Posicionamento público pela revogação da Portaria n° 077/000/2021 da FUNAP

Enviado por / FonteDo Ação Educativa

POSICIONAMENTO PÚBLICO

Pela revogação da Portaria n° 077/000/2021, de 25 de outubro de 2021, da FUNAP

A portaria que coloca mais trincos nos portões

Posicionamento Público sobre a Portaria n° Direx 077/00/2021, de 25 de outubro de 2021, da Fundação Prof. Manoel Pedro Pimentel, também conhecida como FUNAP, que tem por objetivo principal contribuir para a recuperação social da pessoa privada de liberdade, estabelecendo novas e mais diretrizes para o Programa de Incentivo à Leitura “Lendo a Liberdade”.

Mais uma vez a FUNAP, sem dialogar com as entidades, instituições e movimentos que atuam no campo da remição da pena pela leitura e violando a Resolução n° 391 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), de 10 de maio de 2021, que estabelece procedimentos e diretrizes a serem observados pelo Poder Judiciário para o reconhecimento do direito à remição de pena por meio de práticas sociais educativas em unidades de privação de liberdade, publica uma portaria, que restringe ainda mais o direito à remição das pessoas em privação de liberdade, causando indignação de profissionais das áreas da leitura, literatura e educação que já estão (ou estavam, antes da pandemia e de portarias dificultadoras) atuando em programas de incentivo à leitura dentro das unidades prisionais.

Uma portaria intencionalmente extensa e minuciosa na burocracia que retira das unidades prisionais a possibilidade de parceria direta com programas e projetos a fim de centralizar na FUNAP toda e qualquer atividade de leitura, considera dezenas de leis e atos infralegais, mas ignora todos no corpo de sua redação.

A portaria já em seu Art 1º, Item IX, fere o Art. 5º § 1º, Item III, § 2º e § 3º da Resolução n° 391 do CNJ que estabelece que o relatório de leitura feito pela pessoa presa não assumirá caráter de avaliação de desempenho ou de prova, devendo limitar-se à verificação da leitura que não precisa, necessariamente, ser feita por escrito. Quem organiza e coordena clubes de leitura, por exemplo, sabe quantas verificações de leituras inteligentes e profundas são feitas de forma oral, no diálogo entre pares, por meio de desenhos, entre outras possibilidades de expressões artísticas.

Mas vem a nova Portaria e estabelece critérios de avaliação (Art. 10º § 2º, § 3º e § 7º) que chegam a ser cruéis para quem está dentro do sistema prisional (e, sejamos sinceros, até para quem está fora), como a anacrônica exigência da “descrição de personagens principais e secundários”, “identificação dos papéis e/ou funções dos personagens”, “descrição do enredo”, “delimitação do tempo e do espaço da narrativa”, dentre outras, para coroar, o suposto “emprego correto da Língua Portuguesa ou da Língua Estrangeira”.

Quem, com a real intenção de garantir direitos, faz exigências como essas?  Dizem que a participação é livre, porém há uma linha de corte para a participação visando o aproveitamento da pessoa na atividade, e o próprio Relatório de Leitura (RL) exclui automaticamente pessoas em formação, não alfabetizadas ou com dificuldades de leitura e escrita que não terão proficiência para corresponder aos critérios exigidos, o que fere novamente a Resolução n° 391 do CNJ em seu Art. 6, Itens I e III.

Há que se considerar também que a portaria da FUNAP não é transparente com relação aos critérios para selecionar obras do acervo (Art. 1º) e dá margem ao arbítrio na seleção de livros (Art. 6º § 2º), o que abre precedente para a censura de livros, como já ocorreu, em 2020, quando a própria FUNAP vetou uma lista de livros selecionados por um projeto de remição pela leitura Site externo. A Resolução n° 391 do CNJ é bem explícita em seu Art. 5º § 4º, Item III, ao “(…) vedar toda e qualquer forma de censura”.

É inadmissível que uma Fundação, como é o caso da FUNAP, vinculada à Secretaria de Administração Penitenciária do Estado de São Paulo, trabalhe para dificultar ainda mais o direito à remição da pena, por meio da educação não-formal, em um país em que mais da metade da população carcerária não tem ensino fundamental completo e que, apesar das legislações vigentes, há um sério problema de oferta educacional que priva as pessoas presas, em sua maioria jovens negros, do Direito Humano à Educação e à Literatura.

O modo como uma sociedade trata as pessoas encarceradas diz mais sobre quem está do lado de fora dos portões do que sobre quem está dentro. Nós, integrantes das instituições, entidades e movimentos abaixo assinados, continuaremos brigando por uma sociedade melhor, realmente fraterna, pluralista e sem preconceitos, como está no preâmbulo da nossa Constituição.

Assim, a imediata revogação da Portaria n° 077/000/2021, de 25 de outubro de 2021, da FUNAP, que requeremos.

+ sobre o tema

Grupo da FE discute relações étnico-raciais na educação

Na escola, nosso primeiro ambiente de convivência pública, construímos...

Enem: Mais de 4 mil participantes tinham acima de 60 anos

Entre os 3,3 milhões de estudantes que fizeram...

Piso salarial do magistério é constitucional, diz o STF

  O Supremo Tribunal Federal (STF) considera constitucional...

para lembrar

Candidatos a professores em SP têm de apresentar exames caros

Testes médicos exigidos de 12 mil candidatos custam mais...

Enem: AGU recorre de decisão da Justiça sobre segunda prova

A Advocacia-Geral da União (AGU) protocolou nesta quinta-feira...

MEC divulga lista dos aprovados no Sisu

Com um dia de antecedência, o MEC (Ministério da...
spot_imgspot_img

Educação dos ricos também preocupa

É difícil imaginar o desenvolvimento de uma nação sem a participação ativa dos mais abastados. Aqueles que, por capricho do destino, nasceram em ambientes...

Inclusão não é favor

Inclusão não é favor. Inclusão é direito! Essa é a principal razão pela qual ações voltadas à promoção da equidade racial devem ser respeitadas, defendidas e...

Promessa de vida

O Relatório do Desenvolvimento Humano, divulgado nesta semana pelo Pnud, agência da ONU, ratificou a tragédia que o Brasil já conhecia. Foi a educação que nos...
-+=