Professores levam a escolas públicas do Gama o ensino da cultura africana

Professores e movimento afrodescendente levam aos alunos de escolas públicas do Gama o ensino da cultura africana como forma de reafirmar as origens

Por Aline Brito, do Correio Braziliense 

Erasmo Magalhães e Vinícius Gomes, integrantes do Madeb: oficinas nas escolas para destacar a questão da afrodescendência (foto: Aline Brito/CB/D.A Press)

 

Ancestralidade, na cultura africana, é o processo divino de continuidade da vida. O culto ancestral é um dos princípios básicos no mundo tradicionalmente africano. Mas o contato diário com outras culturas faz com que, muitas vezes, essas referências se percam ou simplesmente se transformem em “coisas do passado”, sem relevância para os dias de hoje. Em busca de resgatar a memória africana e evitar que as tradições originárias do povo africano se percam, professores e afrodescendentes levam a alunos de escolas públicas do Gama a história dos antepassados, como forma de reafirmar o presente.

Mesmo sendo conteúdo obrigatório no currículo escolar brasileiro, o ensino da cultura afrobrasileira nas escolas públicas do Distrito Federal nem sempre é valorizado. Em busca de manter a tradição, professores do Centro Educacional (CEd) 6 do Gama e o Movimento Afrodescendente de Brasília (Madeb) levam conhecimento sobre as tradições africanas aos jovens.

A cultura africana e o direito das mulheres são assuntos que a professora de filosofia do CEd 6 Dalva Costa se preocupa em abordar durante as aulas. Os livros regulares trabalhados em sala de aula não tratam de temáticas para além do eurocentrismo. Por isso, Dalva utiliza outras obras que abordam os costumes e história do povo africano.

Eurocentrismo

As filosofias africanas e afrodescendentes são abordadas pela professora e compõem parte da nota dos alunos, que aprendem sobre o assunto por meio de leitura e apresentação de trabalho. “Descobri uma literatura que aborda a filosofia a partir de um olhar diferente do eurocentrismo. A africanidade sempre me despertou muito interesse e procuro levar o tema aos alunos como forma de conscientização, aprendizado e desconstrução de preconceitos”, cdestaca a Dalva.

Como forma de garantir o aprendizado dos alunos, a professora orienta os jovens do ensino médio a fazerem um trabalho. “Eu falo para eles lerem o capítulo do livro que eu passo. Depois da leitura eles entram em contato com um professor da UnB ligado à temática, para terem um entendimento mais amplo do assunto de gênero e de raça, depois eles apresentam esse trabalho”, explica Dalva.

Os alunos também são aconselhados a utilizar elementos lúdicos para tornar o estudo de africanidades mais atraente. “Peço para eles trazerem músicas que abordam a negritude, poemas, cinema negro, entre outros elementos que servem para ampliar o conhecimento e prender a atenção dos estudantes”, diz.

O estudo da africanidade causa nos alunos identificação. Por meio do entendimento da cultura negra, os jovens da escola que são, em maioria, negros, se percebem na história, nas tradições, nos costumes do povo africano. “Nós somos o país com o maior contingente de negros fora da África. Nosso sangue não tem nada de europeu, somos quase todos, de alguma forma, descendentes de africanos. Resgatar a cultura afro é uma forma de nos conhecermos melhor, de entendermos nossas origens e nos enxergarmos dentro da história do nosso país”, afirmou a professora de filosofia.

“Quando abordo esse tema em sala, quando trazemos pessoas de fora para palestrar sobre o assunto, ou até mesmo quando incentivamos os próprios estudantes a entenderem mais sobre o tema, percebemos que isso desperta interesse neles”, acrescentou Dalva.

Por todo o CEd 6 é possível perceber elementos da preocupação dos professores e alunos em dar visibilidade às africanidades. Banners, fotografias, pinturas e grafites espalhados pela escola chamam a atenção para a conscientização e conhecimento da cultura negra.

 

Projetos do Madeb

 

Trabalhar africanidades nas escolas públicas do Gama é o foco principal do Movimento Afrodescendentes em Brasília (Madeb). Desde a criação do grupo, há 10 anos, os integrantes se preocupam em disseminar o entendimento sobre a cultura negra na comunidade do Gama. “Quando começou, nós fazíamos eventos abertos à comunidade, como a feijoada beneficente, evento no dia da consciência negra. Com o tempo, fomos desenvolvendo o projeto das escolas”, disse Vinícius Gomes, estudante de história e presidente do Madeb.

Baseados na Lei 10.639/2003, que torna obrigatório o ensino da história e cultura afro-brasileira na rede de educação do país,  o Madeb visita escolas do Gama para apresentar aos alunos a cultura africana. Os 17 integrantes do movimento levam para dentro dos colégios da rede de ensino pública elementos da cultura de origem africana. “Nós procuramos promover o acesso à cultura e à história por meio da arte”, observa Vinícius.

Os eventos promovidos pelo grupo são compostos por dois momentos: começa com a apresentação de personalidades brasileiras e internacionais da cultura negra, mostrando a luta e história dessas pessoas, além de ter uma apresentação de teatro. Depois do teatro, os participantes do Madeb finalizam com oficinas que duram, em média, 45 minutos. “O momento das oficinas, muitas vezes, é o mais esperado pelos alunos. A gente leva para eles atividades que fazem parte da realidade e que eles gostam, como o rap”, contou Vinícius.

 

O produtor musical Erasmo Magalhães, 45 anos, integrante do grupo há dois anos, traz para os jovens o samba. “Não tinha como falar de africanidade sem apresentar aos alunos uma roda de samba”, disse o músico.  “Na oficina, eu levo para eles algumas letras de samba que falam sobre Zumbi dos Palmares, sobre a África, negritude e eles aprendem sobre a cultura por meio da musicalidade”, descreve Erasmo.

Os estudantes interagem com as apresentações, cantam junto com os sambas tocados, dançam, participam da capoeira, se interessam pelas aulas de turbante e, para os integrantes do Madeb, isso mostra o quanto as escolas são carentes de atividades que despertam a curiosidade dos alunos. “As histórias dos ancestrais se perdem e, por isso, é importante termos momentos como esses nas escolas para que os alunos se reconheçam como membros dessa história”, ressalta Vinícius, presidente do Madeb.

 

Atrações

 

» O Madeb se apresentará dia 18 de junho na Escola Classe 18 do Gama.

 

»  Em 8 de agosto, o grupo tem outra apresentação marcada no Centro de Ensino Fundamental (CEF) 01 do Gama.

 

Oficinas

 

O Madeb oferece oficinas de rap, break dance, samba, turbante e capoeira. Cada oficina tem duração de 45min e são realizadas duas sessões de cada oficina.

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