Reformas estão 20 anos atrasadas, diz compositor

Para Pablo Milanés, irmãos Castro têm de fazer transição econômica

Ídolo da música cubana afirma que mudanças significam abertura para artistas, mas que ainda são insuficientes


As reformas em Cuba deveriam ter começado há 20 anos e os irmãos Fidel e Raúl Castro têm a obrigação de fazer a transição para um novo modelo, a fim de que a ilha não acabe entregue a “oportunistas que se preparam para vender o país quando eles morrerem”.
A cobrança é feita pelo cantor e compositor Pablo Milanés, partidário da Revolução Cubana que nos últimos anos tem feito críticas públicas ao regime, incluindo na recente greve de fome de oposicionistas.

Ele deu entrevista num intervalo entre participações no festival de Três Pontas (MG) e no TelefônicaSonidos, que começa no dia 21, em São Paulo.

Morador de Havana, ele deu à filha caçula, de 20 meses, o nome de Rosa Parks -símbolo do movimento contra a segregação racial nos EUA- e continua admirador de Barack Obama.

 

Folha – A política estava na Nova Trova, como está no regaton e no rap das novas gerações de músicos cubanos. A música é um veículo de debate em Cuba?
Pablo Milanés – Não há um debate aberto [em Cuba]. As expressões musicais se manifestam, não há represálias abertas, mas tampouco uma aceitação do Estado. Há apenas um estado de tolerância.

O Estado controla a difusão?
Controla tudo. Agora, como tem sido noticiado, há medidas para que 500 mil empregados do Estado passem ao serviço privado. Me parece que isso vai gerar muito mais liberdade no exercício do trabalho, incluindo na arte.

As reformas econômicas vão funcionar?
Significam uma abertura, é indubitável. Mas vejo um círculo vicioso no qual as travas que o próprio Estado criou -por meio das proibições à pequena indústria, ao pequeno comércio, ao trabalho por conta própria- criam obstáculos que vão impedir que isso evolua rápido.
Haverá necessidade de matérias-primas, de pequenas fábricas. Será preciso criar uma infraestrutura que o país não tem, e não vejo Orçamento para isso.
Em longo prazo, pode dar certo. Acho que o povo se sacrifica sobretudo quando depende dele próprio.

O que virá após os Castro?
Sempre digo que o país tem que ser reconstruído com os Castro. Porque os Castro foram os responsáveis pelo mau e pelo bom que aconteceu na revolução durante 52 anos.
Eles têm a responsabilidade histórica de garantir que antes e depois de sua morte o país fique em paz consigo mesmo, com todos os que se sacrificaram para manter a revolução, e não com os oportunistas que estão se preparando para vender o país quando morrerem.
Têm que se preparar para deixar um país digno, que possa recuperar o que foi perdido pelos erros cometidos nestes anos.

O senhor disse que era preciso uma nova revolução. É possível?
Falo em insuflar um talento novo, que existe. Mas tem que ser buscado sem preconceitos, não apenas em gente dentro do poder, mas sim nos jovens que estão em toda parte e dispostos a fazer uma gestão saudável, em função do socialismo, mas com novas ideias.

Incomoda o sr. que a saída para a libertação de opositores presos tenha sido o exílio?
Claro que sim. Gostaria que fosse desenvolvido um meio para que se possa divergir do governo. Desde que caiu a União Soviética, há 20 anos, minhas ideias para Cuba são muito críticas.
O país não podia manter o modelo socialista ortodoxo. Tinha que partir para um nacionalismo econômico, cultural e industrial, depender do próprio esforço.
Temos 20 anos de atraso em dar ao povo a possibilidade de se desenvolver pelos próprios meios. Se todos tivessem tido a liberdade e a possibilidade de se manifestar, teria sido outra coisa.

Como vê as recentes declarações de Fidel e sua recuperação?
Me parece extraordinário. E não acho que seja um homem afastado do poder, que seja apenas, como ele disse, uma testemunha. Fidel ainda é o primeiro secretário do Partido [Comunista]. Portanto, Fidel permanece no poder absoluto.

O americano Barack Obama foi uma decepção para você?
Não. Obama é um negro que chegou ao poder nos EUA e parece que lhe fizeram uma armadilha, para enfrentar tudo que Bush deixou: um sistema capitalista destruído, um país destruído, e quase o mundo inteiro destruído. Foi a herança que Obama recebeu.


QUEM É PABLO MILANÉS

NASCIMENTO
24.fev.43, Bayamo (Cuba)

CARREIRA
Expoente da Nova Trova, movimento iniciado nos anos 60 e afim à Revolução Cubana

DISCOGRAFIA
31 discos, sendo o último “Regalo” (2008), com a canção “Libertad”

DESTAQUES
“Yolanda”, “Canção para a Unidade Latino-Americana”, “Para Vivir”, “Yo Pisaré Las Calles Novamente”

AMIGOS BRASILEIROS
Chico Buarque, Milton Nascimento, Maria Rita

Fonte: Folha

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