Para cumprir ordem judicial, SP tem 5 meses para criar 27 mil vagas em creche

No fim de 2014, cidade tinha 187 mil crianças na fila de espera; município pode ter bloqueio de verbas se não cumprir decisão

Por Raul Duarte, do iG

Foto: Agência Brasil
Nas periferias da cidade de São Paulo, onde há mais demanda e menos oferta, tempo de espera por uma vaga em creche pode ultrapassar dois anos

No final de 2013, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) determinou que a prefeitura de São Paulo terá de disponibilizar 105 mil novas vagas em creche até o fim de 2016, sendo que metade delas (57.500) já teriam de estar disponíveis até junho deste ano. Há cinco meses do fim do prazo intermediário, no entanto, a prefeitura criou apenas 30.363 vagas. Para cumprir a ordem do TJ, terá de criar outras 27.137 vagas em cinco meses.

Enquanto isso, os últimos números divulgados pela Secretaria Municipal de Educação, de novembro do ano passado, mostram que há 187.535 crianças na fila de espera por uma vaga. A situação faz com que o tempo para a conquista de uma vaga chegue a mais de dois anos, principalmente onde a demanda é maior: nas periferias da cidade.

Desde que o filho Thiago tinha seis meses de idade, a recepcionista Isabeel Menezes, de 23 anos, fez o pedido por uma vaga em creche pública no bairro de Vila Formosa, zona leste da capital. Hoje, quase dois anos depois, a vaga ainda não apareceu. Sem ter com quem deixar a criança, Isabeel ficou sem trabalhar até o fim do ano passado. Foi quando a situação financeira apertou e ela não teve outra saída. Conseguiu um emprego e deixa Thiago sob os cuidados de uma adolescente de 15 anos. “Deixo meu filho com outra criança. Dá medo de ser denunciada, ou pior, de alguma tragédia acontecer. Mas o que eu posso fazer se tenho de trabalhar?”, questiona.

 

A angústia da recepcionista ecoa a de outras milhares de famílias da periferia da cidade: são pessoas que dependem de uma vaga em creche pública para manter o trabalho que sustenta a casa. Sem a garantia da vaga e sem condições financeiras de pagar por uma escola particular, só resta abrir mão do emprego ou deixar a criança sob os cuidados de algum familiar ou vizinho.

Universalizar o acesso à creche é uma das metas do Plano Nacional de Educação (PNE). De acordo com o PNE, 50% de todas as crianças de 0 a 3 anos devem estar matriculadas em creche até o ano de 2024. No Brasil, de acordo com os dados, de 2013, apenas 27,9% das crianças estavam matriculadas em creches. Em São Paulo, de acordo com o censo do IBGE de 2010, o porcentual alcançava 36,8%.

Os especialistas explicam que garantir a vaga em creche é fundamental para o futuro da criança. “Nessa idade, a criança está aprendendo a se relacionar com o mundo, a desenvolver competências para enfrentá-lo. Por isso, é muito importante uma área para brincar, ter contato com livros, receber carinho e ser cuidada”, afirma a psicóloga Silva Carvalho, coordenadora do Instituto Avisa Lá, ONG que atua na causa da educação básica. “Inclusive, há estudos que demonstram que até o futuro emprego pode
ter influências da educação que a criança recebeu na primeira infância”, conclui.

Sem vaga e sem emprego

Juliana Amancio e seu filho: desempregada, faz trabalhos de diarista para ajudar na renda
Juliana Amancio e seu filho: desempregada, faz trabalhos de diarista para ajudar na renda. (Reprodução/Facebook)

Mãe de Pietro, de dois anos e dois meses, Juliana Amâncio, 30, só consegue fazer pequenos bicos de diarista na região em que mora, em Morro Doce, na zona oeste. No começo do ano passado, seu filho estava em sexto na lista de espera. Juliana chegou a se animar, mas passou o período das matrículas e o garoto não foi chamado. “Acontece um sobe e desce na lista, não dá pra saber. Tinha até vontade de ter outro filho, mas se com um é assim, imagine com dois.”

Segundo a prefeitura, a flutuação na fila – que faz com que uma criança que estava nas posições iniciais perca o espaço – é devido à intervenção do Judiciário. A Defensoria Pública declarou que, em época de maior demanda, de dezembro a fevereiro, chega a atender mais de 120 casos por dia de pedido de vaga em creche. “A responsabilidade pelo déficit de vagas não deve ser transferida aos pais, que legitimamente exercem sua cidadania valendo-se do Poder Judiciário para ter realizado um direito que, antes, lhe fora negado pela própria municipalidade.”

Mariza Pereira, de 27 anos, também esperou por quase dois anos. Ela conta que, quando conseguiu, quase perdeu a matrícula, pois ninguém entrou em contato com ela. “Descobri por acaso. Já aconteceu com conhecidas minhas que perderam a vaga, porque não sabiam que tinham chamado.”

Segundo a prefeitura, isso ocorre devido a problemas no cadastro. Para evitar esse tipo de desencontro, faz um alerta aos pais: as informações da família – como o endereço e telefones atualizados – devem estar sempre atualizados para evitar essas situações.

Caso a prefeitura não crie o número de vagas em creches estipulado pelo TJ, pode sofrer sanções como bloqueio de verba – alguma outra área do orçamento do município seria bloqueada e transferida até que a meta seja totalmente executada, explica Salomão Ximenes, advogado e Coordenador de Programa na Ação Educativa Assessoria, Pesquisa e Informação. O descumprimento também pode ser configurado como crime de omissão. Nesse caso, os secretários que passaram pela pasta no período poderiam ser responsabilizados.

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