Professor aborda efeitos do preconceito e do racismo na vida dos jovens negros

 

Palestra de Riccardo Cappi no Seminário Oportunidades para a Juventude Negra tratou de aspectos do olhar vistos em pesquisa sobre discursos de parlamentares favoráveis e contrários à diminuição da maioridade penal
Propondo uma reflexão analítica do olhar, o professor doutor Riccardo Cappi proferiu palestra no Seminário Oportunidades para a Juventude Negra, promovido pela Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR), em Porto Alegre-RS, na última sexta-feira (24/05). O debate foi o último da série preparatória da terceira Conferência Nacional sobre a temática, que acontece de 5 a 7 de novembro, em Brasília.

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O acadêmico abordou o olhar sob o aspecto da negação, inferiorização e representação para caracterizar como os jovens negros são vistos pela sociedade brasileira e os efeitos que o racismo e o preconceito causam em suas vidas. “Se olho a juventude como uma ameaça, a resposta é a eliminação, a segregação. Uma resposta do tipo violenta”, afirmou Cappi, que é professor das universidades de Feira de Santana (UEFS) e do Estado da Bahia (Uneb).

O acadêmico baseou a palestra nos conceitos trabalhados em sua pesquisa sobre discursos de parlamentares favoráveis e contrários à redução da maioridade penal. A matéria é foco de várias propostas de emenda à Constituição em tramitação no Congresso Nacional, visando conferir nova redação ao artigo 228 para que a idade de responsabilidade penal seja rebaixada a dezesseis anos.

“Se tem tanta gente querendo reduzir a maioridade penal, o que eles estão vendo?”, perguntou Cappi. “A visão é redutora, desumanizante, porque não dizer, racista do outro percebido como ameaça, logo o elimino”, respondeu o professor ao abordar três maneiras de olhar o outro e analisar efeitos do racismo e do preconceito sobre as vidas dos jovens.

O primeiro aspecto, caracterizando o olhar pela negatividade, que desconsidera a existência do outro e conduz à resposta eliminatória, que segrega ou até elimina. “Daí, podermos compreender o extermínio e genocídio de jovens sem que isso crie a mínima indignação”, disse. A segunda abordagem diz respeito ao olhar analítico, que reconhece parcialmente o outro a partir de determinadas características, ou seja a juventude é percebida como grupo de risco, delinquente. “Daí a identificação de direitos específicos”, afirmou.

No terceiro conceito, “o outro é encarado como sujeito, expressão de experiência, vivência da interação na qual há a possibilidade de conhecer e valorizar a experiência do outro, que é encarado a partir de sua plenitude e não só a partir de suas características negativas que precisam ser corrigidas. Reconhece-se a possibilidade de intersubjetividade”, explicou o professor.

Por fim, Riccardo Cappi falou da dimensão subjetiva do olhar, que ele relacionou ao preconceito e definiu como olhar estigmatizante, que impede ver o outro como protagonista autônomo. “Do ponto de vista político, esse conceito trabalha as representações, de criar as possibilidades de participação da juventude negra que se torna só objeto de direito e não sujeito na construção da realidade”, completou.

Balanço
A ministra Luiza Bairros fez um balanço dos seminários temáticos realizados pela SEPPIR e explicou a escolha do tema geral da IIII CONAPIR. “Junto com o CNPIR (Conselho Nacional da Igualdade Racial), elegemos o tema ‘Democracia e Desenvolvimento sem Racismo: por um Brasil Afirmativo’, exatamente no sentido de nos prepararmos para dar um salto após dez anos de institucionalização da política de igualdade racial. Tentarmos refletir sobre a inserção maior da questão e das políticas de igualdade racial dentro dos grandes temas que mobilizam a sociedade brasileira, como é o caso dos temas democracia e desenvolvimento”, explicou a titular da SEPPIR.

“O Brasil tem alguns marcos legislativos significativos que precisam ser replicados nos estados, onde nos ressentimos de legislações antiracistas”, afirmou o coordenador do Fórum Estadual da Juventude Negra do Espírito Santo (Fejunes), Lula Rocha, na mesa de abertura, da qual também participaram o vice-presidente da Empresa de Correios e Telégrafos, Larry de Almeida, e o secretário de Direitos Humanos da Prefeitura de Porto Alegre, Luciano Marcantônio.

No balanço que fez sobre os seminários preparatórios da Conapir, a ministra lembrou a discussão de Salvador sobre Representação política e enfrentamento do racismo, que classificou como uma dimensão importantíssima de qualquer debate sobre democracia no Brasil.

“Não há duvida nenhuma que demos passos muito importantes ao longo dos últimos 30, quase 40 anos, que é o tempo de existência dessa versão contemporâneo do movimento negro, mas do ponto de vista político ainda restam muitos espaços na sociedade brasileira que ainda são privilégio do grupo branco e que, portanto, precisamos pensar estratégias muito concretas de como criar ‘densidade política’ e uma representação negra compatível com a nossa presença na população, seja no parlamento, nos executivos municipais e estaduais, e até mesmo no federal, afirmou a ministra que analisou também os seminários de Recife, São Paulo, Belém do Pará, onde foram debatidos, respectivamente, os temas: ‘Trabalho e Desenvolvimento: Capacitação Técnica, Emprego e População Negra’; ‘Desenvolvimento e Mulher Negra’; e ‘Territórios Tradicionais Negros: Desenvolvimento e Enfrentamento ao Racismo’.

A mesa da tarde teve a participação de Ângela Guimarães, secretária Adjunta da Secretaria Nacional de Juventude e vice-presidente do Conselho Nacional de Juventude (Conjuve), tendo como debatedora a estudante da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e integrante do Movimento de Ação Afirmativa – Negração, Karen Moraes, e do deputado Estadual, Raul Carrion.

 

Fonte: Seppir

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