Durban – O Brasil tem o que dizer, 10 anos depois

A III Conferência Mundial contra o Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e as Formas Conexas de Intolerância, ocorrida em Durban, África do Sul, de 31 de agosto a 9 de setembro de 2001, completa 10 anos. Mas as questões que demandaram sua realização ainda requerem a ação dos Estados para serem superadas.

Ministra Luiza Bairros 

A III Conferência Mundial contra o Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e as Formas Conexas de Intolerância, ocorrida em Durban, África do Sul, de 31 de agosto a 9 de setembro de 2001, completa 10 anos. Mas as questões que demandaram sua realização ainda requerem a ação dos Estados para serem superadas.

O recrudescimento das intolerâncias em várias partes do mundo deveria atrair a atenção para a Reunião de Alto Nível comemorativa do 10º aniversário da Declaração e Programa de Ação (D&PA) de Durban, que a ONU realiza neste 22 de setembro. Além das reportagens especiais para rememorar a tragédia do 11 de setembro, espera-se que a mídia avalie o que tem sido feito para eliminar o racismo e a discriminação racial.

Deve ser sempre lembrado que a participação brasileira na preparação da Conferência contra o Racismo foi um marco na mobilização das organizações negras. A riqueza das avaliações desencadeadas em todo o país beneficiou-se largamente do esforço das três décadas anteriores.

Da luta que tornara possíveis os avanços da Constituição, passando pelos protestos no centenário da Abolição, em 1988, e a Marcha Zumbi dos Palmares, em Brasília, em 1995, os movimentos negros lograram incluir a superação das desigualdades raciais na agenda política do país.

Em 2001, uma geração de ativistas alcançava a maturidade decorrente do empenho contínuo por cidadania plena e pela visibilização do racismo. As urgências de nossa situação interna motivaram a participação do Brasil naquela conferência, e asseguraram, na volta da África do Sul, os diálogos que, mais tarde, desembocaram nas políticas de ação afirmativa.

A ideia de um movimento negro “engolido” pelo Estado após esse processo seria, portanto, simplificadora de algo mais complexo, posto que não dá conta das múltiplas dimensões envolvidas nessa história recente e que a conferência inequivocamente aprofundou. A partir dela, os membros das Nações Unidas comprometeram-se a fazer do combate ao racismo responsabilidade primária do Estado.

Dez anos se passaram. Diferentemente de muitos países que ainda tentam boicotar a D&PA de Durban, as organizações da sociedade civil e o governo do Brasil terão o que dizer na Reunião de Alto Nível.

Vale destacar que o racismo é crime desde o texto constitucional de 1988. Ademais, o Estatuto da Igualdade Racial, aprovado no ano passado, orientou o Plano Plurianual 2012-2015, que inclui o enfrentamento ao racismo como um de seus programas mais inovadores. O que se faz agora é uma ampla pactuação ministerial para aprofundar a implementação do Estatuto e regulamentar o Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial (Sinapir), de modo a integrar as ações nas esferas federal, estadual e municipal.

No momento, é necessário assegurar práticas educativas que possam abarcar tanto a escola como os meios de comunicação. Desde a creche, cujo acesso a presidente Dilma Rousseff quer universalizar, urge disseminar valores do pluralismo, alargando a noção do humano entre nós. Isso equivale a reverter representações desumanizadoras que atravessam nossa cultura desde o período colonial e estão na base das desvantagens sociais de negros e indígenas.

O autor de recente chacina na Noruega, Anders Breivik, afirmou a impossibilidade de progresso no Brasil dada a composição étnico-racial da população. Velhas ideias de superioridade racial que encontram novos adeptos, aqui e no exterior. Por essa visão, os obstáculos ao desenvolvimento residiriam no interior das pessoas, em sua presumida inferioridade e não em razões objetivas e externas a elas.

Por isso, há quem acredite que os espaços abertos pelo crescimento da economia brasileira não deveriam ser ocupados por “canavieiros, donas de casa e sacoleiros”. A sugestão recorrente seria a substituição do trabalhador brasileiro, tido como desqualificado, pela mão de obra “altamente especializada”. E, se não há tempo suficiente, ou a educação nada pode fazer nesses casos, os trabalhadores ideais só poderiam ser buscados em outros países.

Essa visão, contrária ao rumo buscado pelas iniciativas de erradicação da pobreza extrema e de expansão do acesso à educação técnica e superior, opõe-se também à declaração e ao programa de ação de Durban, que reforçam o direito de todos de participar, sem discriminação, da vida social e política do seu país.

Luiza Bairros é ministra da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República e conselheira do CDES.

Publicado no Correio Braziliense

Fonte: CDES

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