“Geledés é uma instituição da sociedade civil que há mais de 30 anos vem trabalhando contra todas as formas de discriminação e racismo presentes na nossa sociedade. Trabalhamos dentro da pauta climática para que as mulheres e meninas afrodescendentes sejam reconhecidas dentro dos documentos”. Com essa afirmação, Ester Sena, representante de Geledés – Instituto da Mulher Negra, colocou no centro das discussões do evento “Desenhando o Futuro: Mulheres, Clima e Justiça”, realizado nesta quarta-feira, 19, durante a COP30, em Belém, a necessidade de se aprofundar o debate sobre justiça climática relacionada à raça e gênero.
“Falamos de impactos sobre essas mulheres, porque são elas que têm esse protagonismo do cuidar. Quando sofrem esses impactos, nós, mulheres afrodescendentes, precisamos nos cuidar, cuidar de nossas famílias, de nossas comunidades, de nossos territórios.”
A mesa reuniu a ministra das Mulheres, Márcia Lopes; a empresária Luiza Trajano; a representante da ONU Mulheres no Brasil, Ana Carolina Querino; a Alta Representante para Temas de Gênero do Ministério das Relações Exteriores, a embaixadora Vanessa Dolce de Faria; a ministra do TSE Edilene Lobo; além da própria Ester Sena, de Geledés.
Ao lembrar a trajetória de Geledés que atua na agenda climática desde a ECO-92, Ester apresentou a reedição do livro “Há um Buraco Negro entre a Vida e a Morte“. “É um documento desenvolvido por uma das nossas diretoras de Geledés, Nilza Iraci, junto a Arnaldo Xavier. Esse livro traz as perspectivas das mulheres afrodescendentes durante a ECO-92. Nós reeditamos esse livro para apresentá-lo, para mostrar que o movimento negro no Brasil não é de agora, que está dentro desses espaços sobre a luta climática do movimento negro, não só do Brasil, como da América Latina e do Sul Global”.
A assessora de Clima e Juventude do instituto detalhou também um estudo recém-lançado por Geledés em parceria com a Fundação Getúlio Vargas (FGV). “Desenvolvemos também um estudo junto à FGV, com a equipe do professor Thiago Amparo, sobre o reconhecimento da população afrodescendente dentro dos espaços multilaterais. Nesse estudo, temos o mapeamento das desigualdades e observamos como a pauta racial está sendo empregada nas mais diversas instâncias, no mesmo sistema da UNFCCC, como da ONU, G20 e tantos outros espaços”.
O levantamento aponta sobre como a invisibilização persiste. “Um dado que gostaria de trazer, que identificamos, é que dentro dos mais de 115 documentos analisados, apenas 23% deles falam de fato sobre os impactos que as mulheres afrodescendentes estão sofrendo em todos os âmbitos. Então apenas 23% deles mencionam as pautas racializadas. Isso demonstra que temos que continuar atuando e continuar trabalhando. Porque não basta ter um evento e falarmos sobre as mulheres porque, em uma sala de negociações, elas não estão sendo reconhecidas”.
Para Ester, o desafio imposto às negociações climáticas é também um acerto de contas com a história. “Reconhecer que as mulheres afrodescendentes sofrem mais do que outros grupos é uma reavaliação histórica, é reconhecer todo o racismo e sexismo de nossa sociedade”.