Os 34 anos do PT e os dilemas da luta anti-racista – Por: Dennis de Oliveira

O Partido dos Trabalhadores (PT) faz 34 anos. A sua fundação, em 1980, foi um marco naquele momento histórico em que novos sujeitos sociais começam a ocupar a arena política anunciando o fim do regime militar. Foi a confluência de lideranças de movimentos sociais, de intelectuais progressistas, de novas lideranças do movimento sindical que rompiam com o peleguismo dos interventores sindicais e da Igreja Católica progressista. Tentou dar uma cara mais progressista a transição democrática que, naquele momento, ainda foi hegemonizada pelos setores conservadores.

A luta anti-racista ganhou espaços no campo da institucionalidade com a presença de vários militantes do movimento negro no PT, com vários deles se elegendo parlamentares. O PT foi o partido que elegeu as duas primeiras mulheres negras ao Senado, Benedita da Silva e Marina Silva. Construiu espaços institucionais para se pensar políticas de combate ao racismo nas prefeituras que venceu no final dos anos 1980.

O PT constituiu-se numa alternativa social-democrata radical buscando, por meio da pressão dos movimentos sociais, alterar as configurações da Sociedade Civil e interferir cada vez mais na Sociedade Política. O grande momento foi a eleição presidencial de 1989 em que o país se viu ante o embate entre enveredar-se de vez na política neoliberal ou romper por meio de um projeto democrático-popular. Houve um erro de avaliação política naquele momento, desprezando o tamanho das forças conservadoras que não tiveram pudores de usar os mecanismos mais sujos para ganhar a eleição, como a armação do sequestro do Abilio Diniz e a manipulação grosseira da Globo do último debate presidencial.

A derrota arrefeceu os ânimos da esquerda – sob intensa pressão ideológica mundial devido a queda dos regimes do Leste Europeu – e o PT começou, paulatinamente, a fazer uma inflexão programático-ideológica, reduzindo o grau de radicalidade da sua proposta social-democrata. As derrotas de 1994 e 1998 fortaleceram esta andança e a vitória em 2002, em boa parte motivada pela crise e desgaste do projeto neoliberal tocado pelos tucanos – que também, em função do seu projeto de poder, caminharam para a direita – consolidou esta tendência ao centro.

Os conceitos de luta de classes e o protagonismo dos movimentos sociais, presentes no discurso petista, vai cedendo a idéias mais amorfas como “cidadania”, “pobres”, “inclusão social”. As vitórias petistas nas eleições presidenciais e o crescimento do partido, que passa a ter mais governadores, prefeitos, parlamentares transformando-se no maior partido político brasileiro aumentou a presença de pessoas oriundas da burocracia da máquina administrativa. Assim, ganha também força a ideia de “eficiência na gestão”, “governabilidade”, “base aliada”, “políticas públicas eficientes”.

Intelectuais que contribuíram para análises profundas e críticas da sociedade brasileira passam a ser mobilizados para a elaboração e gestão de políticas públicas. Há uma pressão evidente para que os movimentos sociais se transformem em correias de transmissão do projeto partidário. E a grande massa de novos incluídos praticamente está fora dos movimentos sociais tradicionais e estabelecem uma relação pragmática e não ideológica de apoio ao partido.

Por isto, apesar dos seus 12 anos de governo e de hegemonia na Sociedade Política, ainda persiste, com grande força, idéias absurdamente conservadoras na Sociedade Civil e até uma maior visibilidade de propostas e comportamentos abertamente nazifacistas. O PT nestes 34 anos não avançou ainda de um projeto de governo (hegemonia na Sociedade Política) para um projeto de poder (hegemonia na Sociedade Civil que pressupõe uma proposta de cunho ideológico).

Para a luta anti-racista, esta inflexão ideológica foi bem prejudicial. Apesar dos avanços de cunho institucional nas políticas públicas de combate ao racismo, a violência racial, o genocídio da população negra, os projetos de faxina étnica nos espaços urbanos, entre outros, não só continuam como também os seus defensores saem do armário e vão publicamente fazer campanha, até mesmo em emissoras de televisão que são concessões públicas. Parcela significativa de lideranças do movimento negro foram absorvidos pela máquina do Estado e transformaram o movimento social anti-racista em espaço de legitimação das suas gestões ou das políticas públicas que elaboram e promovem.

Esta reflexão é importante para que os militantes do PT, na celebração dos 34 anos de partido, aproveitem o momento para pensar a trajetória.

Fonte: Quilombo

 

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