André Rebouças

FONTEPesquisa: Carlos Eugênio Marcondes de Moura
(Foto: Paulo Scheuenstuhl / Museu Histórico Nacional)

André Rebouças descendeu do alfaiate português Gaspar Pereira Rebouças que, em fins do século XVIII, chegou a Salvador e casou-se com a negra Rita Basília dos Santos, provavelmente uma escrava alforriada. Dessa união nasceram nove filhos, dos quais tenho notícias dos quatro homens. José, o mais velho, obteve o título de mestre em Harmonia pelo Conservatório de música de Bolonha e, quando retornou da Europa, assumiu o posto de Maestro da Orquestra do Teatro de Salvador. Manuel tornou-se funcionário da administração da justiça em Salvador. Maurício trabalhou em cartórios e acumulou recursos para estudar em Paris, bacharelando-se em Artes e Ciências e doutorando-se em Medicina. Em 1832, tornou-se catedrático de Botânica e Zoologia na Escola de Medicina da Bahia[1].

Antônio, pai de André, não se dedicou ao estudo superior por opção e também pelo fato de não existir faculdade de Direito em Salvador. Transferiu sua residência para Cachoeira, no recôncavo, em 1822, no auge da luta contra a resistência portuguesa. Ali ajudou na organização da Junta Interina Conciliatória e de Defesa que se constituiu numa força de resistência ao domínio das Cortes Portuguesas em Salvador.

Em 1823, quando D. Pedro I passou pela Bahia, foi condecorado com o título de Cavaleiro Imperial da Ordem do Cruzeiro. Em 1824 foi designado secretário de governo da Província de Sergipe e depois, eleito deputado, para a sessão de 1843, à Assembléia Geral do Governo pelo Partido Conservador e Conselheiro Geral da Província[2]. Após anos de trabalho como rábula, conquistou o direito de advogar por determinação imperial em 4 de setembro de 1847. Definia-se como representante da população mulata brasileira, e em sua vida parlamentar pregou a inserção deste grupo no conselho da Coroa, visto que, da mesma forma que nas Cortes portuguesas houvera distinção entre os naturais de Portugal e os do Brasil, era conveniente ao país conhecer a opinião de todos os brasileiros, objetivando assegurar a unidade nacional e a defesa da monarquia constitucional[3].

Casou-se nesse período com Carolina Pinto da Silveira, filha do comerciante André Pinto da Silveira. André Pinto Rebouças foi o primogênito dessa união, nascendo na cidade de Cachoeira a 13 de janeiro de 1838, em plena luta da Sabinada.

Em fevereiro de 1846, a família de Antonio Rebouças transferiu-se para o Rio de Janeiro. No Rio de Janeiro, André e seu irmão Antonio, nascido um ano após ele, estudaram português, caligrafia e matemática elementar no colégio de Camilo Tertuliano Valdetaro. Em 1849, fizeram os estudos complementares no colégio Curiacio e em 1855 sentaram praça como voluntários no 1º Batalhão de Artilharia a pé.

Matricularam-se em 1859 na Escola Militar de Aplicação, depois Escola Central, Politécnica e atual Faculdade de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Em 1860, encaminharam requisição para estudar na Europa. Aprovada, partiram em fevereiro de 1861, com licença para dois anos de teoria e prática em engenharia civil, com os mesmos vencimentos que teriam se continuassem estudando na Escola Central. Visitaram, nessa viagem, instituições de ensino, obras, fábricas, arsenais e portos na França e Inglaterra. Retornaram ao Rio de Janeiro em novembro de 1862, dando início a suas publicações de cunho técnico.

André esteve vinculado à carreira militar até 1866. Em 1863, conforme seu Diário, obteve sua primeira nomeação para examinar as fortalezas desde Santos até Santa Catarina. Engenheiro militar com a patente de tenente, mesmo quando não designado para obras específicas recebia pequenos soldos mensais. Durante esse ano dirigiu, com seu irmão Antonio, obras nas fortalezas de Cananéia, Paranaguá e Santa Cruz. Alistou-se como voluntário na guerra entre a Tríplice Aliança e o Paraguai.

Quando retornou, em 1866, por motivo de doença, pediu sua exoneração do Exército e conseguiu, em outubro, sua nomeação pelo Conselheiro Zacarias para a direção das obras da Alfândega do Rio de Janeiro no lugar do engenheiro inglês Charles Neate. Ao mesmo tempo em que dirigia essas obras, iniciava suas atividades como empresário, ensinava latim, francês e inglês ao seu irmão Juca, dava aulas no Instituto Aquino e na Escola Central, procurava apoio financeiro para que Carlos Gomes retornasse à Itália, batia-se junto a ministros e políticos por diversas leis e companhias como a lei geral para doca e companhia da Alfândega do Rio de Janeiro, lei geral sobre Caminhos de Ferro, Cia das Docas do Maranhão, Cabedelo, Recife, Bahia, entre outras, conseguindo criar as empresas: Cia das Docas da Alfândega do Rio de Janeiro, Cia das Docas de D. Pedro II (RJ) e Cia Florestal Paranaense. Essas companhias eram fundadas com capital privado, nacional e estrangeiro, por um número de acionistas com uma garantia de juros de 5% ao ano sobre o capital aplicado. Além da concessão para o estabelecimento da companhia, o governo tinha que aprovar a sua utilização. A Cia das Docas de D. Pedro II teve enormes prejuízos com a negativa do embarque de café por seu porto.

Foi secretário do Instituto Politécnico e redator geral de sua Revista. Este instituto durou mais de sessenta anos e foi uma espécie de predecessor da Academia Brasileira de Ciências. Dedicava-se a divulgar as conquistas da ciência em diversos terrenos. Atuou como membro do Clube de Engenharia através do qual foi muitas vezes designado para receber engenheiros estrangeiros em suas visitas ao Brasil, tanto por seus conhecimentos técnicos como por sua facilidade em falar inglês e francês. Participou da Associação Brasileira de Aclimação e defendeu a adaptação de produtos agrícolas não produzidos no Brasil, como o trigo, e o melhor preparo e acondicionamento dos produzidos aqui, para melhor concorrerem no mercado internacional. Foi responsável ainda pela seção de Maquinas e Aparelhos na Sociedade Auxiliadora da Indústria Nacional (SAIN).[4]

Ajudou a criar a Sociedade Brasileira Contra a Escravidão, ao lado de Joaquim Nabuco, José do Patrocínio e outros, da qual foi eleito tesoureiro. Participou também da Confederação Abolicionista e redigiu os estatutos da Associação Central Emancipadora, o que me permite constatar o trânsito de Rebouças nas diversas tendências abolicionistas. Publicou diversos artigos em jornais contra a escravidão, inserindo sua defesa na conciliação entre as classes e buscando convencer os senhores da maior produtividade do trabalho assalariado e da injustiça para com o negro, nos moldes advogados por Joaquim Nabuco.

Participou da Sociedade Central de Imigração, juntamente com o Visconde de Taunay. Esse grupo preconizava a vinda de europeus como colonos, divulgando a importância desse elemento na composição racial do povo brasileiro, nos moldes do evolucionismo social e combatendo a imigração de chineses, considerados por eles degenerados e incivilizáveis.

Monarquista convicto, Rebouças seguiu para o exílio com D. Pedro II. No exílio, passou um tempo em Lisboa, foi a Marselha visitar o Imperador, percorreu alguns países da Europa, e seguiu para a África. Ali morou em Lourenço Marques, em Barbeton, e em Funchal, na Ilha da Madeira, onde permaneceu até o suicídio em maio de 1898.

NOTAS:

1 SPITZER, Leo. Assimilação, Marginalidade, Identidade: Os dois Mundos de André Rebouças, Cornelius May e Stephan Zweig. ESTUDOS AFRO-ASIÁTICOS. Rio de Janeiro: Fundação Cândido Mendes, 1980, (3) p. 42.

2 CARVALHO, Maria Alice Rezende de. O Quinto Século.André Rebouças e a Construção do Brasil. Tese, IUPRJ, mim, 1997, p. 53-54.

3 REBOUÇAS, Antonio Pereira. Recordações da Vida Parlamentar. In: NABUCO, Joaquim. Um Estadista do Império. Nabuco de Araujo. Tomo I, p. 39-40.

4 SANTOS, Sydney M. G. dos Santos. André Rebouças e seu tempo. Rio de Janeiro: Ed. do Autor, 1985, p. 263.

5 NABUCO, Joaquim. O Abolicionismo. Petrópolis: Vozes, 1977, p. 71.

Pesquisa e seleção de imagens: Carlos Eugênio Marcondes de Moura

 

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