Quilombos no ES: Retrocesso com nome sobrenome

Manaira Medeiros

Os deputados estaduais Eustáquio de Freitas (PSB) e Atayde Armani (DEM) precisam ficar bem registrados na memória dos capixabas. Não pelo lado positivo, até mesmo porque seria difícil. Mas pela campanha que lideram há anos contra a titulação do território quilombola do norte do Estado, explorado ilegalmente pela Aracruz Celulose (Fibria). As investidas tentam impedir a já arrastada titulação das terras dos descendentes de escravos no Estado, com o único objetivo de defender os interesses de ruralistas. Nesta área, os deputados são de casa.

Sob argumentos inconsistentes e totalmente questionáveis os parlamentares fazem o que podem para anular o Decreto 4.887/03, que garante o direito de identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação de terras tradicionalmente quilombolas no País, pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Têm sido responsáveis, no Estado, pelo coro ao que defende a bancada ruralista no Congresso Nacional e as empresas transnacionais com interesses comerciais no território.

Freitas e Atayde arregaçaram as mangas primeiro em 2009, quando havia voltado aos centros dos debates o julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), da Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) ao decreto do ex-presidente Lula. Processo que tramita até hoje. Os dois promoveram audiências públicas – sem convite aos quilombolas – e protagonizaram uma série de pronunciamentos e críticas ao direito quilombola, desconhecendo não só a existência das comunidades tradicionais, mas também a luta iniciada há décadas pela recuperação das terras tomadas principalmente por extensas plantações de eucalipto e em menor porte por grandes fazendeiros e indústrias de cana e açúcar.

Por trás da campanha liderada por Freitas e Atayde e à época também pelo ex-deputado Paulo Roberto (PMN), está o Movimento Paz no Campo, que de paz só tem o nome. Na tentativa de impedir a implementação da lei que reconhece o território quilombola, integrantes do movimento já foram denunciados por violência, racismo, coação, perseguição e até ameaça de morte. Prática bem comum no norte do Estado, também pelas mãos da segurança armada da Aracruz Celulose.

Na legislatura passada, Freitas e Atayde chegaram a criar uma comissão para tratar especificadamente do assunto. Desta vez, levam o debate para a Comissão de Agricultura da Assembleia Legislativa, presidida pelo deputado demista e onde Freitas é membro efetivo. Reunião realizada recentemente deliberou pela elaboração de um documento a ser encaminhado ao STF, ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e ao Congresso Nacional.

As ações dos deputados estaduais seguem na contramão dos avanços registrados nos últimos anos, na direção de corrigir uma injustiça histórica. Desde 2003, data do decreto, o País conseguiu identificar mais de três mil áreas, inclusive no Espírito Santo, ocupadas anteriormente por grandes empresas. Mexeu nos interesses do capital, logo, incomodou.

Depois de décadas de luta, trabalhar para anular o decreto, não passa, portanto, de retrocesso. No Estado, com nome e sobrenome: Eustáquio de Freitas e Atayde Armani.

Guardem bem esses nomes.

Manaira Medeiros é jornalista e especialista em Educação e Gestão Ambiental

Fonte: Seculo Diário

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