Nesta terça-feira 30, Geledés – Instituto da Mulher Negra esteve presente no lançamento da 9ª. edição do Relatório Luz da Sociedade Civil sobre a Agenda 2030, realizado em Brasília. O Relatório Luz é elaborado pelo Grupo de Trabalho da Sociedade Civil para a Agenda 2030 (GT Agenda 2030), formado por 47 organizações, entre elas Geledés, a única liderada por mulheres negras.
O relatório deste ano destacou que, apesar de avanços pontuais, os desafios permanecem: 43,45% das metas da Agenda 2030 no Brasil foram classificadas como de avanço insuficiente em 2025, número maior que os 34,52% registrados em 2024. Já as metas ameaçadas passaram de 5,25% para 8,92% no mesmo período. Por outro lado, o percentual de metas em retrocesso caiu de 23,8% em 2024 para 15,47% em 2025.
Durante o encontro, Fernanda Lopes, membro da Associação Brasileira de Saúde Coletiva, apresentou estudos que reforçam o impacto da população negra, sobretudo as meninas e mulheres, diante de um cenário de crises sanitárias, políticas e ambientais; de deterioração de polícias de proteção social; austeridade fiscal; e negacionismo científico, vividos pelo Brasil na última década.
A percepção da pesquisadora coincide com dados expostos no ano passado por Geledés. Em 2024, o instituto apresentou as repercussões contemporâneas do colonialismo e da escravização na vulnerabilidade de meninas e mulheres afrodescendentes, reforçando que “enquanto não houver interseccionalidade racial e de gênero em todos os ODS da Agenda 2030, não haverá desenvolvimento sustentável, com consequências drásticas para a maioria populacional brasileira”.
No relatório atual, Geledés mais uma vez sublinhou como as recentes crises seguem impactando de maneira desproporcional a população negra. A ausência de desagregação racial nos indicadores do ODS 5 (Igualdade de Gênero), em áreas como violência, participação política e justiça reprodutiva, foi apontada como uma grave lacuna.
Neste contexto, apesar de celebrar o esforço coletivo da sociedade civil na elaboração do relatório, diante dos percalços das últimas crises, Giovanna Coelho, da área de Gênero e Direitos Humanos e representante do instituto no evento, alertou justamente para essa ausência sistemática de interseccionalidade nas análises do Relatório Luz.
“Nós mulheres negras somos praticamente um terço do total da população brasileira e 54,3% das mulheres. Ter dados para nos localizar em todos esses indicadores é fundamental. Ao mesmo tempo, precisamos reconhecer o momento em que estamos: retrocesso, inclusive apontado no relatório. Enquanto o Brasil disputa a governança internacional e retoma sua liderança política no Sul Global, precisamos incidir para que o governo fale sobre nós em todos os espaços”, disse ela.
O documento atual também apontou obstáculos internos e externos, como o embate entre Executivo e Legislativo, o cenário global de backlash contra os direitos humanos e os impactos das reduções orçamentárias no sistema ONU, que afetam principalmente as políticas de enfrentamento ao racismo e ao patriarcado.
No âmbito internacional, em especial nos fóruns da ONU, Geledés tem atuado de forma consistente para garantir que a dimensão de gênero e raça seja incorporada em todas as agendas. O instituto busca, com isso, fortalecer o empoderamento econômico das mulheres e meninas afrodescendentes em escala global. Nesse percurso, destaca-se a articulação junto às Nações Unidas com o recém-criado Stakeholder Group de Afrodescendentes, iniciativa pioneira conduzida por lideranças negras, na qual Geledés ocupa com orgulho a posição de copresidência.
Para 2026, o instituto anuncia que pressionará ainda mais pela proposta de implementação de um ODS 18 voltado à promoção da igualdade étnico-racial. A ideia é consolidar a luta antirracista como prioridade transversal do Estado brasileiro, havendo o mesmo compromisso internacional nos diversos espaços multilaterais.