tutores. Neste momento, este projeto está em tramitação no Senado como PL 1.338/2022 sob relatoria da Senadora Professora Dorinha Seabra e em fase de escuta de especialistas e da sociedade por meio de Audiências Públicas conduzidas pela Comissão de Educação e Cultura. Concomitantemente, há articulação e pressão das organizações da sociedade civil contra sua aprovação.

Ainda no âmbito da Câmara Federal, até a última legislatura, havia uma Frente Parlamentar em Defesa do homeschooling que não foi oficializada, embora já tenha assinaturas suficientes para a sua institucionalização. No entanto, esta frente não foi reinstalada nesta legislatura. Com relação à tramitação do projeto PL 1.338/2022 no Senado, a relatora Senadora Dorinha Seabra, que tem se posicionado favorável à regulamentação, informou que apresentará o parecer e encaminhará o tema para votação no primeiro semestre deste ano (2024).

No dia 04 de dezembro de 2023, foi realizada a segunda audiência pública sobre esse PL no Senado, que reuniu majoritariamente pessoas contra a aprovação da proposta. Durante o evento, a Campanha Nacional pelo Direito à Educação apresentou uma nota técnica contra o PL, na qual argumenta que

  1. A garantia da prioridade à legislação vigente para a implementação e o orçamento públicos. O orçamento disponível atual sequer é suficiente para o cumprimento do Plano Nacional de Educação (PNE) vigente e coloca em risco a efetiva implementação do novo PNE (2024-2034). Nesse sentido, o Congresso Nacional precisa priorizar o debate em curso sobre o Relatório Preliminar da PLDO 2024 e das emendas apresentadas. Não há espaço para aprovar uma nova política, que atenda à demanda de um grupo pequeno e que exige desvio da dedicação orçamentária para planejamento, monitoramento, avaliação, e sistema dedicado.
  2. A exclusão escolar como um dos efeitos perversos da pandemia na educação e na proteção de crianças e adolescentes. O país tem, aproximadamente, 5,5 milhões de crianças e adolescentes sem matrículas ou vínculo com escolas. Muitos também órfãos de seus pais e/ou responsáveis como consequência da pandemia de COVID-19, o que os coloca em situação de vulnerabilidade social e escolar.
  3. As decisões recentes do Supremo Tribunal Federal (STF) e a Proteção Integral e Atenção Prioritária. Há um conjunto de julgados recentes, a partir de 2020, que evidenciam a inconstitucionalidade da educação domiciliar em território nacional e que reconhece as responsabilidades específicas e inerentes ao Estado como garantidor dos direitos de crianças e adolescentes, considerando suas condições peculiares de desenvolvimento, o que se aplica também para a efetiva garantia do direito à Educação.
  4. A inversão sobre o direito das famílias e/ou responsáveis versus de estudantes. Usar o argumento do direito dos pais para retirar dos filhos o direito à educação escolar, para além dos processos formativos culturais, morais e religiosos que ocorrem no seio familiar, é afronta direta ao modo como o direito à educação foi pactuado em nossa Constituição, sua vocação para a formação de cidadãos autônomos e aptos ao convívio democrático com a diferença e a pluralidade. Segundo artigo da Procuradora Maria Mona Lisa Duarte Aziz, a Corte Europeia de Direitos Humanos entendeu que a frequência escolar compulsória não viola a liberdade religiosa, tampouco o direito de educar os filhos, uma vez que tais liberdades restam asseguradas através do direito de escolher a instituição de ensino na qual essas crianças vão estudar e do direito de recusa a frequentar as aulas de religião, que não podem ser obrigatórias. A legislação brasileira está em sintonia com tais marcos internacionais. Em nenhum momento a legislação presume interferência do Estado na educação das famílias.
  5. A diversidade no país de instituições escolares, públicas e privadas, e de projetos político-pedagógicos. O argumento de que a não regulamentação é um cerceamento da liberdade não procede, uma vez que o Estado brasileiro oferece uma ampla gama de possibilidades de escolhas no momento de definir a escola de seus filhos, considerando os processos formativos culturais, morais e religiosos de cada núcleo familiar.
  6. As famílias já são livres para a escolha da religião. Não há na legislação nenhuma interferência do Estado na educação das famílias. É importante destacar que o ensino é obrigatório em instituição escolar pública ou particular, laica ou confessional, comunitária ou filantrópica, conforme escolha da família e/ou responsáveis.
  7. A gestão democrática como princípio fundamental do direito à educação, emancipatória e crítica. Para a construção de uma sociedade justa e solidária, o exercício de uma cultura de paz, de alteridade se faz na relação com o outro. A educação como prática da liberdade exige um espaço de debate sobre os temas da sociedade, inclusive os mais sensíveis. Só através de uma educação democrática, com espaço para o debate plural, com suas contradições ou consensos, e através do diálogo respeitoso é que será possível ser e conviver. 
  8. Os estudantes têm direito a serem respeitados e de participar ativamente da construção de sua educação. É a gestão democrática que possibilita aos sujeitos da educação a construção crítica do processo educacional. A educação domiciliar não pode ser utilizada como alternativa para uma educação de qualidade, uma vez que o debate sobre qualidade na educação ocorre no bojo da gestão democrática e participativa do processo pedagógico. O debate precisa ser aprofundado, com efetivo processo de escuta dos estudantes, pois o tema diz respeito diretamente a eles.
  9. A educação como uma relação de ensino e aprendizagem, em que a figura do educador, formado cientificamente e pedagogicamente, é central. Ensinar e aprender é um processo complexo que está presente na prática docente e nas atividades escolares. Pais, responsáveis ou tutores não têm formação em todas as ciências e/ou em pedagogia.
  10. A educação domiciliar desloca a responsabilidade para o autodidatismo dos estudantes e é meritocrática .É preciso garantir o conhecimento científico que se desenvolve por meio do adequado trabalho pedagógico e não deslocar a responsabilidade para o autodidatismo dos estudantes.
  11. A educação domiciliar impossibilita a educação como prática da liberdade e a educação inclusiva. Não se pode reduzir a escola a um espaço de transmissão de conteúdos. A escola é espaço de convivências e vivências. A educação inclusiva ocorre na convivência com a diversidade. A escola é, por excelência, espaço de experimentação social, em que se aprende a viver entre pares e em comunidade. Uma sociedade inclusiva começa pelo ambiente escolar. Regulamentar a educação domiciliar significa restringir o acesso à escola e não reconhecer a importância da convivência com as diversidades.
  12. A educação não é mercadoria. A educação domiciliar fere a educação como bem público e é uma forma de privatização da educação, em que prevalece o interesse privado em detrimento do interesse público, ampliando ainda mais o mercado, altamente lucrativo, de empresas privadas na educação.
  13. A visão estreita da avaliação dos estudantes proposta pelos defensores da educação domiciliar. Uma avaliação baseada em provas é uma perspectiva conservadora e ultrapassada que desconsidera outras dimensões do processo educativo que efetivamente precisam ser consideradas.
  14. Há massiva contrariedade à educação domiciliar. Uma pesquisa nacional do Datafolha, realizada pelo Cesop-Unicamp 5, sob a coordenação de Ação Educativa e Cenpec, revela que oito em dez pessoas são contrárias a que pais tenham o direito de tirar seus filhos da escola para ensiná-los em casa. Os dados da pesquisa demonstraram que a população brasileira compreende que a escola é importante para a socialização das crianças e adolescentes, inclusive para a convivência com crianças com deficiência. A adesão de mais de 400 entidades ao Manifesto contra a Regulamentação da Educação Domiciliar e em Defesa do Investimento nas Escolas Públicas também revela a preocupação de diferentes segmentos da sociedade com a educação domiciliar e seus potenciais impactos.

Atualmente, também tramita no Senado o PL 5884/2019, que visa regulamentar as Instituições Comunitárias de Educação Básica. Aproveitando a celeridade da tramitação dessa proposta, o Senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) incluiu no projeto uma emenda para regulamentar o homeschooling como escolas comunitárias, a qual foi rejeitada. O tema desperta a preocupação do Ministério da Educação (MEC) pelas brechas que ele abre para a educação domiciliar. Alexsandro do Nascimento Santos, Diretor de Políticas e Diretrizes da Educação Integral Básica, destaca: “Também nos chama a atenção uma possível ambiguidade jurídica quando, no inciso terceiro, se propõe que um dos objetivos das escolas comunitárias seja prestar serviços de educação básica de forma substitutiva àquela ofertada pelo Estado, sem determinar quais etapas e quais modalidades isso é aplicado, e para nós, isso é um risco jurídico por causa do novo FUNDEB que determinou quais são as etapas e modalidades que poderiam receber investimento público dos entes subnacionais”.5

Abaixo, apresentamos um levantamento de projetos de lei e matérias em andamento no poder legislativo federal.

PL 3179/2012 

Ementa: Acrescenta parágrafo ao art. 23 da Lei nº 9.394, de 1996, de diretrizes e bases da educação nacional, para dispor sobre a possibilidade de oferta domiciliar da educação básica.

Nova Ementa da Redação

NOVA EMENTA: Altera as Leis nºs 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), e 8.069, de 13 de julho de 1990, (Estatuto da Criança e do Adolescente), para dispor sobre a possibilidade de oferta domiciliar da educação básica.

Data de apresentação: 08/12/2012

Autor: Lincoln Portela 

Partido: PR

UF autor: MG

Forma de Apreciação

Proposição Sujeita à Apreciação do Plenário

Andamento: 19/05/2022

Mesa Diretora ( MESA )

Desapensação dos Projetos de Lei nºs 1.0185/2018, 2.401/2019, 3.159/2019, 3.261/2015, 5.852/2019 e 6.188/2019, apensados, em face de sua declaração de prejudicialidade, decorrente da aprovação em Plenário da Subemenda Substitutiva Global ao Projeto de Lei nº 3.179, de 2012, adotada pela relatora da Comissão Especial (Sessão Deliberativa Extraordinária de 19/5/2022 – 9h – 65ª Sessão).

Apresentação da Redação Final n. 1 PLEN, pela Deputada Luisa Canziani (PSD/PR). 

Apresentação do Autógrafo n. 1 MESA, pela CÂMARA DOS DEPUTADOS. 

Remessa ao Senado Federal por meio do Of. nº 327/2022/SGM-P.

Despacho atual:

Revejo o despacho aposto ao PL 3262/2019 para desapensá-lo do PL 3179/2012 e distribuí-lo à Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (Mérito e Art. 54, RICD). Proposição Sujeita à Apreciação do Plenário. . Regime de Tramitação: Ordinária (Art. 151, III, RICD). Revejo, ainda, o despacho aposto ao Projeto de Lei n. 3.179/2012, para excluir o exame de mérito pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania e determinar sua apreciação Conclusiva pelas Comissões. Proposição Sujeita à Apreciação Conclusiva pelas Comissões – Art. 24 II. Regime de Tramitação: Prioridade (Art. 151, II, RICD)[ATUALIZAÇÃO DO DESPACHO DO PL N. 3.179/2012: CDHM, CSSF, CE, CFT (mérito e art. 54 do RICD) e CCJC (art. 54 do RICD). Esclareço que a matéria permanece aguardando criação de Comissão Especial, consoante art. 34, II do RICD. Proposição sujeita à apreciação conclusiva pelas Comissões (art. 24, II, do RICD). Regime de tramitação: prioridade.]

Regime de Tramitação: Urgência (Art. 155, RICD)

Situação: Aguardando Apreciação pelo Senado Federal.

PL 1338/2022

Ementa: Altera as Leis nºs 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), e 8.069, de 13 de julho de 1990, (Estatuto da Criança e do Adolescente), para dispor sobre a possibilidade de oferta domiciliar da educação básica.

Data de apresentação: 08/12/2012

Autor: Lincoln Portela 

Partido: PR

UF autor: MG

Andamento: CE – Comissão de Educação e Cultura

Regime de tramitação e despacho atual:

Em 04/12/2023, foi realizada a 2ª audiência pública em atendimento aos REQ 125/2023, REQ 126/2023, REQ 128/2023, REQ 129/2023, REQ 131/2023, REQ 133/2023 e REQ 136/2023. 

Relator atual: Senadora Professora Dorinha Seabra

Situação: Aguardando audiências públicas.

PL 3262/2019

Ementa: Altera o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, para incluir o parágrafo único no seu art. 246, a fim de prever que a educação domiciliar (homeschooling) não configura crime de abandono intelectual. 

Data de apresentação: 03/06/2019

Autor: Chris Tonietto, Bia Kicis, Caroline de Toni e outros.

Partido: PSL, PSL, PSL. 

UF autor: RJ, DF, SC. 

Forma de Apreciação

Proposição Sujeita à Apreciação do Plenário.

Andamento: 

29/09/2021

Mesa Diretora ( MESA )

Apresentação do Requerimento de Urgência (Art. 155 do RICD) n. 1924/2021, pela Deputada Bia Kicis (PSL/DF) e outros, que “Requer, nos termos do artigo 155 do Regimento Interno, tramitação sob o regime urgência do Projeto de Lei nº 3262/19.

Regime de tramitação e despacho atual:

27/04/2021

Revejo o despacho aposto ao PL 3262/2019 para desapensá-lo do PL 3179/2012 e distribuí-lo à Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (Mérito e Art. 54, RICD). Proposição Sujeita à Apreciação do Plenário. Regime de Tramitação: Ordinária (Art. 151, III, RICD). Revejo, ainda, o despacho aposto ao Projeto de Lei n. 3.179/2012, para excluir o exame de mérito pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania e determinar sua apreciação Conclusiva pelas Comissões.

Regime de Tramitação: Ordinário (Art. 151, III, RICD).

Situação: Pronta para Pauta no Plenário (PLEN).

PL 5486/2019

Ementa: Institui o Estatuto das Famílias, a definição de entidade familiar, a promoção de políticas públicas, assim como estabelece diretrizes para a educação formal e domiciliar dos filhos.

Data de apresentação: 10/10/2019

Autor: Pastor Eurico

Partido: Patriota 

UF autor: PE

Forma de Apreciação

Proposição Sujeita à Apreciação Conclusiva pelas Comissões – Art. 24 II.

Andamento: 30/10/2019

COORDENAÇÃO DE COMISSÕES PERMANENTES ( CCP )

Encaminhada à publicação. Publicação Inicial em avulso e no DCD de 31/10/19 PÁG 385.

Regime de tramitação e despacho atual:

Apense-se à(ao) PL-4965/2019. Proposição Sujeita à Apreciação Conclusiva pelas Comissões – Art. 24 II. 

Regime de Tramitação: Ordinária (Art. 151, III, RICD).

Situação: Apensado ao PL 4965/2019.

PLP 22/2022

Ementa: Autoriza os Estados e o Distrito Federal a legislarem sobre diretrizes e bases da educação domiciliar (Homeschooling), nos termos do parágrafo único do art. 22 da Constituição Federal de 1988.

Data de apresentação: 16/03/2022

Autor: Roman 

Partido: Patriota

UF autor: PR

Forma de Apreciação

Proposição Sujeita à Apreciação do Plenário

Andamento: 24/05/2023

Educação ( CE )

Aprovado requerimento n. 108/2023 do Sr. Delegado Paulo Bilynskyj que requer a realização de Mesa Redonda no Estado de São Paulo, para discutir acerca do PLP 22/2022, que Autoriza o Homeschooling.

Regime de tramitação e despacho atual: 29/02/2022

Às Comissões de Educação e Constituição e Justiça e de Cidadania (Mérito e Art. 54, RICD)Proposição Sujeita à Apreciação do Plenário. Regime de Tramitação: Prioridade (Art. 151, II, RICD). 

Situação: Aguardando Parecer do Relator na Comissão de Educação (CE).

VTS 1 CCJC => PL 3262/2019

Ementa: Altera o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, para incluir o parágrafo único no seu art. 246, a fim de prever que a educação domiciliar (homeschooling) não configura crime de abandono intelectual.

Data de apresentação: 31/05/2021

Autor: Patrus Ananias, Paulo Teixeira, Alencar Santana e outros.

Partido: PT, PT, PT. 

UF autor: MG, SP, SP.

Acessório de: PL 3262/2019

Andamento: 31/05/2021

Apresentação do Voto em Separado n. 1 CCJC, pelo Deputado Patrus Ananias (PT/MG) e outros.

PRL 1 CCJC => PL 3262/2019

Ementa: Parecer do Relator, Dep. Felipe Francischini (PSL-PR), pela constitucionalidade, juridicidade, técnica legislativa e, no mérito, pela aprovação.

Altera o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, para incluir o parágrafo único no seu art. 246, a fim de prever que a educação domiciliar (homeschooling) não configura crime de abandono intelectual. 

Data de apresentação: 03/10/2019

Autor: Felipe Francischini  

Partido: PSL 

UF autor: PR

Acessório de: PL 3262/2019

Andamento: 15/10/2019

Plenário ( PLEN )

Apresentação do Requerimento n. 2675/2019, pela Deputada Professora Rosa Neide (PT/MT), que “Requer a revisão do despacho de distribuição do Projeto de Lei nº 3262/2019, que ‘altera o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, para incluir o parágrafo único no seu art. 246, a fim de prever que a educação domiciliar (homeschooling) não configura crime de abandono intelectual.'”.

PRL 1 CCJC => PEC 444/2009

Ementa: Parecer do Relator, Dep. Marçal Filho (PMDB-MS), pela admissibilidade.

Data de apresentação: 17/08/2011

Autor: Marçal Filho 

Partido: PMDB

UF autor: MS

Acessório de: PEC 444/2009

A Proposta em exame objetiva acrescentar dispositivo ao art. 208 da Constituição Federal, dispondo que “o Poder Público regulamentará a educação domiciliar, assegurando o direito à aprendizagem das crianças e jovens na faixa etária da escolaridade obrigatória por meio de avaliações periódicas sob responsabilidade da autoridade educacional”. 

Andamento: 17/09/2019

Constituição e Justiça e de Cidadania ( CCJC )

Apresentação do Parecer do Relator n. 1 CCJC, pelo Deputado Marçal Filho (PMDB-MS). Inteiro teor

Parecer do Relator, Dep. Marçal Filho (PMDB-MS), pela admissibilidade.

REQ 1083/2021
Ementa: Requer revisão do despacho de distribuição às comissões do PL 3.262/2019.
Data de apresentação: 18/05/2021
Autor: Bohn Gass
Partido: PT
UF autor: RS
O PL 3262/2019 propõe alterar o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, incluindo parágrafo único no seu art. 246, a fim de prever que a educação domiciliar (homeschooling) não configure crime de abandono intelectual.
Acessório de: PL 3262/2019
Andamento: 18/05/2021
Plenário ( PLEN )
Apresentação do Requerimento n. 1083/2021, pelo Deputado Bohn Gass (PT/RS), que “Requer revisão do despacho de distribuição às comissões do PL 3.262/2019”.
Situação: Aguarda Constituição e Justiça e de Cidadania ( CCJC )

SBT 1 CE => PL 3179/2012

Ementa:

Data de apresentação: 15/10/2018

Autor: Professora Dorinha Seabra Rezende 

Partido: DEM

UF autor: TO

Andamento: 15/10/2018

Educação ( CE )

Apresentação do Substitutivo n. 1 CE, pela Deputada Professora Dorinha Seabra Rezende (DEM-TO).

Acessório de: PL 3179/2012
COMISSÃO DE EDUCAÇÃO PROJETO DE LEI Nº 3.179, DE 2012 Apensados: PL nº 3.261/2015 e PL nº 10.185/2018 Acrescenta parágrafo ao art. 23 da Lei nº 9.394, de 1996, de diretrizes e bases da educação nacional, para dispor sobre a possibilidade de oferta domiciliar da educação básica.

Sobre a mobilização de parlamentares em torno da aprovação da educação domiciliar, Teles, Ferreira e Barbosa (2022) analisam tais movimentações à luz dos desafios ainda presentes de uma educação pública de qualidade:

Em observância ao discurso dos  parlamentares  durante  a  tramitação  de  projeto  de lei para regulamentar a educação domiciliar, ao que tudo indica é que há uma inversão de pautas perante o Congresso Nacional, pois o Brasil ainda é um país que precisa avançar no   acesso   à   educação   para   todos.   Além   desse   fator, ainda   há   questionamentos direcionados   ao   ente   estatal   que   precisam   ser   debatidos   perante   a   sociedade, pesquisadores da educação e demais envolvidos, pois versam sobre a garantia do direito à educação como, por exemplo, a capacidade do Estado em fiscalizar e auxiliar as famílias a praticarem educação domiciliar, consoante forma peculiar proposta no projeto de lei em discussão perante o  Plenário  brasileiro.  Isso porque na  área  da  educação  há  uma  luta histórica  da  sociedade  para  ampliação  de  recursos  financeiros  que  se  revelam  cada  vez mais escassos, inviabilizando a oferta de uma educação pública de qualidade (2022, p. 11-12).

Além das tentativas de legalizar a educação domiciliar por meio de alteração da LDB (Lei 9394/1996), que regulamenta a educação básica, os Projetos de Lei (PLs) apresentados buscam também descriminalizar o ensino domiciliar como abandono e negligência, e dar autonomia às unidades da federação para legislarem sobre a implementação dessa modalidade de ensino. A argumentação das proposições refere-se à autonomia das famílias para educar suas crianças e adolescentes em idade escolar conforme seus valores, práticas e costumes. Como se a escola pública, aberta a todas as pessoas, não fosse um espaço que, conforme os marcos legais, deve respeitar as subjetividades, diversidades e valores socioculturais de seus estudantes. Desta forma, fica evidente que o contato com a diversidade, que fortalece a convivência democrática, é o principal incômodo para grupos fundamentalistas-conservadores que não têm interesse em ver o encontro e o diálogo entre as diferenças que compõem a nossa sociedade.

O homeschooling representa a impossibilidade de um projeto de educação pública que confronte o racismo e o sexismo ainda presentes nos espaços escolares. Ainda são frágeis as ações pedagógicas que reafirmam a igualdade de gênero, que valorizam o pertencimento étnico-racial, a história e cultura afro-brasileira, pressupostos garantidos na Constituição Federal e na LDB. A pesquisa “Lei 10.639/03: a atuação das Secretarias Municipais de Educação no ensino de história e cultura africana e afro-brasileira”, realizada pelo Geledés Instituto da Mulher Negra e Instituto Alana em 2023, demonstrou que das 1.187 Secretarias Municipais de Educação participantes da pesquisa, mais da metade (53%) admitiram que não realizam ações consistentes e contínuas para a sua aplicação. Além disso, mostrou também que 18% delas não realizam nenhum tipo de ação para assegurar um currículo racialmente justo e que proporcione uma experiência escolar digna para todas as crianças e adolescentes (2023, p.8).

Enquanto integrantes da Rede de Ativistas pela Educação do Fundo Malala, compreendemos que a convivência escolar é fundamental para o pleno desenvolvimento das e dos estudantes, não podemos cercear o seu acesso às possibilidades diversificadas que contribuem para construir e trilhar novos sonhos e novos caminhos. Por isso, a discussão sobre as propostas de regulamentação da educação domiciliar exige ampla discussão, participação e controle social da sociedade civil, para que a efetivação da convivência respeitosa e plural se realize nas escolas brasileiras.


  1. A ACSI (Association of Christian Schools International) é uma associação sem fins lucrativos presente em todos os continentes para escolas cristãs. Promove uma filosofia de Educação Escolar Cristã e a integração da Cosmovisão Cristã no currículo em todos os locais.
    ↩︎
  2. “Durante o final da década de 1970 e início da década de 1980, a “década de pesadelos” sobre predadores sexuais à espreita, professores molestadores de crianças, cultura jovem depravada e lavagem cerebral oculta, muitos pais procuraram abrigo na segurança do lar para nutrir a promessa de sua crianças” (Gaither, 2008, P. 234).
    ↩︎
  3.  BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. ↩︎
  4. Para saber mais, acesse:
    https://www.gov.br/mec/pt-br/media/acesso_informacacao/pdf/CartilhaEducacaoDomiciliar_V1.pdf ↩︎
  5. Para saber mais, acesse: https://www12.senado.leg.br/radio/1/noticia/2023/05/02/saiba-o-que-sao-escolas-comunitarias-ccj-discutiu-o-assunto ↩︎

Referências Bibliográficas

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BENEDITO, Beatriz Soares; CARNEIRO, Suelaine; PORTELLA, Tânia (Orgs.). Lei 10.639/03: a atuação das Secretarias Municipais de Educação no ensino de história e cultura africana e afro-brasileira. São Paulo, SP: Instituto Alana, 2023.

BRITTO, Debora Souza de. “População prefere docentes a militares em escolas”. Disponível em: <https://www.cenpec.org.br/pesquisa/pesquisa-educacao-valores-e-direitos.> Acesso em: 14 de dezembro de 2024.

CARNEIRO, Suelaine; PORTELLA, Tânia. “Precisamos falar do PNE e dos Direitos Educativos da População Negra”. Disponível em: <https://www.geledes.org.br/precisamos-falar-do-pne-e-dos-direitos-educativos-da-populacao-negra/>. Acesso em: 14 de dezembro de 2024.

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GAITHER, M. “Why Homeschooling Happened”. Educational Horizons, v. 86, n. 4, 2008, pp. 226-237.

LEVY, Tal. “Homeschooling and Racism”. Journal Of Black Studies, [S.L.], v. 39, n. 6, p. 905-923, 26 nov de 2007.

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MIGUEL, Luis Felipe. Da “doutrinação marxista” à “ideologia de gênero”: Escola Sem Partido e as leis da mordaça no parlamento brasileiro. Revista Direito e Práxis, Rio de Janeiro, v. 7, n. 3, p. 590-621, set. 2016. Disponível em: <https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/revistaceaju/article/view/25163.>

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TELES, I.F.P.; FERREIRA, M.S.S.; BARBOSA, L.M.R. As nuances do processo de regulamentação da educação domiciliar no Brasil. Cadernos da Pedagogia, v. 16, n. 35, p. 40-53, maio-agosto/2022. Disponível em: <https://www.cadernosdapedagogia.ufscar.br/index.php/cp/article/view/1846/770.> Acesso em: 14 de dezembro de 2024.

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