Já faz algum tempo que venho trabalhando com a noção de modernidade negra para explicar o processo de construção de diferentes identidades raciais dos negros e mulatos brasileiros e americanos. Mas só se pode falar de modernidade negra no plural,pois ela varia de acordo com as diferentes formações nacionais. Isso significa, em termos concretos, que a história de cada estado-nação do Ocidente ou de origem ocidental (fruto da colonização européia) é, ao mesmo tempo, uma história particular da modernidade negra.
No entanto, para explicar estas diversas formações podemos recorrer a um conjunto fixo de condicionantes históricos, que funcionam como se fossem variáveis independentes. Além dos fatores demográficos, econômicos, sociais ou políticos, pode-se destacar uma ordem particular de condições, mais propriamente ideológicos ou intelectuais, que são as tradições e constelações de idéias. Tradições essas tão intimamente interconectadas por influências recíprocas que apenas podemos agrupá-las pelas grandes línguas de expressão colonial: o português, o espanhol, o inglês e o francês.
Podemos assim, identificar três grandes zonas de pensamento, a ibero-afro-americana, a anglo-afro-americana e a franco-afro-americana, que funcionaram como verdadeiros
“arquivos” de onde foram sacadas idéias para forjar identidades raciais e ideologias de integração na modernidade ocidental. Eu diria que os intelectuais negros circularam entre essas três zonas.
*Departamento de Sociologia da USP