Presidente da Sociedade de Bioética: Lamento a fraqueza do Ministério

Cláudio Lorenzo sobre Dirceu Greco (foto acima): “Lamento a fraqueza do Ministério em fazer com que o país perca um gestor dessa qualidade para agradar aqueles que considera parte importante do seu projeto de governabilidade”

Nota do Presidente da Sociedade Brasileira sobre Exoneração do Prof. Dirceu Greco da Direção do Departamento DST/AIDS do Ministério da Saúde¹

  1. por Cláudio Lorenzo

Nesta manhã de quarta-feira, 05 de junho, acordamos com a notícia da exoneração do Diretor do Departamento de DST/AIDS e Hepatites Virais, Dirceu Greco pelo Ministro da Saúde, em função de publicidade sobre prevenção de DST veiculada no dia Internacional da Prostituta.

O Professor Dirceu Greco é um eminente infectologista, professor titular da UFMG, e um dos pioneiros da Bioética brasileira. Seu trabalho à frente do Departamento DST/AIDS tem o reconhecimento da comunidade acadêmica, da área técnica do Ministério da Saúde e dos movimentos sociais de pessoas vivendo com AIDS e outras DST.

Durante sua gestão, os dados demonstram ampliação de cobertura no acesso a tratamento e maior eficiência de medidas preventivas. Além disso, o Departamento pautou-se por uma construção de atuação a partir do diálogo com grupos sociais estigmatizados, contribuindo para autoestima desses grupos, redução da discriminação e elaboração de ações com maior poder de aceitabilidade.

E foi justamente em uma oficina sobre prevenção de DST/AIDS com prostitutas, de onde emergiram as ideias para a publicidade. Em um dos cartazes, uma mulher comum sopra um beijo na palma da mão e diz: “Um beijo para você que usa camisinha e se protege de HIV/AIDS, DST e Hepatites Virais”. No outro, uma outra mulher comum bate no peito e diz: “Sou feliz sendo prostituta”.

Este segundo cartaz foi o que parece ter despertado a maior indignação. Segundo os jornais foram as pressões da bancada evangélica que levou o ministro a exonerar o Prof. Dirceu Greco em 72 horas após a veiculação. O atual presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, Deputado Marco Feliciano classificou de “famigerada” a campanha. Um outro deputado, compara prostitutas a portadores de perversões, quando disse esperar agora, uma campanha que diga: “sou pedófilo, sou feliz” e uma outra deputada afirmou que era um desserviço à sociedade, pois a condição dessas mulheres não lhe permitem serem felizes.

O filósofo Friedrich Nietzsche criou a expressão “moralina” para designar uma espécie de produto subjetivo tóxico que escorre de uma moral própria daqueles que negam a realidade como ela é, e que põe seus valores abstratos, seus conceitos autônomos acima da verdade da vida e do sofrimento.

Segundo o filósofo, essa moralina não é senão uma moral superficial e hipócrita que se infiltra no tecido social e nas estruturas do Estado, como expressão de ódio e de apetite de vingança pelos diferentes. Ela inspira então ações estratégicas para enquadrar os diferentes em seu padrão de moralidade.

Adequando à nossa realidade, podemos constatar que é fruto dessa moralina a proposta de tratar a homossexualidade como doença, ignorando toda a produção antropológica e histórica que demonstra nunca ter havido civilização sem homossexualidade e de serem muitas e variadas as visões morais criadas sobre esse comportamento através dos lugares e tempos.

É ela também que inspira a postura de ignorar estrategicamente a existência das prostitutas e ignorando-as, permitir que sofram violência, que sejam exploradas no trabalho, e que se lhes negue o direito à autoestima e à felicidade.  A moralina brasileira parece querê-las sempre no lugar de Madalenas apedrejadas, à espera de redenção.

Triste é ver como os acordos políticos e os projetos de poder nesse país têm contribuído para a manutenção e expansão tóxica dessa moralina na sociedade brasileira.

Parabenizo o Prof. Dirceu Greco e sua equipe, por terem encarado a realidade. É preciso que as campanhas de prevenção de DST/AIDS e Hepatites Virais cheguem aos milhares de cabarés existentes no país, e nos bares de beira de estrada,  é preciso que as campanhas não tenham conteúdos culpabilizadores nem vitimizadores dos comportamentos, para que possam comunicar-se efetivamente com os sujeitos alvos.

Lamento a fraqueza do Ministério em fazer com que o país perca um gestor dessa qualidade para agradar aqueles que considera parte importante do seu projeto de governabilidade.

Comecei e termino com Nietzsche:

“Para o forte, o conhecimento, o dizer sim à realidade é uma necessidade, tal como para o fraco, sob a inspiração da fraqueza, também é uma necessidade a covardia e a fuga perante a realidade.”

Cláudio Lorenzo é presidente da Sociedade Brasileira de Bioética.

¹O conteúdo dessa nota é de inteira responsabilidade do Presidente da entidade, e não expressa necessariamente o pensamento da Diretoria ou do conjunto de associados.

 

 

Fonte: Viomundo 

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