Não tem preço

Por Fernanda Pompeu

Engraçado como existem pessoas que mesmo não sendo amigas marcam para o bem as nossas vidas. Pessoas com quem pouco falamos ou encontramos. Até interlocutores com quem trocamos palavras uma única vez e depois silêncio.

Uma tarde em Salvador fui entrevistar a Mãe Stella, ialorixá do terreiro de candomblé Ilê Axé Opô Afonjá. Passei menos de trinta minutos ao seu lado, mas uma frase dita por ela: “O que não se registra o vento carrega”, pontuou uma guinada na minha postura de jornalista.

Mãe Stella, com uma única frase, me fez compreender o valor de pôr no papel o melhor que a vida põe no mundo. Contribuir para que o vento não disperse fatos e não esqueça de pessoas que num determinado momento conseguiram fazer diferente, e valorizar a vida de outras pessoas, ou de um bairro, ou de uma comunidade.

Nunca mais conversei com Mãe Stella. Outra mulher com quem estive apenas em duas ocasiões se chama Procópia. Ela é uma das líderes do Quilombo Calunga de Monte Alegre, em Goiás. Ela contou que sua grande tristeza era não saber ler e escrever.

Por conta do analfabetismo, Procópia batalhou e conseguiu que a prefeitura de Monte Alegre construísse uma escola dentro do Quilombo. Agora suas netas leem livros para ela. Compreender o valor que essa mulher dava à educação e à leitura em particular, me fez revalorizar meu ofício de escritora.

No fundo acho que as pessoas – mesmo aquelas a quem chamamos estranhos e estranhas – sempre podem nos ensinar boas coisas o tempo todo. São pequenas e informais lições do dia a dia. Mais ainda, algumas pessoas têm o poder de iluminar aquilo que andamos fazendo.

Mas para que a gente perceba esse poder é preciso ser aluno em tempo integral. Quer dizer o quê? Manter os ouvidos bem abertos para escutar novas informações e os olhos generosos para ver além do nosso nariz. Caso contrário, vamos perdendo oportunidades de aprender.

Quando digo o outro, é o outro mesmo. Alguém fora da minha classe social, do meu círculo íntimo, do meu Facebook. Quando falo em ver além do nariz é enxergar além das visões conhecidas. É supor um horizonte depois do horizonte.

 

 

Fonte: Yahoo 

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