Leci Brandão sobre eleições de 2022: ‘Não faço política, cumpro missão’

A deputada estadual pelo PCdoB-SP, atualmente no 3º mandato, cantora e compositora com 46 anos de carreira, concede uma entrevista à Marie Claire sobre suas expectativas acerca de um 4º termo na política, o intenso embate anunciado na próxima disputa, intolerância religiosa no parlamento e compromisso com o povo

Quando foi eleita deputada estadual pelo PCdoB-SP – a segunda mulher negra a ocupar o cargo -, Leci Brandão reuniu todos os discos gravados desde 1974 para ver o que tinha cantado até então. “Peguei aquilo e pensei: ‘Essa vai ser a minha plataforma de mandato, voltada às questões sociais’”, relembra à Marie Claire. “Graças a Deus estamos no terceiro, vamos ver se ele permite a caminhada.”

A deputada não confirma a candidatura nas eleições de 2022: “Sei que meu partido só tem a mim como representante, mas temos também a questão da federação que ainda não resolveu.” Porém, sustenta na fé e no desejo popular a possibilidade de dar continuidade ao compromisso iniciado em 2010, quando venceu a primeira disputa.

“Posso assegurar que esta eleição vai ser dificílima, porque o embate é muito sério; não será tranquila. As pessoas vão lançar mão de qualquer coisa para chegar lá, mas vamos continuar com o que começamos”, conta.

Leci Brandão diz que seus mandatos sempre foram voltados às questões sociais, com a missão de construir projetos de lei compromissados com a demanda do povo. “Eu sou popular e é um mandato que segue esta linha.”

Atualmente, a deputada estadual com mais de 40 leis aprovadas tem em trâmite, desde setembro passado, o PL 509, que prevê a criação de um percentual de vagas de estágio de nível superior, nos órgãos e entidades de administração pública em São Paulo, para pessoas negras e pardas, com deficiência, travestis e transexuais.

“Temos muita dificuldade em aprovar e dar continuidade a esses assuntos, mas não desistimos. Podemos apresentar em um segundo momento e já temos essa prerrogativa: caso não passe agora, aproveitamos um novo mandato e damos sequência”, explica. Atualmente, o Projeto de Lei está na Comissão de Constituição, Justiça e Redação.

Caminho de fé

As falas da deputada são ancoradas na fé. As religiões de matriz africana, uma importante parte de sua vida, frequentemente são atacadas no parlamento, pontua. “Existem bancadas de outras religiões que não gostam, mas a minha preocupação não é com isso, e sim com a minha sinceridade e caráter. É isso que eu quero que o povo enxergue e é ele que me anima em dar continuidade.”

Leci destaca que em uma Assembleia com 96 deputados, é possível contar “em uma mão” quem defende determinadas pautas. “Preto, pobre, mulher, candomblé, umbanda e LGBTQIA P+: quem é conservador, não gosta. O país é definido pelo conservadorismo.”

Entretanto, nos últimos anos, a deputada estadual construiu um espaço de resistência na ALESP com seu gabinete, o Quilombo da Diversidade. O nome, como explica, vem da presença de pessoas “de todas as caminhadas.”

“Não faço política, cumpro missão”

A parlamentar é conhecida por sua defesa de ideias progressistas e, segundo a própria, não é adepta ao partidarismo. “Dialogo com parlamentares, não toco muito a questão das siglas, mas das ideias. Eu tenho por hábito votar favoravelmente quando tem qualquer processo que seja comprometido com o povo”, revela.

“Hoje tem isso de partido ‘X’, ‘Y’; mas comigo, não. Fiz grandes amizades dentro da Assembleia, a maior da América Latina”, afirma Leci Brandão, que se descreve como uma pessoa simples, que respeita todos e não tem discurso ‘politiquês’. “Eu defendo os meus, não ataco ninguém. É dessa forma que caminho”, diz. “Não faço política, cumpro missão.”

Com a proximidade das eleições, a deputada destaca que a ideia de ingressar na política não partiu dela, mas de um convite – com o qual relutou inicialmente. “Mas os movimentos Negro e Feminista disseram que eu tinha que ir, que eu já fazia política com a arte, que sempre discuti problemas das pessoas e fui punida por defender a democracia e as minorias”, diz sobre a marca que lhe acompanha nos 46 anos de carreira.

Antes de transformar sua realidade – ou de dar continuidade ao que começou na música -, voltou-se à fé. “Fiz minha consulta espiritual e a resposta que recebi é que eu tinha que aceitar o desafio, que era importante para mim ter maiores condições de defender aquilo que sempre cantei.”

Por fim, sobre a disputa eleitoral deste ano, a deputada estadual espera que os eleitores analisem as propostas de quem está, ou quer entrar, no poder. “É só fazer uma observação do que é feito e você chega em suas conclusões, sem agredir e sem ódio”, afirma. Amiga de muitos parlamentares, independentemente de partido, Leci Brandão conclui: “Não é por aí. O Brasil não pode permitir que essas coisas aconteçam.”

+ sobre o tema

De mucama a doméstica, um belo relato da mulher negra contemporânea

Acompanhei recentemente uma reportagem que dizia que a cada...

Sesc Consolação recebe Famílias Negras

Maio é o mês das mães e o Garota...

para lembrar

Renata Varella: A dona do clube que reconstrói a autoestima de mulheres negras

Ela criou o 'Clube das Pretas' para cuidar dos...

Conceição Evaristo no Sinpro-Rio: “nasci rodeada de palavras”

O auditório do Sinpro-Rio ficou lotado na sexta-feira, 13...

Mãe sempre sabe?

Mãe sempre sabe?

Tráfico de mulheres na Europa movimenta 2,5 bilhões de euros

Segundo a ONU, há cerca de 140 mil mulheres...
spot_imgspot_img

Esperança Garcia: quem foi a escravizada considerada a 1ª advogada do Brasil

Acredita-se que Esperança Garcia, uma escravizada que vivia em fazenda localizada a 300 quilômetros de onde hoje é Teresina, no Piauí, tivesse apenas 19 anos quando escreveu...

Prêmio Faz Diferença 2024: Sueli Carneiro vence na categoria Diversidade

Uma das maiores intelectuais da História do país, a escritora, filósofa e doutora em educação Sueli Carneiro é a vencedora na categoria Diversidade do...

Feira em Porto Alegre (RS) valoriza trabalho de mulheres negras na Economia Popular Solidária

A Praça XV de Novembro, no centro de Porto Alegre (RS), será palco de uma importante mobilização entre os dias 7 e 9 de...
-+=
Geledés Instituto da Mulher Negra
Privacy Overview

This website uses cookies so that we can provide you with the best user experience possible. Cookie information is stored in your browser and performs functions such as recognising you when you return to our website and helping our team to understand which sections of the website you find most interesting and useful.