Janine lamenta o fim do Ciência sem Fronteiras

“Lamento a decisão de fechá-lo, se isso for verdade. Mas se eu fosse ministro não o reabriria antes de completar a construção de creches”, diz Renato Janine Ribeiro, que foi ministro da Educação da presidente Dilma Rousseff

Por Renato Janine Ribeiro, em seu Facebook

No Brasil 247

Foto: Elza Fiuza/Agência Brasil

Ciências sem Fronteiras. Se é verdade que o MEC cortou o programa para colocar o dinheiro na merenda escolar, está correto. Repito: está correto. Não há verba para tudo o que desejariamos. Vivi inúmeras escolhas de Sofia. Uma delas foi esta.A última leva de alunos do CsF – 5500 bolsistas – recebeu a carta de concessão antes de eu me tornar ministro. Vivemos a dúvida: mandamos os alunos ou não? Legalmente, o contrato previa a hipótese de não mandar, mesmo com carta de concessão, se não houvesse dinheiro. A Fazenda pressionou fortemente nesta direção. Mas nós mesmos do MEC pensávamos, é justo pagar 100 mil dólares por aluno quando com isso poderíamos fazer creches, que eram então uma prioridade? Lutamos com a Fazenda, lutamos no Planalto, e conseguimos o dinheiro para mandar.

Conseguimos em termos, porque acabamos perdendo 10 a 15 bi do orçamento do MEC em 2015, devido à crise, e conforme a conta que fizermos isso pode incluir o CsF.
O ponto que quero discutir é outro: se o CsF foi inútil ou não deu resultados.

Foi uma decisão da presidente Dilma, no seu primeiro mandato. Mudava a política vigente. Até então, só a Capes dava bolsas integrais de doutorado no exterior, ninguém as dava de mestrado e menos ainda para graduação. A ideia era que tínhamos já cursos de mestrado e doutorado bons o bastante para só precisarmos mandar para fora estudantes de sanduíche de doutorado (um ano no meio da formação) e de pós-doutorado.

Dilma entendeu que era importante internacionalizar nossos alunos de engenharia e outras áreas de impacto direto na produção econômica. Objetivo: melhorar nossa economia, aumentar rendimentos, crescer produtividade, dar sustentação à inclusão social. Por isso, claro, embora ela adore balé, não daria bolsas de balé, porque não injetam glicose na veia da economia. Simples assim.
Os alunos foram. A Capes e o CNPq tiveram que se virar nos trinta para mandar em poucos anos cem mil alunos. Ouvi uma quantidade enorme de elogios aos resultados, inclsive das melhores universidades do mundo.

Mas houve problemas. Por isso, quando não tivemos dinheiro para mandar novos alunos (além dos cem mil que já tinham ido, arredondando o número), a ideia foi rever o programa. Carlos Nobre, presidente da Capes à época, debruçou-se sobre isso.

Um dos problemas foi o fato de não haver um monitoramento constante dos alunos. Muitos ficaram soltos demais. Os acidentes e incidentes reportados com alunos do CsF se davam, recebi esta informação, quando eles estavam fora de onde deviam estar. Tipo sua bolsa é para Heidelberg e vc está em Paris. Também houve a maldade do “turismo sem fronteiras”. Maior acompanhamento resolveria isso. Era solucionável.

Ao fim e ao cabo, numa empreitada de risco como é tudo o que envolve ciência, os resultados foram positivos, segundo me foi relatado. Mas 1) não havia dinheiro para continuar, era preciso suspender o programa – o que fizemos; 2) era o caso de rever seus padrões, o que exigiria um estudo aprofundado, de modo que quando ele fosse recriado, tivesse novas bases.

Resumo? Suspendemos, não fechamos. Ainda não há dinheiro, não haveria como reabri-lo. Lamento a decisão de fechá-lo, se isso for verdade. Mas se eu fosse ministro não o reabriria antes de completar a construção de creches.

Finalmente: não se pode pensar o CsF em torno só do fato de que deu chance a pobres de estudar fora. Não, ele não era um programa de inclusão social neste nível tão elementar. Era para bons e ótimos alunos, ricos ou pobres. Neste sentido, sim, mandou pobres para fora. Mas não era um programa social. Era um programa para fortalecer a economia brasileira e a parte que a Ciência e a Tecnologia nela desempenham. Isso é muito bom, mas claro que depende de dinheiro e de qualidade.
Se for preciso desenhar, desenho. Aumentando a produtividade econômica, um governo popular aumenta a riqueza e a remuneração no País. Ou seja, aí sim tem um impacto popular. Mas o impacto se dá no efeito, não na seleção dos candidatos.

Resumo final: deveriam rever o programa, mesmo que demorassem a relançá-lo. A experiência de mandar alunos de engenharia para o exterior, durante a graduação, existe há anos na USP e em outros lugares. No caso, para a França. Conheci o prof. Vahan Agopyan justamente fazendo isso: escolhendo alunos da Poli, da USP, que iam estudar um ano de engenharia na França. Outra hora conto, ou se ele quiser ele conta, como eles aprendiam engenharia de pontes. Água na boca.
(Não revisei porque estou saindo para Coimbra).

+ sobre o tema

O racismo como polêmica escolar

ERICA BARBOSA BAIA FERNANDA MARQUES DE ALMEIDAROSIANE MACHADO...

MEC cria ‘Enem’ para professores

Primeira prova deverá ser realizada em 2011. Participação de...

Núcleo da UNEB oferece curso sobre história e culturas africanas e afro-brasileira

O Núcleo de Estudos Africanos e Afro-brasileiros em...

Estudantes negros são menos de 10% nas universidades federais

Em 2003, pesquisa mostrava que taxa não chegava a...

para lembrar

Fuvest 2011 tem mais inscritos do que ano anterior

Ao todo, 132.969 pessoas se candidataram às 10.752 vagas...

ENEM: OAB orienta candidatos do Enem a procurar MP e não descarta pedir anulação

Os candidatos inscritos no Exame Nacional do Ensino Médio...

Faltam professores qualificados no ensino médio

Por: Cinthia Rodrigues Docentes desta etapa lidam com várias...
spot_imgspot_img

Estudo mostra que escolas com mais alunos negros têm piores estruturas

As escolas públicas de educação básica com alunos majoritariamente negros têm piores infraestruturas de ensino comparadas a unidades educacionais com maioria de estudantes brancos....

Educação antirracista é fundamental

A inclusão da história e da cultura afro-brasileira nos currículos das escolas públicas e privadas do país é obrigatória (Lei 10.639) há 21 anos. Uma...

Faculdade de Educação da UFRJ tem primeira mulher negra como diretora

Neste ano, a Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) tem a primeira mulher negra como diretora. A professora Ana...
-+=