20 relatos de racismo que parecem verdadeiras histórias de terror

Com a diferença de que essas histórias não são de ficção

por Gabriel Sukita no BuzzFeed

Perguntamos para a família BuzzFeed Brasil quais foram as piores histórias de racismo que já sofreram ou presenciaram. E aqui estão elas.

1. Brincadeira inocente.

“Festa da agência que trabalhava em 2016. Um rapaz se ofereceu para ajudar uma moça a descer as escadas porque ela tava muito bêbada e ela respondeu: ‘NÃO PRECISO DE AJUDA, SEU PRETO FILHO DA PUTA’ – exatamente com essas palavras. No dia seguinte, foram conversar com ela sobre o que aconteceu e ela sem querer se desculpar, disse que foi apenas uma brincadeira. Uma das coisas mais revoltantes foi que a empresa não tomou nenhuma atitude.”

—Mel Ruiz

2. Pequeno engano.

“Já aconteceu de policiais pararem o carro do meu pai (negro e eu branca de olhos claros), mandarem ele descer rispidamente e me perguntarem se eu estava bem, se estava em perigo ou se era meu pai mesmo. Ao responder com grosseria (não tenho medo), ouvi que não era normal (????) “um preto com carrão e uma loirinha atrás.”

—Anônima

3. Piada sem graça.

“Eu branca, olhos claros. Meu pai, negro, cabelo bem afro, usava black power quando eu era criança. Passei minha infância INTEIRA ouvindo dos familiares e amigos que eu não era sua filha. Ouvindo ‘piadinhas’ sobre isso, que pai é aquele que cria, sobre como ‘um preto feio tinha feito uma filha tão linda’, que eu era filha do padeiro, do vizinho, do açougueiro… Ou sobre como era a alimentação em casa, se nós comíamos bananas como ‘o macaco do meu pai’. Nunca achei graça, sempre me doeu, sempre chorei e quanto mais eu chorava mais as pessoas riam e achavam engraçadinho…”

—Anônima

4. Professor de publicidade.

“Estava conversando com uma amiga no elevador do prédio de propaganda do Mackenzie. Disse a ela para não andar sem o RG que se dar qualquer B.O. você pode precisar dele. Um professor ouviu e disse em tom de deboche:

‘- Ela pode andar sem RG, mas olha você… Você que não pode andar sem ele’.”

—Kauê Nóbrega

5. Almoço de domingo.

Get Out : Universal Pictures : Via kara-zorel.tumblr.com

“Em 2011 eu trabalhava pra uma família como babá e a mãe do meu chefe era extremamente racista. Teve um almoço de domingo que eu fui na casa dela com os pais da menina. Tava todo mundo ao redor da mesa se sentando pra almoçar, nisso a mãe do meu chefe se aproximou e me disse que eu não podia comer junto com a família, porque ela não gostava de preto.”

—Gisele Felipe

6. Traumas de infância.

“Meu pai é negro e minha mãe é branca, então nasci com a pele clara e o cabelo bem crespo. Na escolinha, as outras crianças gostavam de perguntar se eu ‘penteava’ o cabelo, de grudar coisas nele, tacar aquelas bolinhas de borracha com guspe… Chamavam de macaca, cabelo de Bombril… Teve uma situação em que um colega reclamou muito que meu cabelo atrapalhava e ele não conseguia ver a lousa, que se eu não tinha o cabelo ‘bom’ devia prender. A professora, em vez de me ajudar, me mudou para a última fileira da sala (sou míope) e mandou bilhete para que minha mãe alisasse ou prendesse o meu cabelo. Desde então, começaram a alisar meu cabelo e nunca mais consegui usar solto.”

—A.C. Z. O.

7. A vida como ela é.

“Eu e minha ex deixávamos minha enteada na casa da minha mãe. Quando eu saía do trabalho ia buscá-la. Dias depois da implantação da UPP da Camarista Méier, aqui no Rio, tava descendo a rua da minha mãe com minha enteada e uma viatura nos parou. Tava muito frio. Os PM desceram e mandaram que eu tirasse o casaco e abaixasse a bermuda, jogaram todas as coisas que estavam dentro da minha e da mochila dela no chão. Chutaram os cadernos dela pra ver se tinha algo entre as folhas, jogaram o suco da lancheira fora, abriram os potinhos de biscoito, os estojos de lápis de cor. Me perguntaram o que eu tava fazendo ali. Respondi que morava ali, apontei pro prédio, dei o endereço completo e o nome da minha mãe. Me revistaram pela segunda vez e resolveram ir embora. Catei tudo do chão, coloquei de volta nas mochilas e ela me perguntou porque eles tinham jogado o suco dela fora. Na época ela tinha 5 anos. Fiquei quatro anos com a mãe dela, separamos, tô em outro casamento. Agora ela tem 10 anos e até hoje eu não soube como responder honestamente porque fomos revistados de forma tão cruel.”

—Avellar Paz

8. Racismo ao sair do útero.

“Disseram que eu tinha que ter tomado leite de magnésia pra minha filha nascer branca. A pessoa tava com ela no colo e ela tinha nascido horas antes.”

—Vanessa Fernandes

9. Pessoa horrível.

“Eu tava no salão agora, e chegou uma senhora dizendo que queria lavar o cabelo que estava fedendo a ‘nego macaco’. Foi nítido o constrangimento de todo mundo. Inclusive a cabeleira é negra.”

—Heloísa Medeiros

10. Elogios racistas.

“Uma vez estava num restaurante com uns amigos e acompanhada do crush na época. Nós dois negros e modéstia à parte um casal lindo hehehe. A gente se divertindo e aparece uma senhora idosa, estrangeira, olha pra gente e começa a falar um monte de coisa aleatória, mas com cunho sexual, dizendo que por sermos negros (ela apontava pra pele deixando bem claro o que ela tava falando) éramos quentes. Eu me senti um lixo, porque ela nos colocou como animais em zoológico acasalando.”

—Layla Rocha

11. Começando desde cedo.

“Na alfabetização, uma garota olhou pra mim e disse ‘você não pode sentar aqui, eu não sento perto de gente de cor escura’. Ela também não deixava as outras crianças brincarem comigo. Eu ficava tão isolada que me trancaram no parquinho sozinha e não se deram conta que eu sumi da turma. Detalhe: a única negra numa escola classe média alta. Alisei meu cabelo com 8 anos pelo trauma e demorei anos pra assumir a minha cor”

—Layla Rocha

12. Sempre confundem.

“Uma vez estava com um amigo negro indo pra casa. Ele estava dirigindo. Me pararam na blitz, pediram pra eu descer do carro e perguntaram se eu precisava de ajuda.”

—Thati Soares

13. Racismo nada velado.

“Minha sogra foi contra nosso namoro e não foi ao nosso casamento por eu ser negra. Eu nunca tinha sofrido o racismo tão diretamente e esse foi o que mais doeu.”

—Uda Pereira

14. Mercado de trabalho.

“Sou formada em Gastronomia e me candidatei a uma vaga em uma padaria grande aqui da cidade (Campinas/SP). A representante do RH conversou comigo por telefone e disse que tinha adorado meu currículo e as referências e marcou a entrevista. Quando eu cheguei e me identifiquei, ela me levou a ter um canto afastado da padaria e disse que infelizmente eu não preenchia aos requisitos do estabelecimento. Eu entendi o que ela quis dizer e sai de lá em choque. Entrevistas de emprego são uma grande questão até hoje para mim!”

—Airam Oliveira

15. Coitada.

“Eu estava andando na rua e um menino olhou pra mim e falou pra mãe dele: ‘Nossa mãe, olha o cabelo dela.’ E a mãe dele falou: ‘coitada filho, ela é negra.'”

—Carolina Rodrigues

16. Casos de família.

“Minha mãe é negra e eu sou branca com olhos claros. Com 7 anos eu estava indo pra outro estado junto com ela e meus irmãos. O motorista não deixou a gente embarcar e disse ‘esses dois meninos podem até ser seus filhos, mas essa menina não. Você está sequestrando essa criança’. O motorista chamou a polícia e tivemos que ir para o posto do Conselho Tutelar que ficava dentro da rodoviária, porque eles tinham certeza que os documentos eram falsificados e minha mãe estava me sequestrando.”

—Vanessa Amaral

17. Filha de médica.

“Fui encontrar a minha mãe (médica, branca) no trabalho dela porque tava na rua e ia pegar carona pra casa. Pego carona com ela toda semana, mas nesse dia a recepcionista era nova, fui subir direto para a sala em que a minha mãe atende (como faço sempre) e ela veio me perguntar se eu tinha consulta marcada, expliquei que eu era filha de uma funcionária da clínica e ia encontrar a minha mãe na sala e tal.

Daí ela disse que era a sala de atendimento de otorrino, daí eu disse que a minha mãe é a otorrino. Ela “não entendeu”, me olhou torto, eu repeti. Perguntou o nome da minha mãe, eu disse, ela perguntou se eu tinha certeza (??). Daí eu falei que tinha certeza de quem é a minha mãe. Me irritei e fui subir, ela mandou o segurança ir junto achando que eu não ia perceber.

Depois quando eu tava descendo e passei pela recepção com a minha mãe ela fez uma cara de espanto. Minha mãe foi lá e disse ‘essa é a minha filha, muito linda né, Karina o nome dela’ (não tinha falado para a minha mãe porque sei que ela fica chateada quando isso acontece, foi coincidência) – daí a moça disse: “pois é, ela disse, quase duvidei, a senhora parece uma bonequinha de porcelana, linda linda, se fosse pra adivinhar qual funcionária daqui é mãe dela eu diria que é de uma das faxineiras”.

Odeio quando isso acontece, sei lá, me sinto mal por não sentirem que pertenço ao lado da minha mãe… Até fiz umas mechas depois, pro cabelo não ficar TÃO escuro.”

—Anônima

18. Parece que racismo existe.

“Terminal Rodoviário de Passageiros Ferry-Boat, 10 de agosto de 2016.

Desconhecida: Nossa, como você está arrumada!

Eu e meu belo sorriso de poucos amigos: Obrigada?!

D: O que você faz?

E: Faculdade.

D: Sério?! De quê?

E: Direito.

D: NOSSA! Não sabia que gente mais de cor com esse cabelo [eu usava box braids] fazia faculdade, ainda mais essa.

E: Da última vez que eu consultei, eu cumpria todos os requisitos pra estar na faculdade. Não sei se a senhora tá sabendo, mas desde 1888 muita coisa mudou, inclusive os requisitos pra ser acusada de injúria racial e da última vez que eu consultei a senhora também preenchia todos eles.

Uma fada morre toda vez que você fala que racismo não existe. Uma fada morreu hoje.”

—Karolina Graciano Cardoso

19. Uma aula de racismo.

“Uma vez eu desci atrasado pro colégio (eu estudava à noite, e tinha um caminho considerável do metrô até a escola), lembro que fui passar do um lado de um senhor e acelerei o passo, quando cheguei do lado dele ele me deu uma cotovelada no estômago e disse que eu não ia conseguir assaltar ele.”

—Pedro Henrique

20. Sem se desculpar.

“…E o pior dia foi quando eu estava fazendo compras com meu esposo (que é bem branco) e uma senhora jogou uma bandeja do mercado em mim. Olhei para ela sem entender e ela ‘você não trabalha aqui? Isso está estragado!’. Eu fiquei sem reação com a rispidez dela e meu esposo disse que eu não trabalhava lá. Aí ela, sem se desculpar: ‘ah, tá, não vi que ela estava com você. Sabe como é, você é a mais escurinha daqui e pensei que trabalhasse.’”

—Beatriz Novais

Os depoimentos foram editados por questões de clareza e/ou tamanho.

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