Tudo se discute menos os meios de comunicação, é possível até, ainda que com muita dificuldade, se debater a socialização dos meios de produção, mas a propriedade dos meios de comunicação nunca foi alvo de uma crítica. Quando se fala em educação, cultura e ciência, se esquece que esse papel é muito mais permeado pelos meios de comunicação do que pela escola e, conceitualmente, ambos são meios de comunicação. A diferença é que a escola é um meio de comunicação com bem menos alcance que uma TV ou rádio, etc.
Isso se explica porque a gênese das teorias de crítica social ou simplesmente socialismos foram gestadas no século 19, aonde um jornal era quase tão acessível quanto um blog é hoje em dia, aonde um mimeógrafo assumia o papel de meio de comunicação que hoje teria um computador plugado à web. Assim, os meios de comunicação eram variados, de caráter ideológico-político e distribuídos por qualquer grupo de qualquer natureza que desejasse expressar suas ideias. O jornalismo impresso do século 19 se assemelhava mais a uma oficina pequeno-burguesa do que a uma indústrial do grande capital, como no século 20.
Foi apenas no século 20 que a mídia, agora não só a imprensa, mas o rádio e a TV, se tornaram “mídia de massa” ou “indústria cultural”. Tanto pela expansão da alfabetização, que só ocorreu mesmo no século 20, aumentando o universo de leitores, quanto pelas novas mídias que não exigiam a capacidade de ler. Isso ofereceu um grande mercado para essa “mercadoria”. Cada país passava a produzir seu “cidadão Kane”, criando impérios midiáticos. A dita “opinião pública” se tornava uma espécie de boiada da “opinião privada” dos meios de comunicação.
Apesar de se tornar em sua fase industrial algo comercial e se afastar de sua função puramente ideológica, pois o jornalismo clássico não era profissional, seus escritores não viviam em geral exclusivamente do jornalismo. Seu papel ideológico saia das cabeças de seus jornalistas, para as relações em que eles estavam submetidos – o grande capital dos meios de comunicação não podia ser outra coisa do que uma bandeira do grande capital em geral. Todo o século 20 vivemos uma demonstração dessa dominação, chegando ao seu cúmulo nas experiências nazifascistas que se aproveitaram dos meios de comunicação de massa com sua política extensiva de propaganda e lavagem cerebral – algo que a publicidade comercial de hoje não tem nenhum escrúpulo em herdar. Toda resistência a essa dominação se deu através de um jornalismo marginal, tecnicamente inferior, mas que servia como um sopro de resistência. Como foi no Brasil o Pasquim.
Atualmente, a internet já colocou nos EUA os meios de comunicação em crise comercial. Ao migrarem para a internet e disponibilizarem gratuitamente seus conteúdos, buscavam conquistar em publicidade o que perdiam em vendas. Mas a dependência financeira crescente de publicidade, em detrimento à venda a seus leitores, prostituiu as redações que chegavam a fazer propaganda em matérias noticiosas. Em suma, a perda de dinheiro provocava ações que geravam perda de credibilidade, que por sua vez fazia perder mais “audiência”. Foi assim que se estalara a crise atual nos EUA.
Por outro lado, a internet surgia como um meio virtualmente democrático que permitia a todos a produção de comunicação em um meio de comunicação internacional a um custo zero. Com telefones com acesso à internet, a generalização dos computadores, o barateamento dos serviços de conexão, o campo da web se expande, ao mesmo tempo que sites e blogs surgem denunciando as manipulações da mídia tradicional, cada vez mais corrompida e decadente. A mídia alternativa na internet, que remetem ao jornalismo alternativo de antes, não tem nenhum limitação sobre as condições de circulação, pois a internet torna a circulação totalmente acessível a qualquer publicação nela. A atual mídia alternativa, ainda que em parte ainda reproduza essa hegemonia, ganha cada vez mais espaço com a sua função crítica.
O jornalismo colaborativo, de que faz parte o BrasilWiki, é uma plataforma em que organiza isso, oferece a essa nova mobilização um suporte mais direcionado ao jornalismo. Minha esperança é que nós façamos enquanto contra-informação, o que a contra-cultura fez revolucionando os costumes. Nossa revolução é desconstruir a desinformação organizada em conglomerados midiáticos umbilicalmente ligados a interesses políticos. Basta lembrarmos o envolvimento das organizações Globo com a ditadura militar, sua manipulação no último debate de Lula e Collor em 89, e a tentativa de golpe eleitoral contra Brizola na fraude do Proconsult.
Na política, a mídia é tão letal quanto tropas armadas: o primeiro movimento dos golpistas de Chavez, que logo depois cairam, foi fechar a TV estatal. Toda grande mídia brasileira, que hoje criticam o “autoritarismo” de Chavez, faziam proclamações gritantes em favor do golpe de 1964. Por isso, não é exagero afirmar que o jornalismo colaborativo pode ser parte fundamental de uma profunda emancipação política que está ocorrendo sob nossos olhos com a ampliação da centro-esquerda na América Latina. Ela ao mesmo tempo demonstra o limite e a solução para como a luta de classes está se desenvolvendo… mídia tradicional versus internet, informação versus contra-informação.
O jornalismo colaborativo ainda tem a função de contra-informação, ainda que haja uma parte que reverbera a mídia tradicional, e que tende a sumir. Mas seu futuro é oferecer uma plataforma de formação de notícias, porque não precisará mais combater a mídia tradicional que será pulverizada com a crise comercial que está submetida em razão da hegemonização da internet. Esse jornalismo deverá assumir o espaço deixado pela mídia decadente…
Fonte: BrasilWiki!