A saudita negra com brevê de piloto que se tornou símbolo na luta por direitos civis

Nawal Al-Hawsawi fala o que pensa, é negra, tem brevê de piloto e é casada com um homem branco – tudo o que seus críticos dizem que uma mulher saudita não deve ser.

Do BBC

Mas apesar de ser vítima de ondas de abusos nas redes sociais, ela se recusa a ceder às convenções e diz que vai responder a seus detratores “com amor”.

Com quase 50 mil seguidores no Twitter, rede social na qual escreve sobre a importância da diversidade racial e da igualdade no casamento, Al-Hawsawi se tornou uma espécie de estrela da internet do país. Mas nem todos os que a seguem são seus fãs.

No último mês de dezembro, ela sofreu uma enxurrada de ofensas racistas no que seria apenas o início de uma longa campanha dos chamados trolls ─ grupos articulados na internet que querem chamar a atenção para si, geralmente realizando ataques a alguma personalidade nas redes sociais.

Há alguns anos, Al-Hawsawi recebe deles fotos de gorilas e imagens de pessoas de tribos africanas alteradas no Photoshop. Eles também se referem à ela com um termo pejorativo para negros em árabe, que significa “escravo”.

Enfrentando o preconceito

Por ter nascido em Meca, uma das regiões mais cosmopolitas da Arábia Saudita, Al-Hawsawi diz que não havia pensado em si mesma como “negra” até ir morar nos Estados Unidos.

Lá começou o despertar de sua identidade racial, e foi também naquele país onde ela aprendeu a voar e tornou-se piloto certificada, apesar de ser proibida de exercer a atividade em sua terra natal.

Ainda nos Estados Unidos, ela estudou para se tornar terapeuta de casais, sua profissão atual. Al-Hawsawi também se casou com um americano e os dois voltaram para a Arábia Saudita há poucos anos.

Foi aí que o problema começou.

Em um evento celebrando o dia nacional da Arábia Saudita em 2013, ela foi agredida verbalmente por uma mulher, que a chamou de “escrava”, usando o termo pejorativo. Racismo é crime no país e ela levou o caso aos tribunais.

Mas após uma conversa com a mulher que a ofendeu, ela ouviu desculpas e retirou as acusações. Agora, afirma que as duas são amigas.

O caso chamou a atenção da mídia do país, e Al-Hawsawi apareceu na televisão para falar sobre o que aconteceu.

A imprensa a chamou de “Rosa Parks da Arábia Saudita” ─ uma referência à icônica ativista pelos direitos civis nos Estados Unidos, que, em 1955, recusou-se a ceder seu assento no ônibus a um homem branco.

Al-Hawsawi decidiu usar a plataforma que a fama lhe deu para criar uma campanha antirracismo no Twitter, usando o mesmo insulto que ouviu para conscientizar as pessoas sobre o problema.

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Campanha de ódio

Mas a história não acaba aqui. Por causa da atenção que recebeu, sua conta de Twitter ─ que ela usa para escrever mensagens contra o racismo e a violência doméstica ─ virou foco de trolls, que deram início a uma campanha de ódio contra ela.

Agora, sua cor de pele, seu gênero e seu casamento interracial são alvos desses grupos, que ela acredita serem formados principalmente por pessoas de extrema direita.

“Eles não gostavam dos meus tuítes sobre casamento, igualdade e unidade”, disse ela ao BBC Trending, programa da BBC sobre assuntos comentados nas redes sociais em todo o mundo.

“Eles começaram uma campanha em que publicavam uma foto do meu marido e dos nossos filhos e pediam que outros retuitassem. Foi chocante.”

A terapeuta diz saber claramente o motivo de ter se tornado alvo. “Eu represento tudo o que eles odeiam, tudo aquilo ao que eles se opõem”, diz.

“Sou uma mulher saudita que se casou com um estrangeiro. Eles são antiamericanos. Meu marido é branco, eu sou negra. Eles condenam casamentos interraciais. Eles dizem que mulheres não podem trabalhar, então ver uma mulher que não sabe apenas dirigir, mas também pilotar aviões é inaceitável. Eles não gostam do fato de que minha mensagem ressoa em muitos dos meus seguidores”, explica.

Al-Hawsawi encaminhou várias mensagens abusivas que recebeu ao Ministério do Interior do país e diz que o assunto está sendo tratado com seriedade.

No entanto, tentativas de localizar os agressores ─ que, de modo geral, escrevem anonimamente ─ está demorando.

Enquanto isso, ela diz ter paciência para enfrentá-los.

“Eu aprendi muito com Mandela, Martin Luther King Jr. e Gandhi”, diz.

“Não se combate ódio com ódio. Você acende uma vela e mantém o pensamento positivo. Isso só te fortalece”, acrescenta.

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